segunda-feira, 5 de novembro de 2018

O populismo casa com fascismo ou com radicalismo?

Com Jair Bolsonaro, Trump e o novo partido de André Ventura, surgiram-me as questões: o que é o populismo? É a mesma coisa que fascismo? Ou são só radicalistas sem noção?
Começo, então, por tentar definir populismo. No livro “The Global Rise of Populism”, Benjamin Moffitt conclui que não faz sentido associar este termo a uma única definição. Podemos associar o populismo a uma frustração decorrente do declínio de um status ou uma simples nostalgia dos tempos de nacionalismo. Outros olham para o populismo como uma forma de apelar às massas, com discursos que roçam o anarquismo.
Cas Muddle, professor de ciência política na Universidade da Georgia, vê o populismo como uma thin ideology, pois não escolhe lados. Tanto pode ser da esquerda como da direita, ou criar, por vezes, um híbrido ao centro.

Já Jan-Werner Müller, da Universidade de Princeton, afirma que os populistas querem passar para os cidadãos a ideia de que estão completamente solidários com os mesmos e que, tal como os cidadãos, também eles estão fartos das elites corruptas. Para o professor, há duas distinções importantes dentro do populismo: exclusivo e inclusivo. O exclusivo é mais comum na Europa e foca-se na estigmatização de certos grupos, como, por exemplo, os refugiados. O inclusivo acha que a política deve ser, como a própria palavra o diz, inclusiva e aberta a grupos mais estigmatizados, sendo comum em países da América Latina.

O populismo tende a atacar o sistema judicial e os jornalistas dizendo que os mesmos não estão do lado dos cidadãos. Um exemplo desta situação são os constantes ataques do presidente Trump à CNN, dizendo que tudo o que a mesma reporta são fake news, e, recentemente, a atitude de chacota para com o jornalista atacado por Greg Gianforte, na altura candidato a congressista no estado do Montana, com uma placagem, quando o mesmo apenas lhe colocava uma questão.
O uso de slogans que incitam ao nacionalismo também é um trade mark. Alguns exemplos são a Front Nationale, com “Este é o nosso país”, o partido Alemão contra a Islamização na Europa Ocidental (PEGIDA), com “Ganhar outra vez controlo”, ou então o famoso “Make America Great Again”.
Mas é correto associar fascismo a populismo? O que é o fascismo? Madeline Albright, escritora e ex-secretária de estado nos Estados Unidos, numa entrevista ao The Economist, afirma não haver consensos na definição do termo, razão pela qual muitas vezes o mesmo é usado de forma aleatória. Porém, a mesma afirma que o fascismo não é uma ideologia de esquerda, direita ou centro, mas sim uma abordagem usada para tomar controlo, ou consolidar poder por um indivíduo ou partido que proclama estar a atuar em nome de uma nação ou grupo.
Através do uso de violência e outros meios, o proclamado fascista usa de tudo para atingir os fins, sendo profundamente antidemocrático, apesar de obter o seu poder através de um processo democrático (por exemplo, Hitler, ou mesmo Salazar). A Sr.ª Albright, à exceção da Coreia do Norte, não considera que hoje em dia exista algum país com governantes fascistas. Contudo, discordo da Sr.ª Madeline Albright neste aspeto. O estado atual da Rússia e da Arábia Saudita são exemplos de democracias “disfarçadas”, uma vez que não existe liberdade de expressão, visto ser do conhecimento geral que quem tem uma opinião diferente do regime sofre retaliação.
Existem, contudo, pontos que partilho com a Sr.ª Madeline Albright. Atualmente, defrontamo-nos com ideais e condições sociais (disparidades económicas, uma queda na confiança em partidos políticos mainstream, difamação de minorias e um esforço constante para distorcer a verdade com os alternative facts) muito semelhantes aos que levaram à eleição de Hitler e Mussolini.
Podemos associar o radicalismo ao populismo? Sim. Geert Wilders, político Dinamarquês, ao pretender eliminar leis contradiscursos de ódio, e Rodrigo Duterte, ao declarar guerra às drogas, deu permissão à polícia para executar suspeitos de tráfico. Ninguém gosta da circulação de droga, muito menos de traficantes, porém, será matar aleatoriamente sem julgamento a melhor abordagem quando 3967 supostas personalidades da droga morreram e outras 16355 (só entre o curto espaço de 1 de julho a 30 de setembro de 2017) estão classificados como “em investigação”?
Apesar de Portugal ser um país de brandos costumes, começam a surgir grupos que defendem os ideais do Estado Novo, da glorificação de Salazar e do nacionalismo renovador. Já André Ventura, com o “Chega”, veio trazer as mesmas ideias do século passado, como o fim do casamento homossexual e até mesmo a proibição constitucional da eutanásia (só faltava o fim do aborto...). Tenho alguma dificuldade em perceber estes ideais, uma vez que os mesmos vão interferir com a liberdade de escolha de cada indivíduo.
Só passaram 73 anos desde o fim da 2ª Guerra Mundial e apenas 44 desde o fim do Estado Novo, ambos, períodos carregados de ódio e medo. Porque é que decorridos todos estes anos queremos repetir os mesmos erros do passado?
Os populistas não precisam de ganhar eleições para fazer valer as suas ideias e espalhar o seu estilo de política. Conseguem infestar os partidos políticos à volta deles como parasitas e, como sabemos, eventualmente, o parasita consome o hospedeiro.


Mariana Alves

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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