No contexto da atualidade, a nível mundial, o impacte da
pandemia provocada pelo coronavírus na realidade socioeconómica dos países é
devastador. Focando-nos nos EUA em específico, este continua a infetar milhares
de norte-americanos diariamente. À data da realização deste ensaio, há a
lamentar um total de 726 mil norte-americanos que perderam a vida por efeito da
covid-19.
Detentores
de tecnologia de topo e de alguns dos melhores centros médicos do mundo, os Estados
Unidos, não foram capazes de atender aos problemas da maioria da sua população.
De um momento para o outro, uma das maiores potências mundiais
tornou-se o epicentro da pandemia do coronavírus, agravando-se a situação
devido à inexistência de um sistema público e universal de saúde, bem como ao
acesso limitado e confinado de uma percentagem reduzida da população a consultas
médicas – cerca de 70 milhões de cidadãos encontram-se sem qualquer tipo de assistência
médica ou apenas com planos de saúde precários.
As fragilidades do sistema
de saúde norte americano são bem mais complexas quando as cruzamos com a
realidade social da sua população mais carenciada: a elevada percentagem de indivíduos
com baixos rendimentos, incapaz de aceder aos seguros de saúde cujos valores
são inflacionados pela concorrência descontrolada entre as seguradoras,
complementada com a inatividade do Estado face a todas estas problemáticas,
culminou com uma propagação descontrolada do vírus e com níveis de mortalidade
elevadíssimos, quando comparados com a realidade de outros países.
Os Estados Unidos são um dos países que mais gasta com saúde,
aproximadamente 17,7% do PIB (3,6 triliões de dólares, em 2018). No entanto, cerca
de 28 milhões de norte-americanos não possuem um seguro de saúde, já a maioria população
que possuiu um seguro de saúde tem-no por meio do seu emprego. Desde 2020, a
pandemia destruiu cerca de 22 milhões postos de trabalho, dos quais apenas
metade foi recuperada até agora. Um estudo recente do The Commonwealth
Fund estimou que cerca de 14 milhões de pessoas perderam
temporariamente o seu seguro de saúde devido à pandemia.
Face a esta dramática situação, tornou-se, para mim, de extrema
relevância a reflexão crítica sobre o equilíbrio entre os direitos e os deveres
dos cidadãos americanos e os deveres do Estado como agente de promoção de saúde
pública, facultando o acesso generalizado de toda a população aos cuidados
médicos.
Esta problemática leva-nos
a questionar a eficácia de um regime económico capitalista quando refletido num
sistema nacional de saúde. Aqui, o equilíbrio entre os direitos e os deveres do
Estado, das empresas privadas, dos hospitais e dos utentes fica claramente
anulado. Depender exclusivamente de um sistema de saúde privado
dá espaço para enormes desigualdades, uma vez que a saúde, direito fundamental
consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas,
passa a ser vista como mais um produto a guiar-se por curvas de oferta e
procura, e se torna acessível apenas a quem possui capacidade para pagar um bom
seguro de saúde. Ademais, a qualidade dos cuidados de saúde passa a reger-se pela
nossa disponibilidade financeira, colocando em risco a dignidade e a própria
vida humana dos indivíduos em situações de fragilidade.
Num
país com elevados recursos financeiros e de capital humano ao dispor,
estruturar um sistema de saúde público capacitado a dar a resposta necessária a
todos os cidadãos faria com que, muito provavelmente, todos os norte americanos
gastassem menos e tivessem os mesmos direitos, independentemente do rendimento
de cada um.
Na minha opinião, como defensor do princípio de que a saúde deve ser um direito constitucional de acesso gratuito a toda população, principalmente à mais carenciada, e sendo os Estados Unidos da América uma das maiores potências económicas mundiais, é urgente uma reformulação do panorama da saúde, protegendo todos os cidadãos e garantindo o seu acesso igualitário e digno a cuidados e serviços de saúde, prevenindo uma nova pandemia de surgir e se intensificar como, lamentavelmente, sucedeu com a Covid-19.
Francisco Silva Fernandes
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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