quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Fundos de In(Coesão)

Os fundos de coesão da União Europeia são sempre motivo de debate na sociedade portuguesa. Estes fundos são atribuídos pela EU com o objetivo de aproximar o nível de desenvolvimento dos vários estados membros. O Fundo de Coesão destina-se aos Estados-Membros cujo Rendimento Nacional Bruto (RNB) por habitante seja inferior a 90 % da média da EU e distribuirá entre 2021-2027 cerca de 373 mil milhões de euros. Portugal apresenta um RNB inferior a 82%, portanto tem direito a receber fundos de coesão.
Em Portugal, o assunto foi muito badalado pois em março deste ano foi anunciado um corte de cerca de 1,6 mil milhões de euros nos fundos referentes ao período 2021-2027, recebendo a quantia de 23,8 mil milhões de euros. Isto motivou críticas ao governo por não defender os interesses da nação, o que é enfatizado pelo facto de 7 estados membros irem ver subidas as verbas de coesão. Sendo Portugal um país tão distante de países com a Alemanha/França/Luxemburgo, não se percebe como num momento destes os fundos atribuídos a Portugal são cortados. Já o primeiro-ministro afirma que, a preços correntes, há um aumento de 8%. 
Qualquer que seja a verdade dos factos (se há um aumento ou uma diminuição nos fundos), há um problema na atribuição dos fundos cá em Portugal. Dá a sensação que estes fundos têm um objetivo concreta quando saem da União Europeia e quando chegam a Portugal servem para acentuar mais as diferenças entre as regiões. Um exemplo muito concreto é o facto de ter sido aprovado um projeto de 210,2 milhões para a execução de duas novas estações de metro em Lisboa e ter sido chumbado o projeto da ligação Aveiro-Mangualde, que custaria cerca de 600 milhões mas serviria para ligar a linha da beira-alta à linha do Norte, uma obra que iria com certeza ajudar a desenvolver a região do interior.
Continuando na ferrovia, o governo aprovou um conjunto de 20 projetos, em 2016, para serem finalizados em 2020, de cerca de 2 mil milhões (para além dos 600 milhões já falados atrás) e, destes 2 MM, apenas existe uma taxa de execução de 7% (158 milhões), sendo que nenhum projeto está acabado quando em fevereiro de 2019 já eram para estar 8 finalizados. Este projeto apresentava obras de modernização da linha da Beira Alta, Beira Baixa e Linha do Minho e, como é óbvio, a obra que está mais avançada é a da Linha do Minho (entre Nine-Valença) que, por acaso, está numa área do litoral.
Mais uma vez, o interior é preterido! Outro exemplo clássico é as obras de requalificação do IP3. Este problema vai para além de cores políticas pois já houve governos de todas as cores e nada foi feito. O IP3 é a única ligação direta entre as 2 maiores cidades do interior (Viseu-Coimbra). Vejamos o seguinte: existem 12(!) autoestradas urbanas de ligação a Lisboa (tiramos daqui a A1 que é uma autoestrada principal) e 6, de ligação ao Porto, mas não há uma autoestrada entre Viseu-Coimbra, por falta de fundos… Uma estrada onde morreram 24 pessoas em 9 anos devido ao estado precário do trajeto que milhares de pessoas efetuam todos os dias.
Resumindo muito concretamente, há um claro desvio de fundos para o litoral. Fala-se em projetos para todo o país, mas parece que só se concretizam os do litoral. Isto só prejudica Portugal na medida que um país desequilibrado nunca vai ser um país com um crescimento económico sustentável. Cidades como Lisboa e Porto não podem crescer muito mais do que o que crescem. Daí os fundos de coesão deverem ser canalizados para regiões do interior, muitas delas com grande potencial de crescimento (Alentejo, por exemplo). No meu entender, tem de haver um maior controlo sobre a atribuição destes fundos. Porque não a União Europeia enviar uma equipa especializada para avaliar projetos e atribuir os fundos? Tem de haver uma independência maior neste assunto, independência essa só garantida por autoridades competentes que não se movam por interesses. Não podem vir os fundos de coesão da UE com a função clara de aproximar o desenvolvimento entre regiões e estes chegarem a Portugal e funcionarem da maneira exatamente oposta.

José Pedro Antunes

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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