quinta-feira, 29 de outubro de 2020

O retornar da economia – essencial ou perigoso?

 

Como consequência da pandemia da Covid-19, muitas economias, incluindo a portuguesa, foram obrigadas a parar quase que por completo pela necessidade de manter os trabalhadores em casa, minimizando o contágio em estágios iniciais da propagação do vírus. Isto contribuiu para que o turismo caísse drasticamente, a restauração e hotelaria sofressem perdas e setores como cuidados de saúde, logística e retalho alimentar ficassem em perigo de colapso. A taxa de desemprego aumentou e existem estimativas de uma queda no PIB entre 8% a 10% em Portugal, segundo entidades como o FMI, OCDE e Banco de Portugal.

Acerca de cinco meses ocorreu a reabertura da economia, de forma faseada, permitindo que a maioria daqueles que ainda se encontravam empregados regressassem ao trabalho, numa tentativa de recuperar lucros e atrasos nas produções. No entanto, uma questão que preocupou grande parte da população foi a possibilidade de que o vírus se espalhasse incontrolavelmente assim que as pessoas voltassem a contactar umas com as outras. Isto agrava-se pela impossibilidade de a clausura acontecer de novo.

De facto, a abertura da economia é necessária, na medida em que são todos os setores que a constituem contribuem para as contas do país, o cotidiano das pessoas e a nossa manutenção a nível global. É mantendo o país a funcionar que podemos gerar receita, quer no sentido de produtos, quer no sentido monetário, e seguir com a educação nas escolas. No primeiro caso, estes permitirão que preservemos as nossas exportações, fonte de rendimento, mas também que supramos necessidades dos cidadãos, bem como fornecer materiais para diversas indústrias.

A nível monetário, não só os salários, subsídios de desemprego, pensões e similares deverão ser pagos para permitir a manutenção do poder de compra, que por sua vez vai ter um papel essencial na rotação dos produtos, mantendo um ciclo de funcionamento das atividades diárias que ajudam outros setores, como na área da recreação ou no próprio turismo interno, e, apesar do valor extremo da palavra, a sobrevivência das pessoas. Por outro lado, esta dimensão monetária tem de alcançar o Estado, para que seja possível financiar o país, como nos serviços de saúde, transportes ou educação, investimento em empresas – incluindo os apoios necessários à retoma da sua atividade, tecnologia e desenvolvimento, e, algo que também tem vindo a preocupar um grande número de economistas, reduzir a dívida e o défice de Portugal.

É uma constatação que o governo tem vindo a conseguir diminuir, a pouco e pouco, estes valores, mas será de esperar que aumentem novamente, bem como o PIB diminua talvez numa percentagem maior à determinada por este cenário relativamente otimista, com os efeitos da pandemia, não só a nível do fecho da economia, mas de gastos com os hospitais e cuidados sanitários, por exemplo. Assim, a reabertura contribui adicionalmente para que estes valores macroeconómicos não sofram uma alteração drástica que coloque em risco a sustentabilidade do país.

No reverso da moeda, temos a possibilidade do surgimento de um contágio incontrolável. Sabendo-se que a maioria das normas a serem tomadas para a contenção do vírus deverão ser praticadas e respeitadas pela população, através da responsabilidade própria e não apenas das regras impostas pelo governo, existe o receio de que estas não sejam cumpridas. Incluem-se aqui o uso de máscara, a desinfeção e lavagem das mãos, distanciamento social e a tentativa de evitar ajuntamentos, dentro das possibilidades de regresso à normalidade. Sabe-se também que poucas pessoas infringindo estas medidas são o suficiente para que o contágio acelere, prejudicando o esforço de outros, aumentando o número de internamentos, mortes, e em consequência dos gastos com saúde, com o possível fecho de estabelecimentos. Atingindo maiores proporções, em especial com a chegada da segunda vaga, o país pode atingir um estado de grande número de infetados, algo próximo do ingovernável, sem outra solução que não tentar, possivelmente, um novo confinamento, confinamento esse já provado não ser possível, causando a quebra da sustentabilidade económica a um nível de difícil recuperação.

Posto isto, apesar dos perigos que a reabertura acarreta para a sociedade, tendo em conta as previsões e perdas que o país enfrentaria se esta não acontecesse, considero que a manutenção do fecho seria mais prejudicial para todas as entidades envolvidas, indivíduos ou empresas, pelo que teremos de esperar uma atitude responsável por parte de todos para que esta decisão não se mostre custosa. No entanto, será possível confiar no comportamento das pessoas? As consequências deste comportamento não poderão vir a ser tão ou mais graves do que o lockdown?

 

Margarida Soares

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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