segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Mais saúde na economia, mais economia na saúde

A saúde e a economia estão intimamente interligadas, dada a evidência que investir em saúde e nos sistemas de saúde é claramente benéfico para a realização de quaisquer que sejam os objetivos económicos. A fim de explicar a relação existente entre saúde e crescimento económico, é necessário entender o conceito de saúde num sentido amplo.

Saúde não é apenas ausência de doença, mas sim a capacidade dos indivíduos de desenvolverem o seu potencial ao longo da vida. Nesse sentido, a saúde corresponde a um bem que o indivíduo possui e que apresenta um valor intrínseco. Como forma de suportar esta ideia, Michael Grossman, um economista da saúde, investigou durante a sua atividade profissional e apresentou o atualmente comumente conhecido Modelo de Grossman. O trabalho desenvolvido por este notável economista permitiu compreender o papel de diversas variáveis, como idade, estado de saúde, rendimento e educação na produção de saúde, através da procura de cuidados de saúde. 

A proposição central do modelo é que a saúde pode ser vista como um stock de capital humano cujo output produzido corresponde a tempo de vida saudável. Os indivíduos herdam um stock inicial de saúde que se deprecia com a idade e, deste modo, este pode e deve ser aumentado através de investimentos em saúde e do consumo de bens e serviços apropriados para esse fim, como, por exemplo, cuidados médicos, exercício físico e alimentação saudável. Grossman trata a saúde como um bem de consumo, na medida em que dá satisfação ao consumidor, mas também como um bem de investimento, no sentido em que investir em saúde aumenta o nosso stock de saúde, aumentando significativamente os nossos níveis de produtividade e aprendizagem. Tal também contribui para a diminuição dos dias de incapacidade e permite a obtenção de um maior nível de rendimento, aliado à inerente possibilidade de mais dias de trabalho com saúde, e assim maior disponibilidade para o consumo de bens e serviços, bem como uma consequente participação ativa na economia.

Aprofundando a ideia anterior, os impactes diretos na economia decorrentes da melhoria das condições de saúde ocorrem sob a forma de maior produtividade do trabalhador. Um aumento do stock de saúde da população tem como consequência menos dias de ausência na escola durante a infância e no trabalho no decurso da vida adulta, resultando em menores impactes negativos sobre o salário do trabalhador. Em concreto, crianças provenientes de famílias mais pobres, cujo leque de oportunidades de investimento em saúde se encontra limitado à partida, tendem a ter stocks de saúde mais baixos, o que compromete os seus níveis de produtividade e consequentes capacidades cognitivas. Em geral, o estado de saúde durante a infância determina as condições de saúde e o desempenho educacional enquanto adolescentes, afetando as condições de saúde, rendimentos futuros e capacidade de participar de forma eficiente na economia na idade adulta.

Em síntese, a análise de Grossman baseia-se na teoria do capital humano, que demonstra a forma como os indivíduos alocam todos os recursos que têm disponíveis em investimentos próprios de forma a aumentar a sua produtividade. O montante ótimo de capital humano é definido através dos custos e benefícios relativos. De um modo geral, os custos ocorrem no curto prazo, enquanto que os benefícios se manifestam no futuro, traduzidos principalmente, tal como anteriormente referido, em aumento de oportunidades de emprego e aumento do número de dias saudáveis.

Uma população saudável é uma condição prévia para o desenvolvimento sustentável e uma economia resistente. Por sua vez, uma economia forte é necessária para gerar recursos suficientes para os sistemas de saúde. Contudo, embora haja e se verifique uma relação mutuamente benéfica entre estas duas vertentes, muitos governos e decisores de políticas financeiras têm uma visão pouco positiva no que diz respeito a gastos com sistemas de saúde. Estes até podem ambicionar a cobertura universal de saúde, mas receiam que, sem regulamentação, os gastos com saúde cresçam de forma desproporcionada.

Embora a saúde seja reconhecida já há muito tempo como um aspeto fundamental para o desenvolvimento económico, as decisões de investimento em saúde têm sido avaliadas puramente como um custo e não como um investimento com retorno económico. Esta conceção é claramente errada porque melhorar a saúde da sociedade é necessário para a prosperidade. Pessoas mais saudáveis são mais produtivas e, ainda mais importante, investir na saúde infantil e criar incentivos e oportunidades generalizadas no acesso a cuidados de saúde criará os empreendedores, o conhecimento e os trabalhadores qualificados do futuro. Só assim será possível aproveitar o potencial da saúde como motor de desenvolvimento e torná-la um catalisador económico e social vital.

 

Guilherme António Rodrigues Augusto

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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