terça-feira, 26 de outubro de 2021

CULTURA, ECONOMIA E COVID-19

A cultura está inserida na sociedade portuguesa das mais diversas formas. Esta regula a nossa convivência e a nossa comunicação em sociedade e é entendida como os comportamentos, crenças, tradições, caraterísticas e conhecimento de um determinado grupo social. Desta forma, a cultura pode ser interpretada como o crescimento de uma identidade de grupo que é fomentada por padrões sociais que são próprios desse grupo.

Com o surgimento da pandemia covid-19, vários domínios da nossa sociedade foram afetados, sofrendo diversas consequências e repercussões. Eventos cancelados, atividades culturais interrompidas por tempo indeterminado, instituições culturais fechadas e cancelamento de concertos, exposições e peças de teatro foram o principal motor da disrupção da indústria da cultura.

Uma cultura não é estática, está em constante transformação uma vez que se adapta às situações vividas por determinado grupo. No contexto do covid-19, as restrições deveras limitantes que foram impostas implicaram uma resposta rápida por parte dos profissionais do setor cultural, na tentativa de reformular a oferta cultural e convertê-la para um regime virtual. Além disso, durante os meses de confinamento, todas as atividades de cariz cultural adaptadas à nova realidade mostraram-se um contributo bastante positivo para a nossa saúde mental. Durante este período, vários foram os artistas e profissionais que nos providenciaram o seu trabalho de forma gratuita, como nenhum outro setor da economia.

Os efeitos da crise resultantes da pandemia nas redes de distribuição e na queda do investimento neste setor afetaram a produção de serviços e bens culturais, bem como a sua diversidade. A médio prazo, os níveis reduzidos do turismo internacional e doméstico, a queda do poder de compra e as reduções do financiamento público e privado no que diz respeito às artes e cultura (particularmente ao nível local) ampliaram ainda mais esta tendência negativa.

Dada a evidente precariedade do setor, é, então, absolutamente fundamental que o setor cultural seja reconhecido como uma atividade económica que não deve ser posta de parte ou menosprezada relativamente a outras áreas e setores económicos. Apesar de a cultura ter só por si um valor imaterial, esta precisa de contar com “números” e apoios suficientes para ser exequível, uma vez que em Portugal corresponde a 3% do PIB e emprega cerca de 131 mil pessoas. 

Em 2022, a cultura poderá contar com mais 221 milhões de euros face ao ano de 2016. O Programa Orçamental da Cultura antevê uma despesa total de 644 milhões de euros suportada pelo Orçamento do Estado de 2022, valor este que, excluíndo a dotação da RTP, se concentra nos 390 milhões de euros, o qual revela um aumento de 17,6% relativamente à previsão de execução orçamental até ao fim deste ano.

 Contudo, a dotação para a cultura equivalará, no próximo ano, apenas a 0,25% do Orçamento do Estado, valor este que continua ainda distante da meta já há muito esperada e reinvidicada dos 1%.  Na verdade, este valor representa a terceira dotação mais baixa do Orçamento do Estado.

É um contrassenso que o Governo se refira à cultura como um ponto fulcral e estratégico para o contínuo desenvolvimento do país e lhe continue a destinar apenas 0,25% do Orçamento do Estado. Os 390 milhões de euros de despesa total do Ministério da Cultura previstos para o setor, em 2022, são claramente um montante insuficiente face a um setor que está há vários anos em crise e que se encontra agora francamente pior devido às consequências inerentes à situação pandémica.

Na minha opinião, é impossível vivermos sem a cultura, pois esta é a chave das relações interpessoais que estabelecemos e é o que permite definirmo-nos enquanto pessoas. Além disso, um mundo sem cultura é um mundo sem futuro, sem possibilidade de construção do pensamento e da racionalidade, e, por isso, urge a necessidade do Estado prestar mais atenção, crédito e relevância a um setor que tem vindo a ser brutalmente esquecido, principalmente durante a “era covid-19”.

A cultura tem, assim, um grande peso e papel no nosso dia-a-dia uma vez que contactamos com ela em quase tudo que fazemos e experienciamos. Deste modo, é importante que esta tenha os fundos e as medidas de providência por parte do Estado necessários para que se possa restabelecer no panorama mundial. Caso não haja um apoio público em resposta a esta situação, bem como estratégias de recuperação do setor, a redução do tamanho dos setores culturais e criativos terá impacto negativo nas cidades e regiões, quer em termos de empregos e receitas, níveis de inovação e bem-estar dos cidadãos, quer na qualidade de vida e na diversidade que carateriza as diferentes comunidades e indivíduos.

É importante realçar que se as atividades culturais estiverem projetadas nos mercados, estas representam um enorme fator de competitividade económica e social.


Guilherme António Rodrigues Augusto 

[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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