domingo, 22 de dezembro de 2019

O crescimento do SMN em Portugal

O aumento do salário mínimo (SMN) tem gerado discussão nos últimos tempos. Por um lado, alguns empregadores de setores onde prevalecem baixos salários têm feito oposição à meta do governo de €750 para 2023. Por outro, vários partidos defendem a ideia, inclusivamente pedindo que se vá mais longe.
Um dos defensores do aumento salarial é Marcelo Rebelo de Sousa. O Presidente diz-se favorável ao aumento visto o país atravessar um período de “relativa certeza”, manifestando vontade em ver encontrado um acordo em concertação social[1]. Estas afirmações foram feitas perante empresários agrícolas, facto que adquire especial relevância quando considerado que, presentes na plateia, estavam também dirigentes da CAP – Confederação dos Agricultores de Portugal – que se encontram em objeção aberta a este objetivo.
E já não é a primeira vez que tal acontece. Já em 2017 a mesma CAP lançava fortes críticas ao PCP, que reclamava um salário mínimo de €600[2]. Ironicamente, esse valor é precisamente aquele que é praticado atualmente (2019), num momento em que a Confederação se volta a manifestar. E juntam-se a ela várias vozes da indústria têxtil e do calçado, que declaram preocupação com os riscos de falência de empresas do setor[3].

Caixa de texto: Gráfico 1 – Evolução do salário mínimo nacional. Retirado do relatório do Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério do Trabalho. Está disponível em: https://www.portugal.gov.pt/download-ficheiros/ficheiro.aspx?v=cd6a20c4-da9d-425b-ba42-be193b95cb6f



No entanto, torna-se difícil defender tais perspetivas quando, nos últimos anos, o país vem atravessando um período de maior prosperidade, e, como tal, tem conseguido subir o salário mínimo sem consequências negativas para a economia. Além disso, e apesar dos incrementos, fica mesmo assim muito aquém das práticas do resto da Europa[4].
A questão que se coloca é a seguinte: se Portugal não aproveitar momentos positivos da economia para fomentar o aumento dos rendimentos dos trabalhadores com piores salários, quando é que o fará? E como será possível convergir com a Europa se não o fizer?
Há, no entanto, empregadores que “aplaudem” a subida do 
Caixa de texto: Gráfico 2 – Salários mínimos na Europa, e classificação em “ligas” pelo Eurostat. Disponível em: https://eco.sapo.pt/2019/10/28/salario-minimo-de-750-euros-mantem-portugal-na-segunda-liga-europeia/




SMN proposta[5]

Apesar de apontarem riscos, como o aumento salarial sem contrapartida em termos de ganhos de produtividade, ou um eventual aumento contínuo da carga fiscal, mostram-se disponíveis para negociar e promover melhores ordenados.
Todavia, Portugal ainda tem um problema crónico de baixos salários relativamente aos países que servem de base de comparação. E esta questão pode ser, ironicamente, agravada com o aumento do SMN. Isto porque existe a possibilidade de o salário mínimo ser cada vez mais próximo do médio, desenvolvendo uma economia suportada por baixos salários.
Esta presságio parece ganhar forma quando se verifica que o SMN registou aumentos de 20% durante a anterior legislatura, ao passo que o médio apenas aumentou 11,3%, estando ainda abaixo de valores anteriores à crise[6]. Por outro lado, existem indícios de que um SMN pode levar a melhores rendimentos para todos, e, inclusivamente, encaminhar trabalhadores que auferem este montante para caminho com melhores remunerações no futuro[7].
Assim, parece que o caminho a seguir deve mesmo passar pela valorização do trabalho sobre a forma de melhores salários. Como tal, é necessário que o patamar inferior, o SMN, seja constantemente atualizado. Contudo, é também importante não ignorar os desafios para os empregadores, para que não se incorra no risco colocar a economia a operar quase exclusivamente na base de salários mínimos.

Diogo Miguel Simões de Sousa Pinto Abreu



[1] https://observador.pt/2019/11/26/marcelo-defende-aumento-de-salario-minimo-perante-preocupacoes-de-dirigentes-agricolas/
[2] https://observador.pt/2017/11/22/confederacao-dos-agricultores-considera-salario-minimo-de-600-euros-luta-partidaria-alheia-a-concertacao/
[3] https://eco.sapo.pt/2019/11/24/industriais-do-textil-e-calcado-receiam-que-algumas-empresas-nao-aguentem-aumento-do-salario-minimo/
[4] https://rr.sapo.pt/2019/11/07/economia/salario-minimo-e-dos-mais-baixos-da-ue-luxemburgo-paga-2071-euros-portugal-600/noticia/170702/
[5] https://www.publico.pt/2019/10/26/politica/noticia/salario-minimo-750-euros-patroes-aplaudem-ambicao-deixam-aviso-1891481
[6] https://www.jn.pt/nacional/costa-quer-aumentar-salario-medio-ate-ao-nivel-atingido-antes-da-crise-de-2010-11495980.html
[7] https://www.publico.pt/2019/07/24/economia/noticia/salario-minimo-chegava-224-trabalhadores-abril-1881139

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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