quarta-feira, 16 de outubro de 2013

A descida do IRC

Samuel Johnson disse que só há duas coisas certas na vida: a morte e os impostos. Foi a tentar amenizar a segunda que António Pires de Lima proclamou a descida do IRC como bandeira da sua nomeação para Ministro da Economia, sucedendo no cargo a Álvaro Santos Pereira. A ideia é reduzir progressivamente a taxa que incide sobre os lucros das empresas, dos actuais 25% para 19% em 2018 (ainda sujeito a discussão) [1]. Note-se que a estes é necessário somar os valores das derramas estatal e municipal, que tornam a taxa total 31,5%. Estes valores são consideravelmente elevados quando comparados com os parceiros europeus. A média europeia, segundo um estudo recente da consultora KPMG, situa-se nos 20,5% (excluindo as sobretaxas). O Estado arrecadou em 2012 4 280,5 milhões de euros com o IRC [2], o que representa cerca de 13% do total das receitas fiscais.
Segundo a Comissão de Reforma do IRC, liderada por António Lobo Xavier, esta taxa é um dos aspectos mais valorizados pelas empresas na hora de tomarem uma decisão em relação à localização da estrutura produtiva. Uma análise rápida permite perceber que apenas a França apresenta uma taxa superior à portuguesa (33%). A tendência, sobretudo dos países mais pequenos, tem sido a descida do IRC e a subida do IVA, numa tentativa de aumentar a competitividade fiscal.
No caso português, surge a dúvida de quem pagará esta descida; uma diminuição de 2 pontos percentuais, já em 2014, representaria uma perda fiscal na ordem dos 220 milhões de euros. Algo que, face aos objectivos estabelecidos no compromisso com a Troika, teria de ser compensado, muito provavelmente, através da subida do IRS, acentuando a tendência que se tem assistido nos últimos anos de transferência de obrigações fiscais do capital para o trabalho.
Na minha opinião, é inegável que Portugal enfrenta hoje um grave problema de falta de competitividade. Sobretudo se a estratégia do actual Governo passar por persistir em competir com países onde não só o IRC é mais baixo (por exemplo os casos da Bulgária, com 10%, ou da Letónia, com 15%), mas também os custos unitários do trabalho. Se, por outro lado, a aposta passar pela qualificação da mão-de-obra e na promoção de indústrias de elevado valor acrescentado, esta taxa não será um factor tão determinante de competitividade.
No entanto, caso se verifique uma descida do IRC, a compensação não poderá passar pelo aumento da tributação do trabalho e do consumo, simplesmente porque não há espaço para aumentar nenhum imposto em Portugal. Como o aumento do investimento esperado com esta medida (e consequente aumento da tributação) não terá efeito imediato, só será possível o aumento da receita através do crescimento da eficiência no sistema de tributação e do combate à fraude. Neste sentido, importa também realçar que uma taxa de IRC mais baixa, à partida, constituiria um desincentivo à evasão fiscal. Uma das soluções propostas pela Comissão passa pelo agravamento do IRS sobre os dividendos, que, para além de aumentar a receita fiscal, constitui um incentivo ao reinvestimento em detrimento da detenção passiva do capital. Não será isto, no entanto, um contra-senso? São medidas antagónicas no que à captação do investimento diz respeito.
Por outro lado, uma taxa de IRC baixa pode dar azo a triangulações de rendimentos (os chamados oportunistas fiscais), que aproveitam a baixa tributação para aumentar os seus rendimentos. Neste caso, o valor acrescentado para a economia é praticamente nulo. Seria porventura mais interessante e eficaz a concessão de crédito ao investimento, caso o objectivo seja a atracção de investimento produtivo e a criação de emprego.
Por último, parece-me que, na perspectiva de captar investimento estrangeiro, mais importante do que apresentar impostos reduzidos é assegurar um compromisso de estabilidade e confiança. De pouco valerá diminuir o IRC se os potenciais investidores não acreditarem que esta se irá manter inalterada no médio-prazo. Episódios como a recente crise governamental em nada contribuem para tornar Portugal num destino apetecível de investimento sólido e rentável.

João Nuno Ferreira Antunes

2-      Pordata

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1ºciclo) da EGG/UMinho]

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