Durante a terceira semana
do mês de outubro de 2018, os meios de comunicação foram inundados com
informação relativa à evolução dos “custos com salários e remunerações por hora
trabalhada” durante o segundo trimestre
de 2018, revelada pelo Eurostat. Este estudo veio divulgar não só que os
salários aumentaram em 1,2% em termos nominais e homólogos, como também conclui
que Portugal, no panorama europeu, foi o quarto que menos evoluiu, à frente das
economias luxemburguesa, espanhola e holandesa.
A razão do estudo ter
atingido de forma tão vigorosa os media
prende-se com outros ancontecimentos públicos, tais como a previsão do JP
Morgan, onde se prevê a subida de 2,5% dos salários para as economias avançadas
(o dobro do que se verificou em Portugal) ou de que, em 2016, o salário médio
em Portugal, de trabalhadores por conta de outrem, era de 924,9€, enquanto que
na União Europeia essa mesma rubrica apresentava um valor médio de 1995€.
Quais serão então as
razões da discrepância nas evoluções, sendo que, perante a disposição económica
atual, a economia portuguesa deveria apresentar maior potencial de crescimento,
aos olhos de quem ouve as notícias, pelo menos? Apresentemos então algumas razões
justificativas para este fenómeno e que esclarecem a situação de perda de ritmo
português face às “economias avançadas” no pós-crise financeira.
Por um lado, o que
aconteceu na economia portuguesa durante a crise de 2008 foi que, em muito por
razões sindicais e de incapacidade de se darem descidas brutas nos ordenados
por parte das empresas, os trabalhadores do privado que mantiveram os seus
empregos não sentiram quedas salariais muito significantes, e como tal as
posteriores recuperações apresentar-se-ão mais lentas. Por outro lado, a
globalização e a desvalorização do trabalho vêm representar um papel muito
importante neste crescimento contido. Isto porque, numa sociedade globalizada
como a dos dias de hoje, a concorrência é muito maior, o que evidentemente
pressiona a descida real das remunerações, tal como acontece com o procedimento
de automação dos processos produtivos. Todos estes fatores levam à desvalorização
do fator trabalho. O que a torna evidente essa desvalorização é, por exemplo, o
que se deu em Portugal com a descida do salário médio dos engenheiros, numa
economia que necessita de mais engenheiros, quando o efeito sobre o salário
médio devia ser o contrário.
É ainda de referir o
atraso no processo de recuperação a que a nossa economia se sujeitou em
comparação com outras economias, tais como a americana, a crescer desde 2008, e
a europeia, que, de modo geral, apesentou crescimentos a partir de 2009. Pois
bem, sobre este entrave cíclico apenas ganhei verdadeiramente conhecimento do
mesmo numa rotineira viagem de comboio recente onde, entre palavras perdidas,
ouvi um indivíduo comentar que havia mudado de casa há coisa de 4/5 anos, “na
altura da crise”, disse ele. Ora vejamos, se excluirmos o período de 2010, onde
a tentativa de estimulo à economia se revelou crítica para o afundamento da
mesma, posteriormente, após o choque de 2008, Portugal apenas começou a
apresentar sinais de recuperação em finais de 2013/2014, há precisamente 4/5
anos, representando assim um atraso de igual período para as economias acima
referidas. É compreensível que toda a recuperação se apresente atrasada
igualmente, na qual se inclui o aumento de salários.
Por fim, e passando para
uma vertente mais de opinião pessoal, a situação salarial portuguesa é um tema
a ver e rever com bastante cuidado. Isto porque vivemos numa altura em que o
PIB da Zona Euro já foi revisto para baixo por duas vezes no que se refere a
este ano, e onde se prevê um abrandamento no crescimento do PIB português para
os próximos 4 anos (espera-se que este seja de “apenas” 1,6% em 2022, menos 0,8
pontos percentuais que em 2018), em época em que já se começam a cozinhar
teorias sobre a próxima crise, quer em termos internacionais, quer também em
termos nacionais, como já referiu recentemente Richard Thaler para a possibilidade de uma futura catástrofe no mercado
imobiliário português.
Perante estes fatores e o
futuro sempre incerto, uma das prevenções óbvias é o reforço da solidez
económica das famílias, que não irá acontecer, na minha opinião, sem uma
intervenção breve do Estado. Intervenção essa que poderia passar pelo aumento
de apoios às empresas privadas para incremento de produção quer para o mercado
externo quer para o interno, incentivos e facilidade ao consumo através da
redução de impostos indiretos, por exemplo, ou até mesmo com medidas diretas
sobre os salários, tais como aumentos na função pública ou aumento do salário
mínimo nacional. Esta medida já se encontra na agenda do governo para o ano de
2019.
Diogo
Eduardo Machado Ferreira
[artigo de opinião
produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do
3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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