Com 86,38% dos portugueses completamente vacinados contra a covid-19, Portugal é o 2º país com a maior taxa de doses administradas por 100 habitantes do mundo e um caso de estudo para outras nações. Os governos e a imprensa internacional têm-se desdobrado em tentar desvendar qual é a razão do sucesso da vacinação portuguesa, e como replicá-la nos restantes países.
O
programa de vacinação português teve um começo atribulado, desde a vacinação
indevida dos mais influentes na sociedade, à desconfiança da população quando
as vacinas começaram a chegar ao país. Foi necessário que o Vice-Almirante
Gouveia e Melo, um comandante naval, assumisse o comando da Task Force da vacinação contra a
covid-19 para que a missão fosse bem sucedida.
As
imprensas nacionais e internacionais afirmam que a postura do Almirante foi um
fator decisivo para o êxito da vacinação. Gouveia e Melo tratou do combate ao
vírus como se de uma guerra se tratasse, usando, para isso, sempre farda
militar e linguagem de guerra. Adicionalmente, o Almirante rodeou-se de uma
equipa de matemáticos, doutores, analistas e experts em estratégia militar, deixando de lado os políticos. O
próprio afirma ainda que a consistência da mensagem é essencial, e para tal
usou as suas tropas para restaurar e construir confiança no sistema, e sugere
que para atingir o sucesso de vacinação portuguesa os outros países
"precisam de encontrar pessoas que não sejam políticos”.
A
verdade é que muitos países ocidentais, nos quais existe abundância de doses de
vacinas contra a covid-19, ainda têm uma parte significativa da população
desprotegida. Poderemos aplicar a estratégia portuguesa nesses países?
Apesar
do Almirante Gouveia e Melo ser visto como um herói pelos portugueses, e como
uma fonte de inspiração para outros líderes a nível mundial, existem outras
teorias sobre o sucesso da vacinação portuguesa. Nomeadamente, a psicóloga
clínica Laura Sanches atribui o êxito da vacinação não à credibilidade
associada ao Almirante e à sua Task-Force
mas à atitude passiva dos portugueses, afirmando que “nós (portugueses) não
temos uma cultura de questionar as autoridades”, acrescentando ainda que “o uso
de farda e linguagem militar provocaram um sentimento de medo que nos faz mais
propensos a obedecer e não questionar”. A opinião de Tiago Correia -
professor da Universidade Nova de Lisboa - vai de encontro à da psicóloga e
acrescenta que o facto de a opinião pública definir Gouveia e Melo como o
“fator chave” do sucesso da vacinação é um exagero dado que, em Portugal, já
existia uma atitude de consentimento perante o programa de vacinação nacional,
e, por outro lado, não se verifica nenhum movimento significativo anti-vacinas.
A
meu ver, penso que não seria possível replicar a estratégia portuguesa nos
restantes países, dado que, para mim, o sucesso da vacinação portuguesa se
baseou numa questão meramente cultural: os portugueses não se questionam apenas
obedecem. É um facto que Gouveia e Melo conduziu a sua missão com seriedade e
restaurou a confiança dos portugueses no processo de vacinação, desempenhando o
seu papel de forma exímia, contudo, ele só fez o que lhe competia. Nós,
portugueses, estamos tão habituados à incompetência e falta de seriedade de
quem nos dirige que, ao verem alguém desempenhar seriamente as funções para as
quais foi nomeado, não hesitamos em aclamá-lo herói nacional.
Adicionalmente,
o papel desempenhado pelos media foi preponderante, pois estes são a maior
fonte de informação sobre o vírus, e, na minha opinião, tiveram a capacidade de
influenciar o comportamento público. Estes não evidenciaram os prós e os
contras da vacinação, resultando numa falta de estímulo de pensamento crítico
da população em geral, pelo contrário, enfatizaram somente o lado que mais
favorecia o plano traçado pelo governo.
Beatriz Braga Machado
[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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