A economia portuguesa conheceu na década de 2000/2010 um período de forte endividamento, aqui medido pela PII, que em 2000 representava (-39.5%) do PIB e em 2010 representava (-107%) do PIB. (Fonte: Série longa da BP)
O PII-Posição de Investimento Internacional, mede a diferença entre os activos e os passivos detidos pelos agentes económicos de um determinado país. Quer isto dizer que os agentes económicos portugueses - públicos e privados - deviam, no ano de 2010, ao estrangeiro um pouco mais do que riqueza produzida pelo país durante um ano ou, sendo mais cruel, teríamos que trabalhar um ano e mais uns meses para pagar a dívida, não fazendo qualquer despesa!
Por outro lado, podemos concluir que a economia portuguesa teve capacidade de atracção de capitais ou poupanças externas, que no total da década representaram 67,5% do PIB (107-39.5), em valores acumulados.
Se o endividamento cresceu, a poupança teve um comportamento medíocre quando comparada com a década anterior ou mesmo com a média da EU. No entanto, em termos acumulados, a poupança financiou a economia em 72.9% do PIB [contas nacionais anuais (base2011)] durante a década.
Por outro lado, as transferências líquidas da UE representaram na década valores acumulados de 16.4% do PIB [contas nacionais anuais (base2011)].
O aporte destas verbas à economia portuguesa, pela sua natureza, devia contribuir para um aumento do Investimento Total na economia e, consequentemente, na Formação Bruta de Capital Fixo, contribuindo assim para um fortalecimento do factor Capital, levando a um crescimento da intensidade capitalista da economia e consequentemente a um crescimento mais saudável, mais intenso e sustentável, apoiado num aumento da produtividade dos factores. No entanto tal não aconteceu. O PIB cresceu em média 1% (contas nacionais anuais (base2011) na década em apreço, divergindo da média europeia.
O Investimento Total (público e privado) decresceu, passando de 31,6% PIB,em 2000, para 22,3 do PIB (Contas Nacionais base 2006) em 2010.
A Formação Bruta de capital Fixo foi, em 2000, 28% PIB e, em 2010, desceu para 20,5% do PIB [contas nacionais anuais (base 2011)], significando isso que não houve reposição do Capital depreciado, nem acumulação de novo Capital.
Se num contexto de investimento seria já preocupante o perfil de financiamento, em que a geração de recursos próprios (as poupanças) é baixa, e os recursos alheios são “instáveis”, como o endividamento, em que dependemos dos credores (embora as taxas de juro sejam baixas) ou as transferências da UE, que um dia destes irão acabar ou reduzir-se, mais preocupante, diria mesmo assustador, é esta transferência de rendimentos inter-geracional, em que o consumo presente se sobrepõe ao investimento e em que a riqueza produzida não suporta o crescimento desse mesmo consumo.
Este “gastar por conta” vai com certeza colocar grandes problemas às gerações futuras (próximas e distantes), que herdam endividamento não reprodutivo que não usufruíram e um país que não é capaz de criar riqueza.
Chegados a este ponto, resulta evidente que o país e a economia dispuseram de recursos (se tinham o perfil ideal ou se eram suficientes é outra questão). Não soubemos foi tomar as melhores opções, nem sequer definir aquilo que queríamos para o nosso futuro colectivo.
Perdemo-nos em teorias mais ou menos importantes mas que têm em si própria controvérsia suficiente para nos ocupar, sem que daí resulte verdadeiramente uma ideia definitiva do que queremos. Foi a entrada na moeda única a culpada da situação? Foi o modelo de crescimento anterior a adesão ao Euro? O investimento nas não-transacionáveis em prejuízo da produção de transacionáveis nesta década 2000/2010?
Também as soluções apontadas têm algum dom de controvérsia. Devíamos abandonar a moeda única de modo a poder dispor de um instrumento cambial na condução da política económica? Mas não foi isso que nos trouxe até aqui , ou seja, abandonarmos uma moeda forte e substituí-la por uma moeda fraca , sujeita a desvalorizações, focando a nossa competitividade do lado do preço e não pelo lado do valor acrescentado, da qualidade dos produtos e da produtividade dos factores, potenciador da criação de riqueza?
Outra das soluções apontadas é não pagar a dívida, pela impossibilidade do seu pagamento e pela asfixia que o serviço da dívida provoca na economia. Mas uma economia que não cresce, não cria riqueza, não gera excedentes, como vai financiar o seu funcionamento e, mais importante, o seu investimento?
Em minha opinião, temos que repensar o modelo económico do país, já que as teorias e os modelos económicos (Anglo-Saxónicos e Norte Americanos) têm em conta realidades diferentes de países como o nosso. O aumento do rendimento disponível das famílias para fomentar o consumo, numa economia com uma indústria de bens transacionáveis pobre, sem capital, com baixo desenvolvimento tecnológico e capacidade de inovação leva ao desequilíbrio externo, com mais endividamento e consequente transferência de riqueza para países já ricos, aumentando a desigualdade relativa.
José Avelino Rodrigues Magalhães
Fontes:
BANCO DE PORTUGAL-SERIE LONGA-PII.
PORDATA (TODOS OS OUTROS DADOS)
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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