sexta-feira, 30 de outubro de 2020

Chamam-lhes “a geração mais bem preparada de sempre”: então por que não estudam nem trabalham?

 

Em janeiro deste ano, segundo o primeiro ministro António Costa, “Nós hoje dizemos, com muito orgulho, que, finalmente, temos a geração mais bem preparada de sempre, mas há outra história que é preciso começarmos a contar, é que nós estamos a preparar a geração que ainda vai ser melhor preparada que a atual”.  

Deveras, em Portugal, ao longo dos últimos anos, tem-se verificado um crescente número de inscrições no ensino superior. Registando-se um aumento do número de inscritos de 4% no primeiro semestre do ano letivo 2019/2020 em comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo o relatório da Direção Geral de Estatísticas de Educação e Ciência. Contudo, apesar de Portugal apresentar taxas de inscrição no ensino superior acima da média da OCDE, apresenta também o dobro dos jovens entre os 18 e 24 anos que se encontram fora do mercado de trabalho e fora das instituições educacionais, e que procuram emprego há mais de um ano, ou seja, os chamados jovens “nem-nem”.

Surpreendentemente, apesar de estes dois fenómenos parecerem inconcordáveis, estes na verdade são uma realidade entre os jovens. Em termos gerais, 41% dos jovens com idades compreendidas entre os 19 e 20 anos estão matriculados numa universidade ou numa outra instituição educacional (sendo a média da OCDE de 37%) e cerca de 15,2% dos jovens entre os 18 e 24 anos enquadram-se na categoria de jovens “nem-nem” valores estes significativamente superiores à média de 14,3% da OCDE.

O aumento do desemprego jovem é um sinal claro da degradação sofrida pelo mercado de trabalho. Em regra, são os jovens trabalhadores os primeiros a ingressarem nas listas de despedimentos dadas as fragilidades dos seus vínculos laborais: contratos a prazo, recibos verdes, período experimental. De fato, em julho deste ano, cerca de 45 mil trabalhadores com idade inferior a 24 anos estavam inscritos nos centros de emprego, mais 58% do que no mesmo mês do ano passado.

O economista e ex-presidente do Instituto do emprego e formação profissional (IEFP), Francisco Madelino, prevê que vá ser difícil mudar este panorama uma vez que considera que não só as ofertas de trabalho por partes das empresas serão mais escassas dada a fragilidade das mesmas como também poderão ser menos os jovens que procuram emprego, quer seja por falta de expectativas ou devido à situação sanitária que está a bloquear os canais normais de divulgação de trabalho.

Relativamente à educação e formação dos jovens, o Education at a Glance, da OCDE, mostra que ter um curso do ensino superior ainda continua a ser vantajoso quer no acesso no mercado de trabalho que no chamado “prémio salarial”. Todavia, esta vantagem tem vindo a decrescer uma vez que uma licenciatura é cada vez mais desvalorizada hoje em dia. Juntam-se o fato de que apenas 30% dos estudantes portugueses são capazes de terminar a sua licenciatura nos 3 anos previstos e o desajustamento de muitos dos planos curriculares.

Assim sendo, não basta chamá-los “a geração mais bem preparada de sempre”, é igualmente necessário fornecer-lhes ferramentas para que lhes seja possível não só desenvolver as suas capacidades mas também opções para que estes sejam capazes de empregá-las.

Uma dessas possíveis ferramentas passa pela chamada Garantia Jovem, que procura aumentar as qualificações dos jovens, facilitar a transição para o mercado de trabalho e reduzir o desemprego jovem. Destina-se a indivíduos com menos de 30 anos, que não trabalham, nem se encontram a estudar ou a realizar qualquer tipo de formação ou estágio. Trata-se de um compromisso de 4 meses em que, gradualmente, o jovem é capaz de sair do sistema de ensino ou mercado de trabalho e é-lhe feita uma oferta de emprego, continuação dos estudos, de formação profissional ou de estágio.

Com esta iniciativa e implementação de mais do género, teremos sim todas as condições para chamar aos nossos jovens “a geração mais bem preparada de sempre” e estes serem de facto capazes de fazer jus ao seu nome.


Joana Mendonça Dias

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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