O conceito de “fuga de cérebros” (em inglês brain circulation) (Johnson e Regets,
1998) foi introduzido para traduzir a seguinte perspectiva: indivíduos
especializados e com elevadas qualificações circulam entre diferentes locais,
incluindo o próprio país, adquirem novos conhecimentos e desenvolvem as suas
competências. Integram redes internacionais de conhecimento, em vez de se
moverem para um local específico e aí se estabelecerem. Através deste processo
estes indivíduos contribuem para a criação e difusão do conhecimento ao longo
de todos os nós das redes que integram. Sob o ponto de vista do país de origem,
o elemento central da circulação de cérebros é a possibilidade de retorno
(temporário ou definitivo) ou, ainda, a construção de redes de conhecimento que
podem ser utilizadas para suportar o desenvolvimento do país de origem
(Gaillard e Gaillard, 1998; Williams et al, 2004).
A “fuga de cérebros” e em particular a mobilidade científica internacional é um tema que tem
recebido ampla atenção por parte não só dos estudos de ciência, tecnologia e
inovação como também dos decisores políticos, a nível nacional e supranacional.
A obtenção de formação pós-graduada é uma das
principais motivações para a saída do país indicada pelos investigadores
portugueses (Delicado, 2008). Outras razões facilmente identificadas são as
melhores condições que estes investigadores encontram em centros de
investigação no exterior. Assim, destacam-se como factores de “atracão” comuns não
só as condições científicas (recursos disponíveis para a atividade científica,
nomeadamente financiamento e equipamento; qualidade do ambiente de
investigação; desenvolvimento em áreas de ponta; equipas compostas por
cientistas reputados) e profissionais (oportunidades de formação e emprego,
remunerações, progressão), mas também políticas (natureza democrática dos
regimes, facilidades concedidas à imigração qualificada) e culturais (língua,
estilo de vida, cosmopolitismo, presença de comunidades do país de origem).
Estes factores de “atracão” são o que se denominam na literatura como pull, por oposição aos factores de “repulsão”
que são denominados como push. Naturalmente, os primeiros dizem
respeito às condições favoráveis de acolhimento no país de destino e os
segundos às condições menos propícias à atividade científica no país de origem.
A literatura indica que o estudo num país estrangeiro
é frequentemente o primeiro passo para a migração tendencialmente permanente,
na medida em que oferece uma integração social e cultural e fornece os créditos
educacionais, reconhecidos no estrangeiro, tornando a integração mais fácil.
No caso dos investigadores e académicos, as condições
nos países de destino a respeito de todo o suporte à investigação e à procura por
staff para I&D são determinantes
para a sua decisão de emigrar ou não e pela escolha do país para o qual
emigrarão. No entanto quando alargamos o nosso espectro relativamente à
denominada fuga de “cérebros” e pensamos em outros profissionais altamente qualificados,
devemos ter em consideração que as razões que os levam a sair do seu país de
origem também incluem objectivos intelectuais, tais como, educação,
investigação, aprendizagem de uma nova língua. Já entre os empreendedores, o
ambiente para inovação, para start-ups
e para o emprego por conta própria, pode desempenhar um papel muito importante
na decisão dos indivíduos se deslocarem para o exterior.
Contudo, nem todos os emigrantes qualificados se movem
em busca de oportunidades de educação, económicas ou intelectuais.
Frequentemente, nos países em desenvolvimento, os mais qualificados deixam o
seu país de origem de forma involuntária, como resultado da guerra, colapso
económico ou ainda perseguições políticas e religiosas. De facto, em muitos
casos os emigrantes qualificados estão entre os refugiados e entre aqueles que
pedem asilo.
Em muitas situações é confundido o
conceito de “fuga de cérebros” com o de “circulação de cérebros”,
principalmente quando nos reportamos a países de origem considerados desenvolvidos.
Neste caso, verifica-se que a taxa de retorno dos investigadores ao país de
origem é bastante elevada, veja-se o caso português, pelo que não existe
efetivamente uma perda de capital humano permanente. Por contrapartida, no caso
de países menos desenvolvidos, onde se assiste em muitas situações a uma perda,
não apenas temporária mas sim permanente, na medida em que estudantes e
investigadores que saem para o exterior dificilmente regressam ao seu país de
origem. Isto acontece pois estes indivíduos altamente qualificados encontram
melhores condições para realizar investigação ou simplesmente oportunidades de
trabalho mais atrativas (salários mais elevados, maiores possibilidades de
progressão na carreira, etc.).
À partida, esta mobilidade de indivíduos
altamente qualificados, quando se trata apenas de uma “fuga temporária”, trás
vantagens tanto para o país de origem, como para o país de acolhimento. O
primeiro beneficia de todo o know-how,
redes de contactos trazidos pelo indivíduo aquando o seu regresso, o segundo de
um aumento temporário de capital humano qualificado, assim como a estimulação
de I&D. No entanto, quando o fenómeno é de uma efetiva “fuga de cérebros”,
corremos o risco de assistir a imposição de medidas por parte dos países de origem,
com vista a “desencorajar” a saída de capital humano qualificado.
Fábio Veloso
Bibliografia
Consultada:
Gaillard, J. e Gaillard, A. M. (1997), “The
international mobility of brains: exodus or circulation?”, Science
Technology and Society, nº 2, pp. 195-228M.
Johnson, J and M Regets 1998. “International mobility
of scientists and engineers to the US — brain drain or brain
circulation?” National Science Foundation,
NSF 98-316, June.
[Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3.º ano do curso de Economia (1.º ciclo) da EEG/UMinho]
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