“Tudo o que for preciso”.
Assim se iniciou em 2011 o célebre mandato do ainda atual presidente do Banco Central
Europeu, num contexto pós crise financeira internacional. Qual o motivo para
tanto desespero?
Nessa altura, a dívida
das economias europeias começou a aumentar de forma astronómica, fruto de
alguns fatores. Em primeiro lugar, a existência de facilidades na concessão de
crédito entre 2002-2008 provocou um aumento substancial do rácio de alavancagem
das instituições bancárias e, consequentemente, do risco de default a que estavam expostas; em
segundo lugar, políticas orçamentais que levaram à estagnação económica,
potenciando a acumulação de défices excessivos; por último, a globalização dos
mercados financeiros bem como o desenvolvimento do comércio internacional criaram
uma certa dependência entre os países.
Ora, quando os EUA
assistiram à falência do maior banco de investimento do mundo, automaticamente
foi gerada uma espiral recessiva: queda no rendimento das famílias, falência de
empresas, redução do poder de compra, diminuição da procura, o que comprometeu
o pagamento dos financiamentos obtidos, desequilibrando a atividade e liquidez
dos bancos. Resultado: bancarrota. Não é surpreendente que este cenário
catastrófico se tenha alastrado para a Europa uma vez que o mundo está cada vez
mais conectado.
Deste modo, a desconfiança
que se gerou no sistema bancário e financeiro foi de tal ordem significativa
que houve uma contínua pressão para o aumento das taxas de juro entre 2005 e
2011. As taxas Euribor a 3 e 6 meses subiram 2 p.p. entre 2005 e 2007, de 2,49%
para 4,68%, e de 2,64% para 4,71%, respetivamente. Também as taxas yield de longo-prazo referentes aos
títulos de dívida se encontravam bastante elevadas entre 2009 e 2012, refletindo
o enorme risco associado aos instrumentos financeiros emitidos pelos vários
países, principalmente pela Grécia, cujo valor atingiu um máximo de quase 30%
em abril de 2012. Não é por acaso que agências de rating altamente acreditadas mundialmente, como a Moody’s,
classificavam a Grécia e Portugal como lixo.
Mas afinal onde está a
salvação? Era uma pergunta universal cuja resposta tardou, mas surgiu: Mario
Draghi. O economista e banqueiro italiano, quando assumiu a liderança do BCE,
tomou um conjunto de políticas monetárias que o imortalizaram. Duas palavras,
múltiplas ações: “Quantative easing”.
A partir de 2015 ocorreu um processo de
compra de dívida pública dos países europeus, que permitiu uma redução drástica
da taxa de juro e que com o tempo se refletiu no renascer de uma nova solidez
na componente do investimento, dinamizando as diversas economias.
Nesse âmbito, o BCE expandiu o seu
balanço de 1 bilião de euros, em 2014, para o montante de cerca de 3 biliões de
euros, em 2016, ou seja, um aumento de 200%. Este valor foi atingido
essencialmente pelo recurso a dois tipos de instrumentos: empréstimos de
longo-prazo aos bancos; e injeção direta de fundos na economia, com a aquisição
de ativos aos governos europeus, nomeadamente obrigações do tesouro.
Um estudo elaborado para alguns
países da Zona Euro pelos economistas Daniel Monteiro e Bořek Vašíček, membros
da Comissão Europeia, concluiu, para Portugal, que se este financiamento
massivo não tivesse sido executado, o valor da taxa de juro das obrigações do
tesouro a 10 anos seria mais de 2 p.p. acima do atual. Para a média do total
dos 11 países europeus analisados, em 2017, o valor desta taxa seria de 3,8% em
vez dos 1,8% registados e, em 2018, seria de 4 % em vez dos 2% registados.
Além disso, de acordo com as estatísticas
do Eurostat, os dados de 2018 apontam para uma taxa Euribor negativa na ordem
dos 0,30%, algo inimaginável, mas que resultou de todo este processo complexo
de compra de ativos nas operações de mercado aberto conduzidas pelo Banco
Central.
E agora, finalmente,
chegou o golpe final. Em 2019, numa fase do ciclo que surge novamente
desfavorável para o contexto europeu (projeções de desaceleração económica),
Mario Draghi, prestes a terminar o seu mandato, confirmou
que vai reduzir a taxa de juro de depósito de -0,4% para -0,5%. Assim,
os bancos têm de pagar ainda mais para manter os seus depósitos em reservas nos
cofres do BCE. Ou seja, a nova descida desta taxa aumentará o custo de
oportunidade de a moeda não estar em circulação. Logo, induzirá ao aumento dos
empréstimos às empresas e às famílias para estimular a economia através do
investimento e do consumo privado, com o objetivo de contrariar a futura
recessão que se adivinha.
Mais
uma vez, os cidadãos europeus podem estar satisfeitos com as políticas levadas
a cabo por Mario Draghi, um verdadeiro líder a remar contra as tempestades
económico-financeiras vividas na Europa.
Tiago Almeida Ribeiro
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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