O fim dos chumbos no
ensino básico é uma possível medida do programa do Governo, de espetro social e
com (apenas e só) objetivo político e económico. Muito se tem discutido e muito
se tem escrito acerca deste tema: o governo diz que prevê “criar um plano de não retenção no ensino
básico”, mas levará isto a passagens administrativas? Os professores
protestaram esta medida e mostraram-se indignados, já a Confederação Nacional
de Associações de Pais (Confap) apoia a medida se esta não levar às passagens
administrativas, o que no fundo iguala a opinião de professores e pais, estando
a tónica, por parte dos docentes, no receio de que a pressão para que os alunos
transitem aumente.
Em 1970, um em cada
quatro portugueses não sabia ler. Desenvolveram-se medidas que levaram a uma
diminuição drástica da taxa de analfabetismo, contudo, em Portugal, continua a
existir quase meio milhão de pessoas analfabetas, o que nos dá um lugar no
pódio a nível europeu. Se as passagens administrativas se tornarem realidade,
então, estaremos a traçar um caminho contrário ao que se tinha vindo a traçar,
sobretudo desde 1974. Onde nos levará este caminho? A meu ver, ao abismo. Passo
a explicar.
Tem sido justificada a
medida pelos custos que acarreta a retenção de um aluno (cerca de 5 mil euros)
que, com o fim dos chumbos, levaria o Estado a amealhar 250 milhões de euros.
Contudo, não passa de mera ilusão. As passagens administrativas obrigarão a um
maior investimento no ensino e maiores gastos no desenvolvimento (ou tentativa
de desenvolvimento) nacional. Mais recursos no ensino justificar-se-ão pelo
facto dos alunos não poderem passar sem saber. Então, terá de existir uma série
de apoios para um acompanhamento mais atento das suas dificuldades e que
permita criar, em termos cognitivos, turmas mais ou menos homogéneas. E tal
significará mais gastos no desenvolvimento, pois terá de ser feito um esforço
acrescido para que Portugal acompanhe o ritmo de desenvolvimento do contexto
externo. Assim, não vejo onde esta medida trará benefícios a nível económico,
podendo somente facilitar o trabalho da classe política.
Esta situação faz-me
retroceder aos tempos em que em vez de cidadãos cultos e esclarecidos se
pretendiam criar súbditos que estivessem na espuma dos assuntos. Tudo isto me
faz pensar que os tão aclamados jovens de futuro são apenas tidos para
estatísticas e ideais de poupança, mas cabe-me dizer que já não estamos no
tempo pré-revolução, em que os cofres cheios e a taxa de analfabetismo altíssima
coexistiam. A contexto externa mudou, a sociedade mudou e estamos todos cientes
de que as pessoas e, sobretudo, a educação valem mais do que qualquer cofre
cheio. A educação é o investimento da vida.
A taxa de retenção no
nosso país tem vindo a diminuir, significativamente, no entanto, no 12º ano,
essa taxa continua a ser muito elevada, o que nos mantém distantes da média
europeia. Posto isto, numa ótica de progresso, não me parece haver razão alguma
para fazer transitar de ano quem menos sabe ou quem tem mais dificuldades. Cada
qual tem o seu ritmo de aprendizagem, as suas motivações e os seus estímulos e,
como tal, não devemos apressar o seu ritmo, forjar motivações nem estandardizar
estímulos. O foco não devia ser passar de ano para bem parecer a nível europeu,
mas sim perceber o que melhorar nos métodos de aprendizagem dos alunos e, em
vez dos tratar como uma massa igual, perceber as suas nuances e potencializá-las, dando-lhes oportunidades reais,
condizentes com a sua individualidade. Se a classe política, que tem nas suas
mãos o poder de tomar decisões, não se aperceber disto, estará a colocar
Portugal numa posição sensível, em que, para além de ter alunos com
conhecimentos coxos e pouco sedimentados, terá de fazer um esforço extra na
corrida para ser um país competitivo, uma vez que o seu capital humano será
menos qualificado ou pior preparado para corresponder às exigências do mercado.
Tem que perceber-se que o
percurso escolar de um jovem não é um sprint
de 100 metros, em que se impõe apenas a velocidade como fator determinante, mas
uma maratona com obstáculos, em que o salto, a velocidade e a resistência têm
de se conjugar.
Portugal precisa que se
continue a investir na formação dos portugueses, principalmente dos mais
jovens, porque mais do que serem o amanhã, eles são o hoje. E não é sobre
alicerces ocos que se constrói o futuro.
Rui
Pedro Lopes
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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