sábado, 22 de dezembro de 2018

Criptomoedas e a ´Blockchain`

As  criptomoedas  têm  dado  muito  que  falar,  em  especial  nos  últimos  dois  anos,  após  o  “boom”  ocorrido  em  Janeiro  de  2018,  seguido  do  “crash”  até  ao  presente.  No  início  de  2018,  o  mercado  das  criptomoedas  chegou  a  atingir  os  700  mil  milhões  de  dólares.  Hoje,  vale  cerca  de  125  mil  milhões.  A  queda  foi  resultado  da  implementação  de  contractos  futuros,  que  facilitaram  o  “short”  da  criptomoedas  (BTC),  eliminando  o  preço  fictício  que  detinha,  derivado  da  alavancagem  permitida  pelas  corretoras.  Ou  seja,  sem  alteração  dos  fundamentais,  as  criptomoedas  cresceram  exponencialmente,  atingindo  valores  insustentáveis,  alimentados  por  dívida,  e  após  pressão  dos  vendedores  (provocando  o  chamado  “margin  squeeze”),  posições  alavancadas  foram  forçadas  a  serem  vendidas.  A  exemplo,  a  Bitcoin  caiu  de  máximos  de  19  000 $  para  os  4  000 $  (preço  médio  corrente).
Esta  desinformação  deveu-se  ao  facto  de  as  transações  das  criptomoedas  serem  maioritariamente  realizadas  por  “investidores  de  retalho”,  e  não  por  investidores  institucionais.  Logo,  estes,  sendo  mais  desinformados,  estão  mais  facilmente  sujeitos  a  manipulações  e  persuasões  sobre  as  suas  expetativas,  ou  seja,  maior  parte  do  volume  transacionado  era  derivado  de  indivíduos  que  não  sabiam  o  que  estavam  a  comprar. Mas  então,  se  não  existiu  alterações  dos  fundamentais,  de  onde  veio  esta  euforia  sobre  a  tecnologia  “Blockchain”?
Apesar  destas  conotações  negativas,  as  criptomoedas  têm  como  objetivos  resolver  certos  problemas  inerentes  a  um  sistema  fiduciário  tradicional,  nomeadamente  o  problema  de  inconsistência  temporal.  Na abstenção  de  políticas  reguladoras,  entidades  responsáveis  pela  oferta  e  distribuição  monetária  (B.C.  e  bancos  comerciais)  não  são  incentivadas  a  reter  moeda  de  forma  a  evitar  uma  sobre-inflação  dos  preços  (White  1999).  Produtores  de  moeda  podem  criar  moeda  de  forma  a  “produzir”  receita,  hiperinflacionando  a  economia,  contudo  potenciais  consumidores  não  têm  incentivos  para  reter  a  mesma. 
Apesar  deste  fenómeno  não  ser  visível  em  economias  avançadas,  é  fortemente  realizável  em  economias  subdesenvolvidas,  como  a  hiperinflação  do  dólar  Zimbabuense  de  2009,    ou    a    recente    crise    vivida    na    Venezuela,    onde    o    próprio    dinheiro  (papel)    é    usado    para    produzir    acessórios    de    moda (Ex:  Bolsas  e  carteiras).    Visto o sistema  bancário  e  financeiro  ser  o  intermediário  entre  Bancos  Centrais  e  a  população,  a  confiança  na  moeda  fiduciária  encontra-se  paralelamente  subjacente  ao  funcionamento  deste  primeiro,  o  que  implica  que  apenas  uma  pequena  intervenção  de  agentes  maliciosos  (gananciosos)  ou  manipuladores  (Ex:  ciclo  político  económico  e  as  eleições),  possa  destabilizar  completamente  uma  economia. 
As  criptomoedas,  face  aos  problemas  descritos,  eliminam  a  necessidade  de  intermediários  bancários  na  realização  de  transações,  permitem  uma  descentralização  governamental  quanto  à  emição  de  moeda  e  têm  o  potencial  de  eliminar  qualquer  tipo  de  atividade  corrupta,  se  estas  destituíssem  o  seu  caráter  anónimo. 
São  compreensíveis  as  razões  pelas  quais  as  criptomoedas  são  um  “bicho  de  7  cabeças”.  Na  sua  estrutura  atual,  são  dificilmente  taxáveis,  eliminariam  o  poder  das  políticas  monetárias  (se  assumidas  como  moeda  principal  corrente),  são  demasiado  voláteis , levando  a  um  “pricing  out  the  dollar”  (  Warren  Buffet  2017)  e,  acima  de  tudo,  dado  o  seu  caráter  anónimo  facilitam  o  tráfico  ilegal. 
Concluindo,  no  seu  estado  atual,  as  criptomoedas  de  pouco  servem    e    não  devem  sequer    ser  consideradas    moedas,  contudo  a  potencialidade  da  tecnologia  por  detrás  delas  é  ilimitada.  Eliminando o caráter anónimo,  o  tráfico  ilegal  das  mesmas  seria  fortemente  limitado,  bem  como  a  própria  corrupção  (David  Cameron:  "most  excites  me  is  the  potential  that  your  technology  has  to  fight  corruption”).  A  transparência daí decorrente permitiria  a entidades  centrais  seguir o rasto de  qualquer  ato  ilegal  cometido.  Finalmente,  para  defensores  de  mercados  livres,  a  blockchain  é  o  passo  certo  para  a  destituição  de  barreiras  à  proliferação  comercial.  Se pensarmos mais além,  quando  reduzidas  discrepâncias  económicas  entre  os  países,  tal seria um  grande  passo  para  a  criação  de  uma  área  monetária  ótima.  

Luan  Fermino  Pires

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

Sem comentários: