Apesar de, aparentemente, a crise em Portugal afetar todos e cada um, a verdade é que não há regra sem exceção e, nesse sentido, a expressão “pobres cada vez mais pobres e ricos cada vez mais ricos” pode ser aplicada ao caso português.
A crise parece ter vindo para ficar. Aumenta o desemprego e há cada vez mais portugueses a emigrarem, sendo que a economia nacional sofreu em 2012 a mais profunda recessão desde 1975. Mas há no país, paralelamente, mais multimilionários, que também viram as fortunas engordar. O número de multimilionários em Portugal com fortunas superiores a 25 milhões de euros aumentou 10,8% para 870 pessoas no último ano, apesar da crise que se vive no país, aumento este que foi superior à média europeia (8,7%) e o sexto maior entre os países da União. Estes dados constam de um relatório apresentado pelo banco suíço UBS, que se designa “Relatório de Ultra Riqueza no Mundo 2013”. Mais do que o aumento do número de bilionários, verificou-se também o aumento do valor global das suas fortunas, de 90 para 100 mil milhões de dólares, ou seja, um aumento de 11,1% durante um ano, face a um crescimento da média europeia de 10,4%.
Não deixa de ser curioso o facto de, por um lado, o nosso país ser um dos mais flagelados pela crise económica e, por outro, este aumento ser superior à média europeia. A explicação está na componente financeira da riqueza: ações, obrigações e outros títulos. Constata-se que a remuneração do capital é cada vez mais significativa do que a remuneração do trabalho, o que faz com que quem tem poder para investir em ativos financeiros veja a sua riqueza crescer muito mais rapidamente do que quem tem como único rendimento o salário, já que o fator trabalho oferece uma remuneração cada vez menos significativa. As perdas de uns, como é fácil de entender, são os ganhos de muitos. Enriquecer não é um mau princípio - muito menos um mau fim. Desde que seja legal e legítimo, é uma ambição que todos deveriam seguir e, mais do que isso, todos deveriam conseguir concretizar. Sem exceção.
O problema nestes números é que o enriquecimento de um grupo de afortunados está a ocorrer em paralelo com o empobrecimento de um número significativamente maior de portugueses. Aquando deste aumento de multimilionários, aumenta também em Portugal o número de trabalhadores pobres, pessoas que trabalham mas cujos recursos não são suficientes para assegurar uma vida com um mínimo de dignidade e qualidade.
Uma das justificações para a precarização do trabalho e para o aumento do número de pobres será o facto de progresso tecnológico ter tido impacto salarial maior nos trabalhadores com mais competências e escolaridade; que as reformas laborais, introduzindo maior flexibilidade, criaram mais empregos, mas substituíram empregos mais bem pagos por empregos mais mal pagos; que o aumento de trabalho part-time e de contratos precários contribuiu também para esse empobrecimento; que as novas famílias tendem a ser constituídas por pessoas com o mesmo nível de rendimentos, em vez de demonstrarem diversidade salarial, criando menor mobilidade social e de rendimento; que os rendimentos oriundos de fora dos salários, nomeadamente os obtidos nos mercados de capitais, aumentaram ainda mais desigualmente do que os com origem em salários, concentrando-se ainda mais em menos pessoas; e que, por último, a redistribuição de rendimento via atuação dos Estados tem sido diminuída pelos cortes de benefícios sociais, pelo apertar das regras de acesso e pelas falhas na capacidade da administração de efetuar transferências para quem mais delas necessita.
Todas estas causas favorecem o empobrecimento da maioria da população, mas deixam também mais dinheiro “disponível” para os milionários continuarem a enriquecer… Porque "Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma" ou muda de mãos, como é o caso…
Teresa Filipa Pereira de Sousa
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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