terça-feira, 18 de novembro de 2008

O fosso das desigualdades

O rendimento é, como sabemos, o “motor” da actividade económica de qualquer agente quer este seja colectivo, individual, público, ou privado. É tendo em conta o seu rendimento que qualquer agente toma as suas decisões: consome, poupa, investe, procura financiamento. É através do seu rendimento que os agentes regulam a sua forma de agir no mercado.
É ainda sabido que os rendimentos variam de agente para agente, consoante as suas capacidades e características, consoante o seu mérito e actividade que executa.
A diferenciação salarial é, por isso, um factor aceite pela sociedade uma vez que se traduz na forma de dar aos indivíduos a devida recompensa pelo mérito que têm ao exercerem determinada actividade. Contudo, será justificável uma disparidade de rendimentos tão elevada entre actividades?
Como é de conhecimento comum, Portugal faz parte daquele leque dos países da Europa onde se verificam grandes disparidades salariais entre “pobres” e “ricos”. Segundo um estudo recente da Organização Internacional do Trabalho constatou-se que Portugal, contrariando a tendência da União Europeia, tem vindo a piorar o fosso salarial.
Juntamente com Hungria e Polónia, Portugal foi dos países da Europa onde se verificou a existência de um maior fosso salarial entre os indivíduos que auferem de rendimentos mais elevados e os que possuem rendimentos baixos. Por outro lado, países como Bélgica, países nórdicos ou até mesmo a França e os nossos vizinhos Espanhóis encontram-se no bom caminho e convergem para um maior equilíbrio salarial.
Assim, em Portugal verifica-se um nível elevado de desigualdades entre indivíduos de classe alta e os de classe média-baixa, sendo que esta última engloba a grande maioria da população portuguesa. Deste modo, as dificuldades das famílias pertencentes à classe média-baixa são cada vez mais notórias. Com a taxa de inflação a aumentar e os seus salários “congelados” ou a sofrerem aumentos pouco relevantes, há já bastante tempo, é fácil perceber que estas famílias usufruem, cada vez mais, de um mesquinho poder de compra, acabando assim por não conseguir ajudar no crescimento económico do país através do consumo e/ou do investimento/poupança.
Como o fosso salarial aumentou, reflecte que as políticas que o Governo português vem adoptando para tentar combater este problema são completamente ineficazes. Como afirma o director do departamento da OIT, Raymond Torres “se não forem adoptadas medidas de reforma estruturais de longa duração a situação só ira piorar” e o país irá convergir para uma crise cada vez maior.
As políticas adoptadas pelo Governo não têm sido as melhores, e ter uma mão-de-obra tão barata não pode ser motivo de orgulho dos governantes portugueses perante os Estados-membros. Este factor não pode ser pensado como algo de benéfico, uma vez que se reflectirmos, isto só faz que se torne propensa a emigração.
Neste contexto, muitas das pessoas que se encontram no Governo tenderão a argumentar que a produtividade nacional e o nível de profissionalismo e instrução dos trabalhadores portugueses é mais baixo comparativamente com os restantes europeus, no entanto, estes mesmos portugueses no estrangeiro conseguem ser igualmente produtivos e auferem de salários muito superiores. Conseguem assim um bem-estar económico e um nível de vida muito superiores ao que conseguiriam na sua terra natal, o que só vem fomentar este movimento migratório.
Todavia, é relevante salientar que um certo nível de desigualdade é importante. É dessa forma que se fomenta o esforço, o talento e o trabalho individual, conseguindo assim promover o crescimento económico do país. Porém, se esta desigualdade for levada ao exagero, como é o caso, a situação é caótica e exige mudanças rápidas.
Por estes motivos a precariedade salarial tem de ser rapidamente resolvida, tomando medidas um pouco “radicais”, beneficiando a classe mais “pobre” em detrimento da classe mais “rica” para que o país consiga minimizar esta divergência e crescer economicamente.

António David Pereira Esteves
adp.esteves@sapo.pt
(artigo de opinião)

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