domingo, 25 de outubro de 2020

Consequências invisíveis da pandemia para os direitos humanos

 Em março de 2020 a doença viral COVID-19 foi classificada como pandemia mundial e com o confinamento veio um enorme impacte social e económico. Dez meses depois dos primeiros casos em Wuhan, China, as consequências para a produção nacional, receitas de turismo e desemprego são mais que evidentes. No entanto, existente muitos efeitos negativos que se mantém pouco reconhecidos, principalmente no que toca aos direitos humanos.

Logo no inicio do ano a China tentou encobrir informações, subestimando a sua gravidade, mas também prendeu pessoas e censurou debates e publicações online, pondo em causa o direito à liberdade de expressão. No Irão tem havido uma inconsistência nos números anunciados e na Tailândia jornalistas enfrentaram ações jurídicas por críticas ao governo.

Quando as notícias da doença começaram a dominar os telejornais, assistiu-se a xenofobia e discriminação contra pessoas de origem asiática. Muitos destes preconceitos ainda continuam, principalmente devido à persistência de Donald Trump em chamar-lhe “o vírus chinês” e culpar a China pela resposta desastrosa da sua administração ao vírus.

A ONU publicou um relatório sobre o impacte para a igualdade de género: o aumento de responsabilidades de cuidar das crianças devido encerramento das escolas e das necessidades dos idosos caíram nas mulheres, que tiveram de suportar mais trabalho de assistência não remunerado. Ainda mais preocupante: número de casos de violência doméstica durante o confinamento aumentou até 60% na Europa. “Muitas dessas mulheres estão agora presas em casa com os seus agressores, lutando para aceder a serviços que estão a ter cortes e restrições”, afirmou António Guterres.

A falta de água e saneamento criou problemas adicionais em muitas populações, apesar de ser um direito humano e considerado essencial para proteger a saúde durante este surto. O acesso à educação também foi posto em causa para milhares de crianças. Primeiro, a transição para aulas online significa que os alunos sem internet ficaram sem acesso às aulas. Em segundo lugar, tal pode aumentar as taxas de abandono escolar. Por fim, isso deixa filhos de famílias com baixo rendimento sem refeições fornecidas na escola, das quais sempre dependeram.

Os problemas da saúde não se limitaram aos infetados com Covid-19. Os profissionais de saúde (escassos em muitas regiões) foram os mais expostos, muitas vezes sem meios de proteção adequados. Assistiu-se a hospitais a entrarem em colapso total, sem acesso a água e eletricidade.

O desemprego causado diretamente pela pandemia afeta, sobretudo, pessoas que já tinham renumerações baixas. Sem os seus salários, muitas destas ficaram sem conseguir pagar a sua renda, e poderão ser despejadas (em estimativa, 40 milhões de americanos estão nesta situação). Existe um receio que esta situação leve a um aumento exponencial as taxas de sem-abrigos e pobreza extrema.

Imagem: World Economic Forum

 



Os refugiados foram uma das principais vítimas. Representando cerca de 1% da população mundial, as barreiras ao seu acesso aos seus direitos humanos aumentaram. Os que vivem em campos estão privados de sistemas básicos de saúde, saneamento, ou algum tipo de distanciamento social, que já referirmos ser fundamental ao combate da doença. Nos países de acolhimento, foram também muito afetados pelo desemprego, ou noutros casos, suspenderam os pedidos de asilo (se não foram mesmo impedidos que entrassem nas suas fronteiras). Por fim, também sofrem de discriminação no acesso a testes e as taxas de abandono escolar estão em risco de aumentar ainda mais.

A Covid-19 expôs muitos dos problemas estruturais, principalmente na discriminação no acesso à saúde das populações marginalizadas, como a comunidade LGBT+ e pessoas de cor.

Por fim, aumentou as desigualdades sociais do mundo: enquanto os bilionários ganharam 637 biliões de dólares durante esta crise, o número estimado de pessoas em pobreza extrema é 150 milhões, em 2021, o primeiro aumento registado pelo Banco Mundial em mais de 20 anos.

 

Inês Filipa José

 

Bibliografia:

https://www.hrw.org/pt/news/2020/03/23/339654

https://www.weforum.org/agenda/archive/human-rights/

https://www.dn.pt/opiniao/opiniao-dn/convidados/os-direitos-humanos-invisiveis-nos-tempos-de-covid--19-12086387.html

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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