sábado, 1 de dezembro de 2018

A reforma faz bem à saúde?

Numa fase em que reformas, reformados e pensões são discutidos do ponto de vista da sustentabilidade da Segurança Social, é interessante constatar como a demografia traz outros argumentos a uma discussão que por vezes parece quase bloqueada. “Portugal está entre os países da Organização para a cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) onde os jovens terão de trabalhar mais tempo até poderem reformar-se” (Raquel Martins, 2017).
De acordo com o relatório “Pensions at a Glance 2017”, um jovem português que tenha entrado no mercado de trabalho em 2016, com 20 anos de idade, estima-se que terá de trabalhar até aos 68 anos para ter acesso à pensão. No nosso país, a idade da reforma está intimamente relacionada com a evolução da esperança média de vida – algo que já acontece desde 2007 e que foi reforçado em 2014. Este ano, a idade normal de reforma é de 66 anos e cinco meses, e a cada ano estima-se que a mesma aumente um mês. A OCDE alerta que o aumento expectável da idade da reforma será superado pelo avanço da longevidade, o que significa que o tempo que as pessoas passam na reforma aumentará em relação à duração da sua vida profissional.
Concomitantemente, há ainda outra questão a ter em consideração: estima-se que o rácio entre o número de pessoas com mais de 65 anos e as pessoas com idade ativa vá duplicar nos próximos 35 anos. E neste ponto Portugal é o quarto país da OCDE onde essa relação mais irá degradar-se. Em 2015, havia 34,6 pessoas com mais de 65 anos por cada 100 pessoas em idade ativa (acima dos 27,9% da média da OCDE). Este rácio passará para 73,2 anos em 2060. Só o Japão (77,8), a Espanha (77,5) e a Grécia (73,4) apresentarão rácios mais elevados.
A esperança média das pessoas com mais de 60 anos na OCDE é atualmente de 23,4 anos, e estima-se que deverá passar para os 27,9 anos em 2050, o que implicará um forte aumento da taxa de dependência económica dos idosos, refere. Por esta razão, consta no relatório da OCDE que os governos têm de tomar medidas para aumentar o emprego entre os cidadãos mais velhos, de modo a garantir que receberão pensões adequadas. Neste contexto, Portugal é apresentado como um dos países com menos obstáculos à possibilidade de acumular trabalho com pensão. É também um dos países da OCDE que incentiva os trabalhadores para que permaneçam no mercado de trabalho e adiem a idade da reforma.
O relatório tem ainda em consideração os gastos dos países com pensões e Portugal foi um dos países em que se constatou que a despesa pública mais subiu nas últimas décadas, continuando acima da média da OCDE.
O panorama é assustador. Se a idade da reforma não parar de aumentar, estima-se que daqui a duas décadas tenhamos de chegar quase aos 70 anos para nos podermos reformar. A situação é ainda mais gravosa quando pensamos no envelhecimento da população e Portugal, ultimamente, tem vindo a refletir uma estrutura demográfica envelhecida. Mas vamos por partes.
Porque é que a idade da reforma aumenta? Precisamente porque está indexada à esperança de média de vida a partir dos 65 anos, fixada em 19,31. Quanto mais tempo vivermos mais tempo teremos de trabalhar, assim, quanto maior a qualidade de vida e cuidados de saúde tivermos, menos anos teremos para deles usufruir.
Na base do problema consta o regime de repartição vigente em Portugal e na maioria dos países europeus. É um sistema que põe os sujeitos ativos a contribuir diretamente para os sujeitos passivos. Mais explicitamente, o valor pago todos os meses à Segurança Social por cada trabalhador reverte a favor das pensões de velhice existentes.
A questão centra-se que, nesta tal sociedade envelhecida, os contribuintes são cada vez menos e os beneficiários cada vez mais. Uma situação que nos remete para a crónica incerteza de sustentabilidade do sistema de Segurança Social, para o agravamento das despesas com as pensões de velhice ou de reforma e para o aumento progressivo do esforço contributivo. Nesta linha de pensamento, a reforma faz bem à saúde? Segundo a perspetiva da especialista Filomena Salgado Oliveira (2017), sócia-gerente da FSO Consultores, “devia ser possível reformarmo-nos parcialmente e manter rendimentos.
Havia duas grandes vantagens se a saída do mercado de trabalho fosse progressiva: as pessoas tinham tempo livre, mas ficavam ocupadas e mantinham-se ativas, e transmitiam conhecimento, que é uma coisa extremamente importante porque de um dia para o outro as pessoas saem e o conhecimento perde-se”.
Em suma, o atual sistema que foi estudado e aplicado, e bem, na nossa sociedade revelou-se agora obsoleto dada a mudança radical do perfil da sociedade. A substituição de gerações que o sistema pressuponha revelou-se já afetada e a fórmula de cálculo divide-se, restando três hipóteses: diminuir as pensões, ou aumentar as contribuições, ou aumentar a idade da reforma.

Alexandre Barbosa

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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