quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Dívida Pública Portuguesa

          A dívida pública portuguesa não esteve sempre tão elevada. Apesar de adotar um comportamento crescente notório a partir de 2001, em 2007 ela ainda se situava nos 72% do PIB. Mas no final de 2019 o valor da dívida situava-se nos 249,7 mil milhões de euros, representando 118%, posicionando-se muito acima do limite estipulado pelo Tratado de Maastricht - 60% do PIB.

Para percebermos quais foram os fatores que levaram ao crescimento contínuo da dívida teremos de recuar à década de 1980-90. Após a adesão de Portugal à CEE, a necessidade de atingir o padrão que essa entrada prometeu e a divergência face às possibilidades económicas portuguesas levou a sucessivos défices externos e ao endividamento do Estado, que posteriormente levaram a aumentos excessivos da dívida pública. 

Apesar do facto desse aumento abrupto da despesa pública ter sido um dos pontos iniciais para o crescimento incansável da dívida, ela permitiu recuperar significativos atrasos que Portugal vinha registando desde o Estado Novo, como o acesso universal ao SNS, e a diferentes níveis de ensino, por exemplo. Com isto, Portugal entrou para o séc. XXI com a economia fortemente desequilibrada. De facto, a gestão das finanças públicas foi das principais razões para o início da crise.

Para contrariar os efeitos da recessão e não repetir os erros da Grande Depressão, tanto a Europa como os EUA decidiram adotar medidas keynesianas - estimular a procura de forma a contrariar os efeitos da queda da mesma. Ademais, os próprios governos nacionais adotaram medidas para combater a crise. Mas, mesmo assim, não conseguiram evitar os efeitos da recessão. Então, vários bancos centrais decidiram intervir com a adoção de políticas monetárias muito expansionistas, utilizando as denominadas medidas não-convencionais.

Uma das formas de gerir esse endividamento excessivo seria com um elevado crescimento económico, mas entre os anos 2000-2010 o crescimento médio anual per capita foi de apenas 0,5% e entre 2010-2019 esse valor agravou-se para 0,1%.

Portanto, antes da crise financeira, o endividamento público português apresentava valores estáveis. Apesar do forte crescimento da despesa pública e dos recorrentes défices orçamentais nos anos 90, estes foram contrabalançados com as descidas das taxas de juro, as receitas das privatizações e o bom desempenho da economia nesses anos. Isto levou a certos economistas a desvalorizar a sua importância, mas a realidade é que o seu crescimento explosivo tem sido explícito, e as dificuldades em conter as despesas face ao baixo crescimento chega a pôr a sustentabilidade da dívida em causa.

Desde 2013, a economia tem vindo a recuperar, mas no que toca à dívida pública portuguesa, ela subiu até 2014, ficando pouco acima dos 130% do PIB. Estabilizou até 2016 e em 2017 registou a sua primeira descida assinável depois da crise, chegando aos 125% do PIB. Tratava-se de uma descida que fazia antever uma provável trajetória descendente da mesma. Ao manter umas contas públicas equilibradas, um crescimento sustentado e uma taxa de inflação a rondar os 2%, acreditava-se que a dívida pública diminuísse ao mesmo ritmo do crescimento do país e chegasse ao 60% do PIB em 2036.

Mas a realidade foi outra. Após registar o primeiro excedente orçamental em 2019 desde o tempo do estado novo, de 0,2% do PIB, o ano de 2020 iniciava-se da melhor forma para o estado português, não fazendo antever uma pandemia. Agora com esta situação de incógnita que paira sobre o futuro, todas as previsões anteriormente realizada invalidaram-se, sendo que, por exemplo, o excedente orçamental de 0,2% do PIB e a diminuição da dívida previsto para 2020 passaram a um défice orçamental de 7,1% do PIB e a um aumento da dívida pública para uns históricos 135% do PIB.

Aquilo que se espera e que vem sendo sustentado por muitos economistas é que Portugal não volte a repetir os erros do passado, apesar da instabilidade política. E em termos macroeconómicos é expectável que o país continue a registar défices no curto/médio prazo, mas as previsões do crescimento económico podem atenuar esses efeitos e, até mesmo, diminuir o peso da dívida no PIB.

 

Mickaël Cruz

[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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