terça-feira, 27 de outubro de 2020

Em queda livre: o caso da TAP

 É posto em causa, muito frequentemente, nas redes sociais e na comunicação social, o trajeto e o desempenho da TAP, a companhia aérea portuguesa mais conhecida (sendo atualmente também a única companhia aérea nacional, aparte o caso da SATA, companhia aérea sedeada nos Açores), uma empresa que alcançou resultados positivos uma única vez na última década, tendo acumulado prejuízos de 822 milhões de euros de 2008 a 2018, e que em 2019 deixou a tendência repetir-se, perdendo-se mais 111 milhões de euros só no primeiro semestre. Mal saberiam os seus gestores, e o estado português, detentor agora de 72,5% da empresa, do que viria a acontecer em 2020. O choque assimétrico descomunal da pandemia de COVID-19 abalou as fundações do mercado global do turismo e dos transportes de uma forma completamente imprevisível.

Os paradigmas estabelecidos do negócio das companhias aéreas, e de realçar, de todo o setor dos serviços, foram alterados. Uma profunda adaptação está em progresso, e em questão está a continuidade da TAP. O ministro das infraestruturas e da habitação, Pedro Nuno Santos, mantém a convicção de que a TAP “é crítica para o desenvolvimento [económico] do país” e o governo afirma a sua pretensão à apresentação de um plano de reestruturação da empresa em Bruxelas até dezembro de 2020. Mas a questão é até que ponto é que isto pode ser afirmado como verdade. Como pode a TAP, uma empresa em falência há já anos, ser vital para o país? Especialmente num setor como o da aviação, onde as perspetivas de recuperação são das mais baixas para os próximos anos. A IATA (International Air Transport Association) prevê um regresso ao tráfego mundial do ano passado apenas em 2024, sempre num clima de incerteza, sendo que no início da pandemia houve uma redução do tráfego aéreo nos valores de 90%.

E é neste contexto, de completa incerteza, que a TAP reduziu a sua capacidade de transporte em 72% face a setembro de 2019, e no mesmo período reduziu o número de voos em quase 70%, e nos voos que realiza, tem uma taxa de ocupação média 20 pontos percentuais mais baixa do que era nos anos passados, nos 60%. A somar a estes números, está o despedimento de 1600 trabalhadores até ao fim do ano. A companhia aérea perdeu 582 milhões de euros desde o início de 2020, e questiona-se o seu futuro. O governo português certamente não o questiona: estão previstos mais 500 milhões de euros para o seu resgate no Orçamento de Estado de 2021.

Coloca-se em destaque certas questões, cujas respostas são muito fáceis de obter para uns, e muito difíceis para outros. Qual é o papel do Estado na manutenção das empresas em dificuldade num clima de crise sanitária? Quais são as empresas que merecem ou não a ajuda do Estado? Quem é que deve decidir isto por nós? Não deveremos deixar a mão invisível fazer o seu trabalho e “logo ver” o que fazer após a tempestade? Qual será o precedente estabelecido daqui para a frente?

 

André Maia

Fontes:

https://eco.sapo.pt/2020/09/23/continuamos-convictos-que-tap-e-critica-para-desenvolvimento-do-pais-diz-pedro-nuno-santos/

https://eco.sapo.pt/2019/11/27/de-prejuizo-em-prejuizo-tap-esta-ha-uma-decada-em-falencia-tecnica/

https://eco.sapo.pt/2020/10/02/e-oficial-david-neeleman-renuncia-aos-cargos-na-tap/

https://eco.sapo.pt/2020/10/12/tap-custa-12-mil-milhoes-este-ano-e-ainda-garante-aval-para-emprestimo-de-500-milhoes/

https://eco.sapo.pt/2020/10/22/retoma-esta-a-ser-muito-lenta-ceo-da-tap-antecipa-menor-procura-nos-proximos-meses/

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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