domingo, 11 de novembro de 2012

Onde anda o Pai Natal?

Lembra-se daquela figura dócil de barbas brancas e vestes vermelhas, que à meia-noite entrava nas nossas casas e deixava os presentes que eram o motivo do nosso eufórico festim na madrugada seguinte?
Quantas vezes reencaminhamos uma carta, em meio de reclamação, mostrando o nosso descontentamento por o Pai Natal nem sempre corresponder exactamente aos nossos pedidos?
Este ano, muitas crianças sujeitam-se a nem ter, mesmo, uma breve visita desta figura paternalista.
Durante os últimos tempos, especialmente ao longo das últimas duas décadas, o endividamento das famílias tem vindo a tomar proporções exarcebadas.
Se em 1990 o endividamento dos particulares representava 20% do rendimento disponível, em 2004 era já de 118% e em 2009 de 131%. É, no entanto, de salientar que embora os últimos dois anos tenham sido marcadamente caracterizados pela redução do rendimento disponível, associado à quebra das remunerações e das prestações sociais e ao agravamento da carga fiscal, e pela redução ligeira da taxa de poupança, constatou-se uma maior preocupação na resolução da problemática do endividamento. Por exemplo, no ano transacto o rácio do endividamento dos particulares sobre o rendimento disponível tomava os 126%.
Na causa da deflagração dos números supracitados pode enunciar-se: o apelo agressivo ao consumo (compra de bens supérfluos); a falta de análise sobre o orçamento familiar antes de estabelecer um contrato; a instabilidade no emprego e no mercado financeiro; a alteração dos padrões de consumo das famílias portuguesas; e, sobretudo, a extrema facilidade de acesso ao crédito que se tem vindo a sentir, entre a qual os cartões de crédito (muitas vezes mais do que um) e os créditos pré-aprovados que os bancos enviam para casa, assumem uma posição de destaque. Enquanto que falar em crédito ao consumo há 20 anos era impensável (não existiam ainda outras instituições financeiras e a banca não disponibilizava dinheiro com o fim do consumo), actualmente as pessoas chegam mesmo a pedir novos empréstimos para pagar os antigos. No caso dos cartões de crédito, o facto de as famílias irem usando os plafonds e, enquanto isso, as próprias entidades financeiras irem aumentando os limites de crédito, levam à tentação de gastar mais e mais.
Segundo a DECO (Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor), todos os dias há o registo de novos pedidos de ajuda ao sobreendividamento (destaque-se que o papel da DECO, nesta situação, não passa por emprestar ou ceder dinheiro aos consumidores, mas sim, no caso em que o endividamento resulta de causas especiais e imprevisíveis, mediar a relação entre o credor e o devedor, ajustando o plano de pagamentos ou reestruturando a dívida, tendo por base o conjunto dos rendimentos e das despesas do agregado familiar). O problema não se restringe a famílias com rendimentos mais baixos, já que, ainda de acordo com a organização, a procura de apoio ao sobreendividamento é proveniente das distintas classes sociais.
A responsabilidade pode recair quer sobre as instituições financeiras, que não cedem informações suficientes quanto às implicações do crédito, quer sobre os consumidores, que negligenciam a sua capacidade de cumprir as suas obrigações. Independentemente do arguido, os resultados não poupam as vítimas. Diminuição da poupança, sobrecaga laboral; penhora (casa, carro, ...), aumento da criminalidade, rutura dos laços familiares (divórcio), doenças do foro psicológico, impossibilidade de adquirir bens de primeira necessidade (alimentares) são consequências que podem advir deste aumento do sobreendividamento dos particulares.
É consensual que gastar e possuir luxos tornou-se um estigma da sociedade independentemente de quais os meios que são utilizados para atingir os fins. As pessoas compreendem a necessidade da poupança, mas uma grande maioria ainda não é capaz de colocá-la em prática, quer por rendimentos insuficientes, quer por indisposição para alterar os hábitos.
A resolução desta problemática passa, assim, não só por um conjunto de medidas que venham restringir o acesso ao crédito, que fomentem as campanhas informativas ou elevem o rendimento disponível, como também por uma reestruturação da própria mentalidade dos portugueses.
Nunca é tarde para abandonarmos os nossos preconceitos, basta ouvir a voz da vida: as crianças. Um sorriso de uma criança não é  mais do que suficiente para declarar um ultimato ao estigma social? Ajudemos, então o Pai Natal a encontrar o caminho de volta!

Quer prevenir o endividamento? Eis aqui as dicas:
Ponderar bem antes de gastar (é uma despesa necessária?);
Analisar o seu orçamento;
Determinar a sua capacidade de reembolso;
Constituir uma poupança prévia;
Estabelecer os seus limites;
Determinar o montante máximo de um empréstimo;
Ter em conta os custos associados à compra (é apenas o valor do bem, ou acrescem-lhe outras despesas?);
Comparar os produtos/serviços (faça uma pesquisa antes de emagrecer a sua carteira);
Incluir na sua decisão de compra, os artigos em segunda mão (os produtos transaccionados nestes mercados podem ser até 70% mais baratos do que o valor original).

Sandra Maria Soares Ferreira

Bibliografia:

[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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