A crise financeira que surgiu nos Estados Unidos entre 2007 e 2008 foi tremendamente contagiosa, espalhando-se por toda a Europa, prejudicando a sua economia e trazendo à tona os problemas estruturais de alguns países, como foi o caso da Grécia, da Irlanda e de Portugal. O seu forte impacto negativo reflectiu-se no estilo de vida de muitos portugueses, com o decréscimo do seu poder de compra, da sua qualidade de vida e com o aumento do desemprego. Passado o período de grave depressão, começou-se a registar a retoma de muitas economias europeias. Porém, os problemas estruturais portugueses não permitiram que Portugal acompanhasse esta tendência ascendente. A economia portuguesa, em 2011, entrou em recessão, com dois trimestres consecutivos a apresentar registos negativos da variação do PIB. Este recuo do produto interno bruto fica a dever-se, essencialmente, à queda pronunciada da procura interna.
Em reflexo, Portugal apresenta uma das taxas de pobreza infantil mais altas da Europa, apresentando a 8º maior taxa de pobreza infantil da OCDE. Estes são momentos particularmente difíceis, em que a crueza da situação aqui apresentada, e a perspectiva de uma mais que certa deterioração, poderiam suscitar sentimentos de pessimismo, desânimo e desesperança. Porém a realidade evidência contornos diferentes: nem uma crise como esta consegue afectar o lado solidário dos portugueses. O Banco Alimentar Contra a Fome recolheu em Portugal, no passado fim-de-semana, um total de 2309 toneladas de géneros alimentares na campanha realizada em mais de 1560 superfícies comerciais. Simultaneamente, a sua campanha “online” de doação de alimentos angariou numa semana 68 toneladas doados por 3.962 internautas. Se comparamos com o ano de 2009, a quantidade agora recolhida apresenta um acréscimo surpreendente de 14,9 pontos percentuais.
Os resultados obtidos voltam a evidenciar uma extraordinária adesão, contrariando todas as expectativas de que as características tradicionais de generosidade e de solidariedade portuguesas poderiam desviar-se do seu nível habitual.
É curioso concluir que numa altura em que se esperava que se désse menos, os portugueses estão a dar bastante mais. Os portugueses estão a tentar reagir à crise, agindo ao invés de protestar, evidenciando o seu carácter resiliente. Portugal escolhe a solidariedade como uma arma de combate e certamente que com ela o combate será facilitado.
Porém, e sem desvalorizar o seu carácter mobilizador, é importante ter em conta que a solidariedade por si só não é suficiente - a crise têm que ser enfrentada com as nossas melhores armas, consciencializando-nos que o estilo consumista adoptado até então terá que ser substituído definitivamente , dando lugar a um espírito de contenção e de poupança. Poupar terá que voltar a “estar na moda”.
[artigo de opinião produzido no âmbito da u.c. "Economia Portuguesa e Europeia", do Curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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