Em
1930, durante a Grande Depressão, o economista britânico John Keynes previa que
as 15 horas de trabalho semanal poderiam ser uma realidade nesta data. Ao longo
dos últimos quase 90 anos, a evolução é incontestável, apesar da previsão de
Keynes não se ter concretizado. E quando se olha para o futuro o enquadramento
pode não ser mais favorável. O atual modelo da economia e a precarização do
trabalho levaram os países a conceber novas de formas de organizar o tempo, que
influenciaram a produtividade e os salários.
Em
Portugal e no resto da Europa, este é um tema que tem estado presente em vários
debates. A relevância dada ao tempo de trabalho está intimamente ligada às
exigências do mercado laboral cada vez mais flexível. Essas exigências não
implicam, obrigatoriamente, um prolongamento do número de horas de trabalho,
mas sim um horário que se revele compatível com um crescimento empresarial
sustentável e progressivo. Por outras palavras, não vale a pena trabalhar muito
se não for sinónimo de qualidade.
Essa
falácia de que a quantidade é igual à qualidade tem de ser ultrapassada para que
seja possível alcançar a redução do tempo de trabalho. Os números são, aliás,
bastante elucidativos e reveladores. Não é por passarmos mais horas no local de
trabalho que a produtividade aumenta. É necessário haver uma maior orientação para
a eficiência e a eficácia e não para o “presentismo” e o absentismo. Analisando
a produtividade por hora de trabalho[i] nos 28 países da União
Europeia, Portugal ocupa somente 22º lugar. O facto de pertencer ao grupo de
países onde mais horas se trabalha não ajuda na melhoria da produtividade. Ademais,
com base num estudo da OCDE, que analisa 35 países, Portugal surge nos 15
países em que mais horas se trabalha. Outro estudo sugere que os portugueses
são dos que mais trabalho levam para casa, ou seja, para além de trabalharem
mais horas ainda têm o hábito de levar trabalho para casa.
Sendo
assim, é de salientar que a sobrecarga de trabalho tem constituído e constitui
um fator de risco no ambiente de trabalho, tanto pela parte em que afeta a capacidade
física como a mental, resultando, por vezes, em acidentes de trabalho, má
alimentação, hiperatividade e na falta de compromisso familiar.
Ao
invés da abordagem inicial estar relacionada com o número de horas de trabalho
(35 ou 40 horas semanais), deverá centrar-se numa maior conciliação de
interesses e participação ativa dos agentes económicos. Para se iniciar este
processo de mudança, pequenos passos podem ser dados, como diminuir o tempo de
almoço, os intervalos para café e fumar, e ocupar algumas horas de trabalho com
temas pessoais. Trata-se de pretender que os trabalhadores tenham melhores
níveis de desempenho numa ótica de racionalização do tempo, evitando ausências
e desperdícios injustificados.
É
neste sentido importante falar de um exemplo que serve de referência tanto para
Portugal como para maioria dos países Europeus. Uma empresa na Nova Zelândia realizou
uma experiência onde implementou um sistema de 4 dias de trabalho por semana, e
revelou que os seus empregados mantiveram a produtividade, reduziram níveis de stress, aumentaram níveis de satisfação
e alcançaram um maior equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Outro tipo
de abordagem foi utilizado na Suécia,[ii] sendo os resultados
igualmente positivos. No entanto, é preciso ter em consideração que estes
regimes não podem ser aplicados em todas as empresas e funções, mas é uma
tendência que se acentua.
Apesar
de tudo, permanece a questão: e, no futuro, a profecia do número de horas de
trabalho semanais de Keynes poderá cumprir-se? A resposta parece difícil. Conciliar
a diversidade de formas de trabalho com as exigências de um horário que permita
o descanso diário do trabalhador, o equilíbrio entre profissão e vida pessoal e
o aumento da produtividade é um desafio que está a mostrar-se difícil de
alcançar.
Eduardo Bessa
Referências
https://www.jornaldenegocios.pt/economia/emprego/detalhe/quantas-horas-se-trabalha-em-cada-pais-da-europa-veja-o-mapa
[i] https://www.pordata.pt/Europa/Produtividade+do+trabalho++por+hora+de+trabalho+(UE28+100)-1992
[ii] https://wwwk.dn.pt/sociedade/seis-horas-de-trabalho-por-dia-da-mais-saude-alegria-e-aumenta-a-producao-5690948.html
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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