A proposta de lei de Orçamento de Estado para 2013 é “a única possível” e Portugal e não tem “qualquer margem de manobra”, começou por comunicar o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, na conferência de imprensa para apresentação do Orçamento de Estado, entregue no dia 15 de outubro na Assembleia da República.
Na opinião de muitos que comentam economia, o OE para 2013 é de simples entendimento: trata-se de uma tentativa de redução do défice em cerca de 1.5% do PIB através de um aumento de impostos brutais, essencialmente nos impostos diretos. No caso de Portugal falamos do imposto sobre o rendimento de pessoas singulares (IRS) e do imposto sobre o rendimento de pessoas coletivas (IRC).
Em 2011, quando o governo avançou com uma sobretaxa de 3,5%, decidiu que o pagamento dessa taxa seria feito através de uma retenção extraordinária do subsídio de natal de 50%, sendo o acerto feito na declaração de IRS face aos rendimentos desse ano. Para o próximo ano, o governo vai aplicar uma sobretaxa de 4% no IRS, que será descontada mensalmente nos rendimentos dos contribuintes, mas cuja retenção na fonte total não pode ultrapassar 45% do rendimento de cada trabalhador ou pensionista. Portugal detinha oito escalões de IRS, agora serão apenas cinco, de forma a ir de encontro da média europeia, que é de três a quatro escalões. Para o próximo ano, os escalões do IRS vão oscilar entre 14,5%, para rendimentos até sete mil euros, e 48%, para rendimentos superiores a 80 mil euros. No segundo escalão, a taxa passa para 28,5% para valores entre os sete e os vinte mil euros.
Depois de muito falada e comentada, a cláusula de salvaguarda geral no Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) irá continuar em vigor, limitando os aumentos na tributação dos edifícios. O que também se mantém igual no OE para 2013 é o IVA, imposto indireto, não estando previstas alterações nas taxas existentes, ao contrário do que era esperado.
Pouca coisa se mantêm e muitas outras coisas sofrem alterações desmedidas. Um dos cortes muito apontados neste OE é o corte em pelo menos 250 milhões de euros em 2013 nos encargos brutos com as Parcerias Público-Privadas, as famosas PPP, o que apresenta uma redução superior a 30% face ao inicialmente contratado.
Os subsídios de desemprego e de doença serão também reduzidos em 6% e em 5%, respetivamente. Esta contribuição prevista no OE para 2013 reverte a favor do instituto de gestão financeira da segurança social e passa a ser deduzida dos montantes das prestações pagas pelas instituições de segurança social.
A remuneração do trabalho a funcionários públicos, em feriados, será um dos aspetos que também irá sofrer um ajustamento de 50 para 25% no próximo ano, onde a remuneração de horas extraordinárias também é reduzida para metade. O trabalho extraordinário prestado em dia normal passa a ser pago com um acréscimo de 12,5% na primeira hora e 18,75% nas restantes horas de trabalho. Outro aspeto relevante é o corte de 50% nos contratos a termo na função pública.
E nem os pensionistas escapam às medidas de austeridade: os reformados vão sofrer um corte nas pensões de 3,5% em rendimentos a partir de 1350 euros, a que acumula um corte de 16% acima de 1800 euros.
A comunicação social, mais concretamente a RTP e a agência Lusa, também irá ser alvo de reformas muito apertadas. De acordo com o OE para 2013, no próximo ano os subsídios e indeminizações compensatórias recebem um corte na ordem dos 42,2% na RTP e 30,9% no orçamento da agência Lusa. As duas empresas, que em 2012 receberam cerca de 140 milhões de euros, perdem no próximo ano um total de quase 74 milhões de euros.
Todos acreditamos que o propósito de tanta austeridade tem como principal objetivo fazer com que as metas negociadas com a "troika" sejam cumpridas, fazendo com que ganhemos novamente credibilidade externa, reduzindo o prémio de risco da dívida, podendo assim Portugal voltar ao financiamento dos mercados. A estratégia falhará se não cumprirmos as metas de redução do défice, ou se os mercados não nos “abrirem as portas”.
O World Economic Outlook (WEO)(1) do FMI, publicado no passado mês, é arrasador para as probabilidades de sucesso do plano de ajustamento imposto pela "troika". Em primeiro lugar, é referido que os multiplicadores usados na avaliação do impacto da consolidação orçamental na atividade económica podem estar redondamente errados. Entendamos como multiplicador o valor de quanto irá diminuir o PIB por cada ponto de redução do peso do défice público. Este valor julgava-se estar nos 0,5, significando isto que uma redução de 1,5% no PIB levaria a uma redução de 0,75 pontos percentuais no produto. Na realidade, o FMI vem agora dizer que este valor se encontra entre os 0,9 e os 1,7. Certificando-se estes valores, a meta de consolidação do défice levará a uma queda no produto, de, em média, dois pontos percentuais. Podemos então dizer que o indicador por excelência do sucesso das medidas de austeridade, peso do défice no produto, irá piorar com políticas delineadas para o melhorar.
O WEO refere também episódios passados na história da economia mundial dando-nos a conhecer algumas situações em que países tentaram lidar com excessos de dívida pública, como acontece em Portugal nos dias de hoje, e o resultado não foi o esperado. Embora os tempos sejam outros, e a dinâmica da economia mundial seja completamente diferente do que era há cem anos atrás, devemos ser humildes e retirar lições que nos podem ser úteis para o presente. Todos temos de ter consciência que retirar um país de uma espiral recessiva não é tarefa fácil, e de como o seu sucesso passa por um equilíbrio ténue tanto a nível interno como externo, e que experiências mal sucedidas levam a que as condições iniciais piorem depois de uma intervenção falhada.
Isto aconteceu, de facto, no Reino Unido no período pós primeira guerra mundial, quando este país se comprometeu a reduzir uma dívida pública de 140% do PIB através de um rígido programa de cortes na despesa e de impostos elevados. O resultado destas medidas foi uma recessão atroz, um aumento desenfreado na taxa de desemprego e um agravamento da dívida para 160% do PIB.
Não devemos ser pessimistas, mas a verdade é que estes dados são realmente preocupantes e deixam-nos a pensar se este OE para 2013 será o melhor para o nosso país. Será tanta austeridade o caminho para afastar Portugal da crise?
O Conselho Económico Social diz que não. O CES considerou que o OE para 2013 não responde à necessidade de crescimento económico, de melhoria de financiamento da Economia e de aumento dos postos de trabalho. O mesmo alerta para que a consolidação orçamental, por si só, não criará condições que levem a existir crescimento económico. Pode até, e como já vimos, se realizada de forma errada, pô-lo em causa.
Eugénio Carlos Oliveira Castro
(1)Relatório que apresenta a análise do corpo técnico do FMI relativamente à projeção da evolução económica a nível global. Foca-se nas principais questões de política económica bem como na análise da evolução e perspetivas económicas. É realizado duas vezes por ano como documentação para as reuniões do FMI e é o principal instrumento das ações de vigilância por parte do FMI.
[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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