quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Serão os portugueses desgovernados?

Poupar é a palavra de ordem de muitas famílias, mas nem todas têm a capacidade ou agilidade financeira para o fazer.
Ao longo dos anos, a taxa de poupança dos portugueses tem diminuído. Em 1995, as pessoas poupavam 14,8% daquilo que ganhavam e, em 2018, este valor é de apenas, aproximadamente, 6,9%. Situando Portugal na conjuntura europeia, somos o 18º país que poupa mais, sendo que à nossa frente encontram-se países como o Reino Unido, Luxemburgo, Alemanha, Países Baixos, entre outros. Contudo, existem países que poupam ainda menos que Portugal, tal como a Lituânia, a Grécia, a Roménia. Os romenos são aqueles que menos poupam dentro da União Europeia, chegando a apresentar taxas negativas na casa dos 9%.
Em 2017, a taxa de poupança das famílias portuguesas foi de 4,7% do rendimento disponível, a mais baixa desde 1995. O Banco de Portugal aponta alguns fatores que poderão justificar os baixos níveis de poupança, como a redução da desigualdade na distribuição do rendimento, o acesso mais fácil ao crédito e o aumento do consumo.
Apesar do rendimento das famílias ter aumentado, as pessoas acabam por não poupar tanto dado que preferem usar o dinheiro na aquisição de bens e serviços. O consumo das famílias aumentou bastante nos últimos 23 anos, com apenas uma ligeira redução verificada em 2009, por causa da crise, mas em alguns anos já foi possível voltar aos valores de consumo vivenciados antes da crise financeira.




O consumo tem aumentado, isso é um facto, mas creio que seja importante perceber em que tipo de categorias se deu esse aumento. O gráfico apresentado permite analisar esta questão. A categoria “Alimentação, bebidas e tabaco” aumentou de 3.889,5€ em 1995 para 6.477,3€ em 2017, ou seja, as pessoas conseguiram aumentar o consumo nesta categoria em 66,5%. Para além disso, uma categoria que pode contribuir para analisar se o bem-estar dos portugueses aumentou é “Hotéis e restaurantes”. Esta categoria sofreu uma variação de 126% entre 1995 e 2017, sendo que o valor verificado em 2017 foi de 4.228,1€, comprovando que o estilo de vida dos portugueses melhorou dado que conseguem dispensar mais dinheiro para lazer e bens de luxo.
O European Payment Consumer Report 2018 relata que nos últimos anos a percentagem de europeus que acha que é aceitável comprar bens como televisões e computadores fazendo um crédito ou com dinheiro emprestado tem aumentado. Os europeus parecem não se importar em viver acima das suas possibilidades, porque 16% da população considera aceitável realizar um crédito ou usar dinheiro emprestado para fazer uma viagem, sendo que esta percentagem tem vindo a aumentar nos últimos anos.
Ainda no European Payment Consumer Report, em relação a Portugal, à pergunta “Porque é que não pagaram as contas a tempo?”, 38% dos inquiridos responderam que não tinham dinheiro para o fazer, sendo de realçar que este valor diminuiu face ao ano anterior. Contudo, facilita a perceção do porquê dos portugueses não pouparem, dado que parecem gastar mais dinheiro do que o que recebem.
         Os dados apresentados parecem reforçar um dos pontos mencionados pelo Banco Portugal como justificação para a redução da taxa de poupança, o fácil acesso ao crédito tem permitido a muitos portugueses, os mesmos que responderam que sim às questões anteriores, viver acima das suas possibilidades, realizando créditos e gastando o dinheiro que não é seu.
Os portugueses não parecem estar muito preocupados com a poupança ou com futuro. Estão mais interessados em aproveitar o presente e em consumir hoje. Um estilo de vida melhor e o consumo de bens de lazer tem sido prioridade na vida dos lusitanos, vivendo, se necessário, de créditos bancários. Esta foi a mentalidade que se instalou em Portugal: viver com mais do que o que se tem. Resta, por fim, perceber se isto veio para ficar e até quando vai ser sustentável.

Rita Mesquita

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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