terça-feira, 17 de setembro de 2019

Alemanha entre guerras

Nestes últimos 2 anos, tem-se vindo a registar um abrandamento da atividade económica de vários países Europeus e uma das economias que mais tem sofrido é a alemã.  Segundo dados da OCDE, em 2018, houve uma contração de 0,8 pontos percentuais no PIB Alemão relativamente ao ano anterior, dando-se assim os primeiros indícios para uma possível recessão. Também no segundo trimestre deste ano se observou uma queda do produto, que rondou os -0,1%, valor verdadeiramente alarmante numa economia com uma década de crescimento praticamente constante e uma taxa de crescimento média de 2,0%. 

Este desenvolvimento, sustentado principalmente na indústria, teve também os seus retrocessos associados à situação política e social vivida nos momentos de recessão. Por exemplo, em 2002, houve uma fase de maior incerteza na mudança da moeda em circulação para o euro, em 2007, deu-se o período em que se sucedeu a crise financeira internacional e, por fim, em 2010, sucedeu-se a crise das dívidas soberanas.



Mas então qual é a razão para este fraco desempenho económico neste momento? A meu ver, existem duas explicações por detrás deste recuo que se complementam entre si.
Uma delas prende-se com o facto da Alemanha, sendo considerada a cabeça de cartaz da elite Europeia, poder estar também mais vulnerável às consequências adjacentes ao atual contexto interno vivido na Europa, nomeadamente, a saída do Reino Unido da União Europeia. A desaceleração da atividade económica poderá estar relacionada com o Brexit na medida em que este põe em causa a própria consistência da União e adiciona mais incertezas no mercado europeu, fazendo com que os investidores pensem duas vezes antes de apostar na Europa.
A outra hipótese considera que, para além da instabilidade interna, existe também um problema no mercado externo, fruto da guerra comercial entre as duas maiores potências mundiais. Tudo começou no dia 22 de março de 2018, data em que o presidente Donald Trump tomou a iniciativa de aumentar o preço das tarifas dos produtos chineses importados. Como seria de esperar, o líder Chinês Xi Jinping não se mostrou indiferente perante essa decisão e respondeu da mesma forma às importações Americanas.
Este tema é bastante polémico na atualidade dado que as trocas comerciais entre os EUA e a China representam 3,4% do comércio mundial. Porém, estes dois países que estão diretamente envolvidos neste conflito não são os únicos, nem mesmo os que estão a ser mais prejudicados com esta guerra. Este clima, que já perdura há quase dois anos, tem afetado a economia mundial e posto à prova principalmente as balanças comerciais Europeias (até porque o peso do comércio entre a China e a União Europeia no total do comércio do mundo é cerca de 3,7%.) O FMI calculou que a guerra comercial poderia reduzir o PIB mundial em cerca de 0,8% em 2020 e levar ainda a mais perdas nos anos seguintes.
Mas esta guerra pode agora ter implicações mais diretas nos países Europeus uma vez que na sexta feira passada a Organização Mundial do Comércio (OMC) chegou a uma conclusão sobre a queixa feita em 2006 pelos Estados Unidos contra os apoios concedidos pelos países europeus à fabricante de aviões Airbus. A decisão tomada ainda não é pública, mas segundo consta, de acordo com os rumores vindos de Washington, a deliberação da OMC foi feita a favor dos norte-americanos e pouco deve faltar para que seja oficial pois a verdade é que o caso já não é recente. Deste modo, foram abertas assim as portas à possibilidade da criação de tarifas aos produtos europeus exportados para a América.
Perante estas condições, as previsões para a Alemanha não são muito otimistas e as medidas tomadas, ou melhor, a falta de medidas tomadas pela chanceler Angela Merkel perante a situação começam a ser questionadas. O setor automóvel, em particular, provavelmente continuará a lidar com o aumento da incerteza sobre política comercial e sobre as preferências do consumidor enquanto a deterioração no ambiente externo persistir e poderá arrastar com ele outras economias. Portugal, por exemplo, já começa a sentir os efeitos nesta indústria, quer por via dos investimentos que os alemães fazem na economia nacional, quer por via das exportações, dado que a Alemanha é o terceiro maior cliente dos bens e serviços vendidos por Portugal ao exterior.
No meio deste clima de turbulência, a Alemanha prepara-se assim para enfrentar a primeira grande recessão da década, e provavelmente não será a única a cair. Apesar de tudo, num debate parlamentar em Berlim, Olaf Scholz, Ministro alemão das Finanças, assegurou que, em caso de crise, o Estado alemão tem o dinheiro que é preciso para ajudar a economia a recuperar. Agora se esta declaração será a suficiente para assegurar a estabilidade do país isso permanece uma incógnita, mas a verdade é que mesmo perante esta possibilidade as previsões de abrandamento na conjuntura económica internacional mantêm-se.
A meu ver, o futuro é bastante incerto, até porque as eleições presidenciais de vários países estão aí ao virar da esquina e elas podem trazer grandes mudanças. Uma coisa é certa: a história tem-nos mostrado que a Alemanha é capaz de feitos inimagináveis.
Cristiana Gião

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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