Grande parte da classe política foi criando ao
longo dos tempos o estereótipo de que os mercados devem ser livres. Nesse
seguimento, afirmavam (e ainda afirmam) que quando o Estado interfere para
ditar o que os participantes no mercado podem ou não fazer, os recursos não são
aplicados de forma mais eficiente. Assim sendo, se o Estado impõe um tecto nas
rendas de casa, os senhorios perdem o incentivo para fazer a manutenção dos
seus imóveis ou construir novas infra-estruturas. Por outro lado, se o Estado
restringir a variedade dos produtos financeiros que podem ser comercializados,
haverá sempre duas ou mais partes que poderiam ter beneficiado de transacções
inovadoras adequadas para satisfazer as suas necessidades específicas e que não
aproveitam os possíveis ganhos da contratação.
Todavia, o mercado livre não existe! Todo e
qualquer mercado opera segundo determinadas regras e limitações, que restringem
a liberdade de escolha. Um mercado apenas pode parecer livre, uma vez que
aceitamos de forma incondicional as restrições que lhe subjazem, o que nos
impede de as ver. O grau de liberdade de um mercado não deve ser definido
objectivamente, dado que se trata de uma definição política.
A pretensão
habitual de alguns economistas, que dizem que estão a tentar defender o mercado
das interferências por parte de um governo politicamente motivado, é falsa. Mas,
na verdade, o comércio livre é justo? Julgo que qualquer cidadão informado
acredita que a China e a Índia realizam comércio internacional que pode ser
livre, mas que não é justo. Pagar aos trabalhadores salários inaceitavelmente
reduzidos e ao fazê-los trabalhar em condições precárias ou inumanas, estes
gigantes asiáticos competem de forma injusta. Estes também podem ripostar
dizendo ser inaceitável que os países ricos, ao mesmo tempo que defendem o
mercado livre, tentam impor barreiras às suas exportações, tendo em conta que
exploram o único recurso de que dispõe em abundância – trabalho barato. Embora
estes países asiáticos não se possam dar ao luxo de pagar salários ocidentais
ou proporcionar as condições de trabalho, podem certamente melhorar os salários
e as condições de trabalho. Assim perspectivado, o debate acerca do comércio
justo baseia-se essencialmente nos valores morais e decisões políticas, e não
economia no sentido habitual.
Em suma, quebrar a ilusão da objectividade do
mercado é o primeiro passo na compreensão do capitalismo.
André Torres Oliveira da Silva
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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