Quando pensamos
numa organização sem fins lucrativos que apoia crianças em estados de saúde
delicados, pensamos imediatamente numa causa nobre, em gente que dedica parte
da sua vida a ajudar crianças e, consequentemente, é apelado o nosso lado
emotivo de uma forma enfatizada, pois são crianças e nenhuma criança merece
passar uma infância assolada por uma doença e perspetivas de um futuro incerto.
Quando imagino uma criança, que não devia nunca ter que passar por momentos tão
difíceis, que devia poder viver realmente a sua infância, há algo em mim que se
revolta. É injusto uma pessoa ter assim a vida condicionada desde tão cedo, é
injusto uma criança não poder simplesmente viver a sua infância.
Mas há quem, tal
como eu, veja essa injustiça e dedique parte da sua vida a combatê-la ou a
suavizá-la, tentando levar alguma normalidade e felicidade à vida da criança. É
algo nobre e bonito de se ver, é algo que comove.
O problema é que,
no meio de tudo isto, há quem veja uma oportunidade nesta injustiça e dê um uso
indevido à palavra “solidariedade”. É o caso da senhora Paula Brito e Costa,
ex-presidente da Raríssimas. É revoltante ver alguém dirigir uma organização
deste tipo, que supostamente se preza pela bondade, utilizar assim meios que
deveriam estar a ser usados na melhoria da vida de crianças que nasceram com
doenças raras, crianças que não tiveram culpa do destino que lhes calhou, mas
não! Estão, segundo a reportagem divulgada pela TVI, a ser usados para bem
próprio, para uso pessoal, para alimentar a “vaidade” supérflua e egoísta de
uma pessoa que se intitula de “solidária”. Pois, solidariedade aqui não há
nenhuma porque, enquanto as crianças lutam arduamente contra as suas doenças, a
senhora Paula deslocava-se num carro de luxo, cujo aluguer ascendia aos 921,59€
por mês, auferia de um rendimento mensal base de 3000€, ao qual acrescia 1300€
em ajudas de custo, 816,67€ para um plano-poupança reforma e, ainda, 1500€ de
deslocações (quando o carro que conduzia era pago pela organização). Uma
despesa que ultrapassa os 7500€ mensais, numa organização que vive
maioritariamente de donativos que lhe são concedidos por quem acredita na causa
da Raríssimas e quer contribuir para melhorar a vida das crianças, mas que são
desviados sem dó nem piedade para fins egoístas e completamente desnecessários.
Desperta-me uma
tristeza desmedida ver as crianças serem usadas como pretexto para que uma
pessoa leve uma vida de luxo e, ainda, arranje forma de conseguir o mesmo para
o marido e filhos, cujos rendimentos mensais provenientes da Raríssimas eram de
3200€ e 1200€, respetivamente.
E não podemos
esquecer a mancha que isto deixa no mundo das organizações que se dedicam a
ajudar, porque nem todas elas funcionam desta forma vergonhosa. Há realmente
quem se preocupe com os outros e utilize os fundos a que tem acesso da forma devida,
mas perante casos destes como é que as pessoas saberão se os seus donativos
estão a ser aplicados da forma correta ou estão apenas a patrocinar luxos
alheios? Não sabem e, na dúvida, deixam de ajudar para não correrem o risco. E
quem sai prejudicado? São as pessoas que realmente necessitam e veem as suas
hipóteses de obter ajuda desaparecerem por motivos vergonhosos como este.
Pergunto-me
quantas crianças viram a sua suposta ajuda a passar-lhes ao lado, diretamente
para o bolso da senhora Paula Brito e Costa. Era suposto ajudar crianças, mas
há vestidos demasiado bonitos para ficarem na prateleira e assim se perde a
hipótese de uma pobre criança…para vestidos.
A confirmarem-se as
acusações feitas a Paula Costa, este é um caso que danificará a confiança das
pessoas nas organizações dedicadas a ajudar quem quer que seja e que deverá ser
exemplarmente punido pela Justiça. Espero sinceramente que todos estes dados
tenham uma justificação, para bem dos valores da nossa sociedade, mas, na falta
disso, é preciso atuar de forma a desincentivar qualquer ação que se assemelhe
a esta, para que os fundos obtidos através, por vezes, de donativos suados
sejam corretamente aplicados e geridos.
Bárbara de Sousa Gomes
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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