Nos últimos anos (talvez possamos falar nos últimos 20 anos), o país olhou para o Tribunal Constitucional de forma distante. Como uma entidade de ultimo recurso, cujos juízes ninguém sabe bem quem são, que visão têm do país, que valores defendem. Que poucos sabem quem nomeou e como. Muito menos se verifica como votam e com que fundamentação.
Até ao último Verão, seriam muito poucos os que saberiam como funcionaria o Tribunal, por exemplo, nas férias quando se pensa que apenas meia dúzia de juízes fica de prevenção, prontos a julgar o que lhes for atribuído.
É preciso salientar que nada disto aconteceu por culpa do TC, muito menos dos juízes. Aconteceu porque o TC estava protegido das grandes polémicas desde o fim do processo de liberalização da economia. Aconteceu porque os dois maiores partidos partilham o poder de nomeação quase sem interferência e preferem a opacidade dos processos que dominam à transparência do que lhes escapa ao controlo. Aconteceu, também, porque a comunicação social pouco se tem interessado pelo tema – as nomeações que passam pelo Parlamento tão despercebidas ao escrutínio público quanto a mediação de forças lá dentro.
Acontece que os anos de austeridade também mudaram isto: o TC tornou-se o centro da decisão política em Portugal. E, sendo assim, é importante que se olhe para ele com renovada atenção. Só assim o processo democrático de escrutínio das instituições pode ficar completo, à vista de todos, para que cada um tire as suas conclusões.
Agora que acabamos de saber a decisão do TC sobre o corte de pensões – possivelmente, a mais importante decisão dos 13 juízes nas últimas dezenas de anos – é importante fazer as contas às decisões tomadas no palácio Ratton neste período de emergência.
A conclusão a que chegamos: os juízes nomeados pelo PS são sempre, em qualquer conta, mais adversos a medidas restritivas do que os nomeados pela direita. E estes últimos são bastante mais críticos das medidas do que o actual Governo gostaria.
É certo que este tema poderia ser amplamente explorado, mas de todo o modo deixo-o num parágrafo: a decisão tomada pelo TC em chumbar a medida não pode ser motivo de queixa por parte do Governo. Basta dizer que os dois juízes que PSD e CDS escolheram, apenas há um ano, para o TC, foram muito mais intolerantes face às suas medidas do que os juízes escolhidos por cooptação.
Este pode não ser literalmente um tribunal político. Mas se os partidos não escolhem quem está mais perto do seu sistema de valores, não se podem queixar que as decisões ignoram os seus argumentos. Assim é a democracia.
José Miguel Soares
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
Até ao último Verão, seriam muito poucos os que saberiam como funcionaria o Tribunal, por exemplo, nas férias quando se pensa que apenas meia dúzia de juízes fica de prevenção, prontos a julgar o que lhes for atribuído.
É preciso salientar que nada disto aconteceu por culpa do TC, muito menos dos juízes. Aconteceu porque o TC estava protegido das grandes polémicas desde o fim do processo de liberalização da economia. Aconteceu porque os dois maiores partidos partilham o poder de nomeação quase sem interferência e preferem a opacidade dos processos que dominam à transparência do que lhes escapa ao controlo. Aconteceu, também, porque a comunicação social pouco se tem interessado pelo tema – as nomeações que passam pelo Parlamento tão despercebidas ao escrutínio público quanto a mediação de forças lá dentro.
Acontece que os anos de austeridade também mudaram isto: o TC tornou-se o centro da decisão política em Portugal. E, sendo assim, é importante que se olhe para ele com renovada atenção. Só assim o processo democrático de escrutínio das instituições pode ficar completo, à vista de todos, para que cada um tire as suas conclusões.
Agora que acabamos de saber a decisão do TC sobre o corte de pensões – possivelmente, a mais importante decisão dos 13 juízes nas últimas dezenas de anos – é importante fazer as contas às decisões tomadas no palácio Ratton neste período de emergência.
A conclusão a que chegamos: os juízes nomeados pelo PS são sempre, em qualquer conta, mais adversos a medidas restritivas do que os nomeados pela direita. E estes últimos são bastante mais críticos das medidas do que o actual Governo gostaria.
É certo que este tema poderia ser amplamente explorado, mas de todo o modo deixo-o num parágrafo: a decisão tomada pelo TC em chumbar a medida não pode ser motivo de queixa por parte do Governo. Basta dizer que os dois juízes que PSD e CDS escolheram, apenas há um ano, para o TC, foram muito mais intolerantes face às suas medidas do que os juízes escolhidos por cooptação.
Este pode não ser literalmente um tribunal político. Mas se os partidos não escolhem quem está mais perto do seu sistema de valores, não se podem queixar que as decisões ignoram os seus argumentos. Assim é a democracia.
José Miguel Soares
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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