É impossível ser-se indiferente à crescente procura de automóveis elétricos. A indústria automóvel não esconde esta indiferença investindo e transladando cada vez mais recursos para a sua comercialização. Porém, será que o ramo automóvel está a caminhar na direção certa ou a dirigir-se para um precipício?
É indiscutível que a procura de meios de transportes
movidos a energias mais limpas é prioritário. Atualmente, 30% do dióxido de
carbono emitido na União Europeia provém dos transportes, sendo que 72% dos
mesmos são oriundos dos transportes rodoviários. Esta entidade definiu como
objetivo reduzir este valor em 60% até 2050, meta que poderá ser alcançada de
duas formas: reduzindo o número de carros em circulação; ou substituir os
atuais por veículos movidos a energias menos poluentes. A indústria automóvel,
naturalmente, optou pela solução que não prejudicaria as suas vendas,
investindo na investigação e desenvolvimento de motores movidos a eletricidade
– estima-se que nos próximos cinco a 10 anos sejam investidos 300 mil milhões
de dólares em tecnologias de carros elétricos.
Todavia, a solução elétrica não é alheia de aspetos menos
positivos. É indubitável a menor eficiência deste tipo de veículos, seja pela
sua menor esperança de vida, entre 8 a 10 anos, ou pela sua menor autonomia,
flutuando entre os 100 e 400 quilómetros para veículos elétricos a bateria e de
320 a 600 quilómetros para veículos elétricos a célula de combustível. Ademais,
acrescentam-se as críticas levantadas em relação à pegada ecológica desta nova
tecnologia.
Primeiramente,
esta prende-se com a proveniência da energia utilizada como propulsora dos
mesmos. Atualmente, menos de 20% da energia produzida na União Europeia advém
de energias renováveis. Desta forma, apesar do mercado ser dominado por motores
de combustão, grande parte da energia utilizada nos carros elétricos já provém
da queima de combustíveis fósseis. Suponhamos, agora, que a transição para os
veículos elétricos é total. Em Portugal, seria expectável um aumento do consumo
de energia em 14,2% (6665 GWh), ou seja, assumindo que esta transição não é
acompanhada, na totalidade, por um maior investimento em energias renováveis, esta
culminaria num aumento da queima de combustíveis fósseis.
Em
segundo lugar, tem-se o acréscimo da exploração das reservas mundiais de lítio.
Sabe-se que uma tonelada de lítio poderá levar a emissões tão exorbitantes de
CO2 como 15 toneladas e a um consumo de perto de 2 milhões de litros de água, para
além de todo o impacto em termos paisagísticos e na biodiversidade resultantes
de dita exploração. Em suma, a transição para o elétrico findaria não só na
utilização de combustíveis fósseis, já consumidos pelos motores a combustão,
mas também da exploração em massa do lítio.
Ademais do impacto ambiental desta revolução elétrica, o
impacto económico é indeclinável. Por um lado, prende-se com a questão da
realocação de parte da indústria. O senso comum diz-nos que as indústrias irão
procurar estar junto dos recursos naturais por questões de eficiência, maior
rapidez e menor custo no transporte do local de extração para o local de
transformação. Com isto, teremos a fuga de diversas indústrias do território
europeu para junto do triangulo do lítio, formado pela Bolívia, Argentina e
Chile, impactando diretamente as economias europeias tanto ao nível da sua riqueza
como do seu emprego.
Por
outro lado, haverá um reajustamento e readaptação das indústrias que terminarem
não se realocando. É previsível um investimento tanto em capital físico como
humano de forma a capacitar as indústrias para produzir com esta nova tecnologia.
Sabendo isto, a grande questão que se alevanta é a sustentabilidade deste
investimento. Sendo a solução elétrica uma “não solução”, a indústria automóvel
estará a reinventar-se sobre os princípios errados, isto é, estará a não só
adiar como agravar um problema. As questões ambientais que se prendem com esta
necessidade de procurar uma nova tecnologia continuarão presentes, ou seja, a indústria
automóvel ficará retida numa solução menos eficiente que a atual e igualmente
danosa para o ambiente até ser capaz de desenvolver uma verdadeira resposta
para o futuro do planeta.
Em suma, acredito que a indústria automóvel tenha sentido a pressão social de combater a tendência poluente vivida nas últimas décadas conformando-se com uma resposta simples, incompleta e de curto-prazo.
Manuel Pereira
[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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