João Cravinho, Manuela Ferreira Leite, Bagão Félix, Ferro Rodrigues e Vítor Martins foram alguns dos subscritores do manifesto pela reestruturação da divida pública que referia, entre outras coisas, o seguinte: «Os mecanismos de reestruturação devem instituir processos necessários à recuperação das economias afectadas pela austeridade e recessão, tendo em atenção a sua capacidade de pagamento em harmonia com o favorecimento do crescimento económico e do emprego num contexto de coesão nacional». Que tal deixarem para a geração seguinte a tarefa de resolver os problemas graves que vocês lhes deixaram?
É importante sublinhar que 70 das mais importantes personalidades do país vieram propor que se diga aos credores internacionais o seguinte:
“– Desculpem lá mas nós não conseguimos pagar tudo o que vos devemos, não conseguimos sequer cumprir as condições que nós próprios assinámos”.
O Manifesto dos 74, apresentado em Março, foi o pontapé de saída para um debate que se acentuou nas últimas semanas e que já levou o PS, sem se comprometer com nenhuma posição, a também querer discutir o assunto. A reestruturação de uma dívida implica, à partida, um incumprimento nos termos previamente acordados e, muito provavelmente, uma redução da dívida. Essa solução está fora de questão uma vez que voltaria todos os mercados contra Portugal.
Na hipótese, remota, espero, de o Governo pedir uma reestruturação da nossa dívida, os juros no mercado secundário iriam aumentar imediatamente e deitar a perder mais de três anos de austeridade necessária e incontornável para recuperar a confiança dos investidores, obrigando, assim, a um novo programa de resgate e ainda a mais austeridade.
Os credores externos, nomeadamente os alemães, iriam imediatamente responder: porque é que não começam por vocês próprios?
Os nossos bancos têm mais de 25 por cento da nossa dívida pública nos seus balanços, mais de 40 mil milhões de euros, e o nosso Fundo de Capitalização da Segurança Social tem mais de 8 mil milhões de euros de obrigações do Tesouro.
Iriam dizer: peçam-lhes um perdão parcial de capital e de juros.
Um facto que tem sido recentemente explicado é o de que uma reestruturação de dívida pública não se pede nem se anuncia publicamente. Portugal já fez e continua a fazer uma reestruturação discreta da nossa dívida pública.
Vitor Gaspar, como ministro das Finanças, e Maria Luis Albuquerque, como Secretária de Estado do Tesouro, negociaram com o BCE e a Comissão Europeia uma baixa das taxas de juro do dinheiro da assistência, de cerca de 5 por cento para 3,5 por cento, negociaram a redistribuição das maturidades de 52 mil milhões de euros dos respetivos créditos para o período entre 2022 e 2035, quando os pagamentos estavam previstos para os anos entre 2015 e 2022, esse sim um calendário que era insustentável. Ao mesmo tempo, juntamente com o IGCP dirigido por João Moreira Rato, negociaram com os credores privados Ofertas Públicas de Troca que consistem basicamente em convencê-los a receber o dinheiro mais tarde.
Este “fenómeno” chama-se um “light restructuring”, ou seja, uma reestruturação suave e discreta da nossa dívida, que continua a ser feita mas nunca pode ser anunciada ao mundo como uma declaração de incapacidade de pagarmos as nossas responsabilidades.
A única solução realista e que não atirará o país para uma situação de emergência é continuar a satisfazer pontualmente as obrigações contratualizadas, esperando que os credores sugiram uma extensão do prazo de pagamento. Este é um assunto que, dada a sensibilidade dos mercados, tem de ser conduzido com muito tacto e grande bom senso, porque a mais pequena dúvida ou desconfiança pode significar o descalabro das taxas de juro da dívida pública, que depois se estenderá às empresas e aos bancos, com consequências desastrosas para o conjunto da economia.
Caros subscritores do Manifesto para a reestruturação da dívida pública, desculpem a franqueza: a vossa geração está errada. Não agravem ainda mais os problemas que deixaram para a geração seguinte. Façam um favor ao país: não criem mais problemas. Deixem os mais novos trabalhar.
Maria Alexandra Pereira Lima
Fontes:
http://www.imf.org/external/country/PRT/ndex.htm
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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