Durante muito tempo as questões de
pobreza e desigualdade na distribuição dos rendimentos foram ignoradas pelas
principais instituições financeiras internacionais, como o FMI, e pela
macroeconomia, porém, atualmente essas mesmas questões têm assumido uma
importância crescente e a redução e erradicação da pobreza tornou-se uma das
temáticas centrais da economia do desenvolvimento. Como tal, a atribuição do
Nobel da Economia a Abhijit Banerjee, Esther Duflo e Michael Kremer vem-nos
fazer refletir não só sobre como a metodologia experimental é um fator
importante mas, sobretudo, como a ciência económica se encontra ao serviço da
população e do seu bem-estar social e económico. O combate à pobreza mundial é uma
prioridade, que não deve nem pode ser “deixada na gaveta” das agendas europeia
e nacional.
É
um dado que o maior obstáculo à erradicação da pobreza é a existência de
desigualdades ao nível de rendimentos, fundamentalmente motivadas pelas
desigualdades dentro dos países e entre países. Se, por um lado, assistimos à
diminuição da desigualdade na distribuição dos rendimentos no sul e leste
asiáticos, em grande parte devido ao seu crescimento económico, por outro,
continuamos a verificar que tanto na Ásia Ocidental, na América Latina como na
África as desigualdades se acentuam e os níveis de rendimento diminuem
continuamente.
Poucas
dúvidas restam de que o aumento da taxa de crescimento económico é fundamental
para a redução da pobreza - a importância do aumento no PIB per capita é tanto maior quanto menor
for o nível médio de rendimento inicial. Aliado a este fator, está a importância
do crescimento inclusivo, ou seja, um crescimento que abranja todos os
indivíduos, sendo capaz de diminuir as desigualdades na distribuição de
rendimento dos países e, internamente, capaz de atenuar a exclusão e
fragmentação social, devida em grande parte a uma governação medíocre e
conflitos internos.
Em
África, a população cresce, anualmente, a uma taxa superior a 2%, o que implica
que a redução, até 2030, dos níveis de pobreza extrema para menos de 5%
obrigará a declínios extremos nas desigualdades e a uma combinação com o
crescimento de 2 dígitos do PIB, um cenário nunca antes ocorrido.
Numa
perspetiva mundial, estimativas da ONU constatam que mais de 7% da população
continuará em situação de pobreza até 2030, caso não ocorram transformações
para diminuir, significativamente, as diferenças de rendimento entre e dentro
dos países. O crescimento do PIB, por si só, não é um fator suficiente para
promover melhorias significativas nos padrões de vida sociais. É fundamental,
reconhecer que a multidimensionalidade da problemática da pobreza exige o
desenvolvimento de um conjunto de medidas capazes de extrapolar a dimensão
económica da questão, caso contrário tendências como as que se observam vão
continuar a ser um entrave.
Desta forma, o
investimento público em educação de qualidade e na ampliação do seu acesso,
aliado a políticas de emprego, como o aumento do salário mínimo e a construção de
uma proteção social adequada, e o investimento em serviços de saúde afiguram-se
essenciais. Essenciais são, igualmente, apostas na resiliência às alterações
climáticas e na inclusão digital e financeira, impulsionando a criação de
empregos a curto prazo e crescimento económico, em transportes, energia e
agricultura, priorizando o desenvolvimento de infraestruturas rurais que promovem
a redução das desigualdades internas ao país e em sistemas fiscais progressivos
aliados à política distributiva - que se assume como um fator de extrema
relevância.
Em
Portugal, apesar da redução na taxa de risco de pobreza (17,3%), 2 em cada 10 pessoas
são pobres e, na ausência de apoios públicos a situação piora
significativamente, isto é, 4 em cada 10 estariam em situação de pobreza.
O caminho a percorrer ainda é longo, mas tem-se construído.
Do ponto de vista
económico, o aumento do salário mínimo conseguiu tirar trabalhadores da pobreza
e reproduzir um efeito positivo nas contas públicas, assegurando a
sustentabilidade necessária para reforçar os apoios sociais no combate à
pobreza. Qual o próximo passo? Os números falam por si: cerca de 330 mil
crianças estão em risco de pobreza, o grupo etário entre os 0 e 18 anos é o
mais afetado. Assume-se assim, a forte necessidade de, num país com taxas de
natalidade baixas, serem criadas oportunidades não só para os jovens crescerem
saudáveis e nutridos como terem acesso a uma escola pública e um ensino
superior capazes de se tornarem uma porta de saída da pobreza.
Consequentemente, os jovens tornam-se aptos para contribuir ativamente e
acrescentar valor na economia, criando impacto no crescimento económico. E,
para além disso, há a quebra de um ciclo de pobreza que se perpetua por
gerações.
Mas,
não ficamos por aqui, a pobreza energética é outras das nossas realidades. Se a
nossa eletricidade não fosse uma das mais caras da Europa, o cenário talvez fosse
diferente, mas para que assim seja são necessárias medidas políticas de redução
do IVA da eletricidade e a redução das rendas exuberantes praticadas pelas
companhias de eletricidade. Não podemos esquecer, igualmente, o ambiente de tensão
que paira sobre os valores de arrendamento, em que uma grande parte do
rendimento vai para as despesas com a habitação, e sobre os valores da pobreza
de género, que afeta mais as mulheres, impondo a necessidade de medidas específicas
de género nos objetivos de combate à pobreza e exclusão social.
Em
suma, considero que combater a pobreza e lutar por um mundo mais inclusivo,
igualitário e sustentável a longo-prazo são prioridades que exigem determinação
e responsabilidade coletiva. E existem, neste momento, dois elementos chave neste
desafio: a identificação das áreas onde as pessoas pobres vivem, para que as
políticas sejam direcionadas mais eficientemente; e uma “libertação” do
investimento público, para que este combate comece a tomar, realmente, proporções
significativas.
Andreia
Amorim
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade
curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º
ciclo) da EEG/UMinho]
Sem comentários:
Enviar um comentário