sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Afinal o Mundo Ocidental não enlouqueceu

Ao longo do último ano assistimos a algumas decisões populares no mínimo estranhas. Observámos uma América que elegeu um empresário estrela de reality show que tem ideias extremas quanto às relações do seu país com o resto do mundo, e a um Reino Unido que demonstrou uma vontade inequívoca de se afastar do resto da Europa. No entanto, no início de dezembro, dois votos populares podem ter posto um ponto final a esta aparente loucura.
Efetivamente, a Europa parece ter voltado à normalidade no Domingo dia 4 de dezembro. Tanto na Áustria como em Itália as pessoas foram às urnas votar sobre questões fundamentais que afetariam não só o próprio país como toda a Europa. Alexander Van der Bellen ganhou as eleições presidenciais na Áustria, que foram disputadas com o candidato de Extrema-Direita Norbert Hofer. A vitória do ecologista foi muito importante para o futuro Europeu, e para o futuro do seu país, uma vez que o seu oponente fez uma campanha baseada em ideais separatistas e nacionalistas que põem em causa muitas das conquistas que foram atingidas em termos de cooperação europeia.
Em Itália, ganhou o não num referendo que tinha como objetivo aprovar uma revisão da constituição que iria simplificar o sistema político. Esta revisão tinha em vista acabar com o “bicamerismo perfeito”, situação atual do sistema político em que a Câmara dos Deputados e a Câmara do Senado têm praticamente o mesmo peso no processo de aprovação de leis. A ideia era reduzir o número de Senadores de 315 para 100, e que estes fossem representantes regionais, para que este órgão perca poder e o processo legislativo seja mais fácil. Aparentemente, parecia uma revisão legítima, no entanto, anexada a esta revisão estava uma nova lei eleitoral que iria permitir que um partido que conseguisse angariar 40% dos votos para a Câmara dos Deputados teria poder de voto como se tivesse obtido 54% dos mesmos. Esta medida poria em causa alguns valores básicos da democracia, e por isso, na minha opinião, o povo italiano tomou a decisão correta, apesar das várias chantagens psicológicas feitas pelo Primeiro-Ministro Matteo Renzi, que foram desde a ameaça da demissão caso ganhasse o não a prometer aumentar os funcionários públicos 2 dias antes das eleições.
No entanto, com o governo demissionário vem outro perigo. Existe um movimento em Itália chamado 5 estrelas, fundado pelo comediante Bepe Grillo, que tem como principal bandeira o euroceticismo. Este movimento está taco a taco com o partido do atual governo nas sondagens, e pode ser um grande perigo para o sonho Europeu. Podemos estar perante um segundo Brexit, e se a União Europeia resistiu ao primeiro não é certo que resista ao segundo, dado que a Itália faz parte da moeda única e possuiu a segunda divida externa maior do mundo. Se este gigante sair do Euro, os Mercados irão cair em todo o mundo e poderemos estar perante a pior crise financeira à qual Europa já assistiu. Contudo, e apesar da pressão exercida pelo Primeiro-Ministro demissionário, ainda não é certo que possa haver eleições antecipadas, dado que o atual Ministro dos Negócios Estrangeiros, Paolo Gentiloni, foi convidado pelo presidente a formar governo.
Da mesma forma, este perigo surge novamente no ano 2017 com as eleições presidenciais em França. O movimento eurocético apresentou bastantes apoiantes nas eleições regionais do ano passado, com a Frente Nacional, encabeçada por Marine Le Pen, a ganhar bastantes regiões na primeira volta. Na segunda volta perderam, no entanto, foi necessário a junção dos partidos considerados tradicionais para atingirem a vitória. É previsível que em 2017 seja necessário um esforço semelhante para travar a saída da França da União Europeia.
Concluindo, penso que ambas as decisões tomadas no dia 4 de Dezembro foram acertadas, no entanto, o perigo do extremismo está sempre à porta, e é necessário que a Europa como um todo comece a apresentar progressos que tornem inegáveis os benefícios que esta união traz.

Miguel Domingues

Fontes:
Jornal de Noticias
Expresso
Público
Observador

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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