domingo, 3 de janeiro de 2021

Sistema de Saúde em Portugal

        Teoricamente, em Portugal, todas as pessoas têm acesso à saúde, independentemente do seu estatuto socioeconómico, jurídico ou da sua situação profissional, mas na realidade não é bem isso que acontece. As despesas das famílias neste setor têm vindo a aumentar, o SNS parece estar constantemente prestes a entrar em colapso e a desigualdade de acesso em função da situação financeira de cada um é uma realidade no nosso país.

A incapacidade do SNS em responder a consultas de clínica geral, de especialidades ou até a tratamentos específicos prejudica principalmente os mais pobres e traduz-se em mais problemas de saúde diagnosticados tardiamente para esta camada e, consequentemente, numa menor qualidade de vida. A pandemia veio agravar ainda mais esta situação, pois a prioridade de combate à covid-19 provocou o adiamento de quase 1,4 milhões de consultas médicas no SNS. Além disso, o medo ao vírus levou a que muitos evitassem a ida ao médico, contudo as outras doenças não deixaram de existir e, muitas delas, serão diagnosticadas numa fase mais avançada, o que tem consequências para os doentes mas também para o sistema, que ficará mais sobrecarregado. Nestas circunstâncias, as pessoas com maiores possibilidades, têm a oportunidade de se deslocar aos serviços privados e resolver os seus problemas mais rapidamente, enquanto que pessoas com dificuldades financeiras permanecem em lista de espera.

          Este problema não é recente nem é consequência da pandemia. Já é bastante conhecido em Portugal, pois não é novidade nenhuma para todos nós que há pacientes do SNS que chegam a esperar meses ou anos por consultas ou mesmo por cirurgias. Em 2017, segundo o relatório da OCDE “State of Health in the EU, Portugal - Perfil de saúde do país 2019”, cerca de 5% dos indivíduos que possuem baixos rendimentos em Portugal comunicaram necessidades médicas não satisfeitas, um número superior à média da UE e uma notável diferença relativamente à percentagem relatada por indivíduos com rendimentos elevados, que foi quase nula.

 

Fonte: OCDE

          Ainda segundo o mesmo relatório, “cerca de 61 % dos Portugueses no quintil de rendimentos mais alto consideram estar de boa saúde, comparativamente a cerca de apenas 39 % no quintil de rendimentos mais baixo, bastante abaixo das médias da UE (80,4 % e 61,2 %, respetivamente).”

          O mercado dos cuidados de saúde é um mercado de recursos escassos para necessidades ilimitadas, um mercado com falhas de eficiência. Para que estas falhas sejam ultrapassadas, o sistema de saúde tem de coexistir em harmonia com os setores privados e sociais, de forma a que os recursos disponíveis sejam utilizados na sua totalidade e que toda a população tenha igual oportunidade de acesso.

          Para os estatistas, combinar o serviço público com os serviços privados ou sociais pode não ser uma hipótese. Contudo, não se trata de ideologias políticas mas sim de uma necessidade. É necessário sermos eficientes, é necessário que os portugueses tenham acesso à saúde a tempo e horas. O SNS deve, sim, combinar-se com os restantes de acordo com as necessidades da população. O nosso objetivo deve ser ter um sistema de saúde mais capaz e acessível, com um melhor desempenho, posto isto, não devemos pôr em questão qual o prestador do serviço mas sim a qualidade do mesmo. Certamente, um doente que precise de cuidados médicos urgentes terá preferência por um serviço que não o deixe meses em lista de espera. E se esse doente não tiver possibilidades? É este o centro da minha discussão: o Estado deve organizar-se de modo a poder oferecer “saúde” aos seus cidadãos, independentemente se essa é oferecida por serviços públicos ou privados, para que os mais pobres não fiquem limitados à disponibilidade da oferta pública.

          Os cuidados médicos são um direito básico que devem depender da necessidade do cidadão e não da sua capacidade de pagamento, além disso, os problemas de saúde não se podem colocar em pausa conforme a disponibilidade do SNS. Por estas razões, é urgente reduzir a desigualdade, deixar ideologias de lado e agir da “melhor” maneira (na minha perspetiva, será a melhor) de um ponto de vista social e económico, ou seja, prestando cuidados de saúde rápidos e de qualidade e atingir uma maior eficiência na utilização dos recursos disponíveis.


Bruna Ferreira

Referências Bibliográficas:

OCDE/Observatório Europeu dos Sistemas e Políticas de Saúde (2019), Portugal: Perfil de Saúde do País 2019, Estado da Saúde na UE, OCDE, Paris/Observatório Europeu dos Sistemas e Políticas de Saúde, Bruxelas.

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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