quinta-feira, 29 de outubro de 2020

A (in)sustentabilidade do aumento do Salário Mínimo Nacional

 

A expressão “Salário Mínimo Nacional” parece criar controvérsia entre alguns políticos e economistas. Uma fração parece concordar com a sua implementação, enquanto outra... nem tanto! A discórdia surge associada ao argumento de que a fixação de um salário mínimo distorce o equilíbrio de mercado, sendo, assim, economicamente indesejável. Mas, a questão que coloco é a seguinte: a distorção do mercado, neste caso de trabalho, não é já visível na posição dominante do empregador face ao empregado?

É fulcral entender o conceito de Salário Mínimo Nacional, que se traduz, portanto, na remuneração mínima legal atribuída aos trabalhadores pelos esforços e tempo aplicados na produção de bens ou serviços prestados.

No meu entender, sem este valor mínimo imposto pelo Estado muitos trabalhadores estariam a receber salários abaixo do desejável. Após escrever esta última frase levantou-se imediatamente outra questão: Mas o que é na verdade desejável? Desejável é ter rendimento suficiente para viver condignamente na sociedade em que estamos inseridos e, claramente (na minha opinião), que os 635€ atuais não o permitem (quanto mais salários inferiores).

Está então em cima da mesa, mais uma vez, o aumento do salário mínimo nacional. Por um lado, assegurar o rendimento mínimo, cada vez mais elevado, às pessoas permite incentivar a procura e o investimento, fundamentais para estimular a oferta das empresas, a economia como um todo e, mais importante, melhorar a qualidade de vida destas. Por outro lado, o aumento dos custos com os recursos humanos pode ser insustentável para as pequenas e médias empresas se não for acompanhado por um aumento de produtividade.

Uma tentativa de colmatar o aumento dos gastos, devido ao aumento do Salário Mínimo Nacional, seria aumentar os preços em resposta à mão-de-obra mais dispendiosa. Numa situação em que as nossas empresas estão expostas à forte concorrência estrangeira, o aumento dos preços não seria sustentável porque iriam perder competitividade. Nesse caso, o encargo da despesa gerada pelo aumento do salário mínimo seria totalmente espelhado numa diminuição do lucro da empresa. É ainda de referir que, se nos depararmos com o aumento do preço do bem, o aumento do poder de compra associado ao aumento do salário pode não se verificar em termos reais.

A verdade é que podemos partir de um círculo vicioso, podendo ser quebrado, tornando-se num círculo virtuoso, desde que se garanta a melhoria da produtividade. Isto é, havendo um aumento de produtividade, consegue-se fundo de maneio para aumentar o salário mínimo, que, por sua vez, estimula a procura, gerando mais produção do lado das empresas e o crescimento da economia como um todo. Mas até que ponto o aumento da produtividade conseguirá acompanhar o aumento do salário mínimo nas condições de incerteza sanitária que vivemos?

Perante este enquadramento, temos ainda de considerar a situação pandémica que o mundo enfrenta assim como o forte ciclo de recessão económica adjacente. Numa situação de normalidade, o aumento do Salário Mínimo Nacional provavelmente não iria ser alvo de muita discussão, já que a maior parte das negociações já se teriam realizado em 2019. Com a conjuntura económica virada de pernas para o ar, a situação não é tão linear. Provavelmente, esperar que a economia estabilizasse seria a melhor solução, mas, no entretanto, quem (sobre)vive com o atual Salário Mínimo Nacional iria enfrentar ainda mais adversidades.

Considero que o (justo) aumento do Salário Mínimo Nacional é crucial, mas não podemos condenar a economia com medidas precipitadas. Este tema deve ser abordado com toda a sensibilidade que lhe está associada. É importante centrar a atenção no aumento da produtividade para permitir a sustentabilidade da evolução positiva dos salários e, assim, combater a desigualdade e pobreza de quem trabalha e, consequentemente, dinamizar a economia.

Por fim, não podemos desviar-nos do argumento central para o aumento do salário mínimo, que considero ser o mais importante, isto é, a melhoria de qualidade de vida da população e a valorização do trabalho prestado.

 

Ana Carolina Ribeiro Abreu

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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