terça-feira, 14 de junho de 2011

Uma análise crítica das tendências de desinvestimento durante a crise

O Investimento Directo Estrangeiro (IDE) é importante, especialmente para uma pequena economia como Portugal, dado que permite estimular o crescimento económico com recurso a financiamento do exterior. Apesar de não ser consensual, espera-se que este tenha um impacto positivo na economia por diversos motivos, como a "importação" de "know how" e técnicas de gestão mais avançada, que se transferem para a economia nacional.
Nos últimos anos temos assistido, no entanto, a um desinvestimento tanto do IDE como do IDPE (Investimento Directo de Portugal no Estrangeiro):
Em 2010, o IDE bruto registou um crescimento de 9,6%, atingindo os €35 biliões, valor só equiparável com o de 2008. No entanto, devido a um crescimento de 13,1% do desinvestimento, atingindo o valor mais elevado até à actualidade de €34 biliões, em termos líquidos, a contracção foi significativa atingindo os 43,7%.
Neste último ano (2010), um dos problemas relacionados com o IDE, foi o corte no reinvestimento de lucros por parte das empresas estrangeiras com negócios em Portugal. Estes lucros são gerados internamente, mas são considerados capitais externos, sendo uma das formas de investimento externo em Portugal. A contracção do reinvestimento em 2010 pode ser consequência da necessidade de reorientar as poupanças para dar resposta a situações de pouca liquidez ou à diminuição do número de oportunidades de negócio.
Quanto ao IDPE líquido, a maior quebra até ao momento aconteceu em 2010, passando de €588 milhões em 2009 (um valor já significativamente baixo se compararmos com os €1.872 milhões de 2008 ou com os €4.013 milhões de 2007) para uns inacreditáveis €6.500 milhões negativos em 2010, uma contracção de 1.205,9%, resultado de um forte desinvestimento acompanhado de uma queda no investimento bruto.
Apesar da OCDE admitir que Portugal tem feito progressos em matéria de regulação e ambiente de negócios (através de incentivos fiscais – fundos da UE e benefícios nos impostos ou fornecendo infra-estruturas complementares), estes não são suficientes. Como principais reformas já realizadas para aumentar o IDE, destaca-se a redução dos procedimentos necessários para a criação de uma empresa “na hora”, a redução na carga fiscal, a existência de uma entidade reguladora para a concorrência, para evitar práticas anti-concorrenciais e para promover a transparência na economia.
A meu ver a atracção de mais IDE passará por movimentar três variáveis fundamentais: legislação laboral (que se apresenta demasiado rígida); mercado de trabalho (ajustamento nas indemnizações de despedimento e mais flexibilidade no contrato de trabalho) e regime fiscal. Como Basílio Horta, Presidente da AICEP defendeu, “um regime fiscal competitivo não é tanto ao nível da intensidade da taxa fiscal mas fundamentalmente ao nível da burocracia” (Romano, 15 de Dezembro de 2010). De salientar que algumas destas medidas vão já ser alteradas no decorrer do plano que o BCE, Comissão Europeia e FMI definiram para Portugal como contrapartida do resgate financeiro que será entregue em ‘tranches’ nos próximos tempos. A este nível, acrescentaram ainda diversas medidas, como a necessidade de reduzir a taxa social única (TSU) que se espera ter do ponto de vista macroeconómico um efeito competitivo semelhante a uma desvalorização da moeda.
No entanto, os motivos de preocupação em relação ao investimento deste tipo não podem deixar de aumentar. A deslocalização de actividades de produção para Leste foi, sem dúvida, uma das causas mais preocupantes da queda do IDE no nosso país mas permanecem ainda algumas dificuldades ao nível de competitividade face aos países asiáticos e, mais recentemente, face aos produtos têxteis do Paquistão. Parece-me, então, que a localização destas empresas não pode continuar a ser vista pela óptica dos custos de mão-de-obra, porque os países asiáticos e de leste apresentam um panorama muito mais favorável. A aposta deverá ser feita em sectores que se distinguem pela qualidade dos serviços prestados e produtividade marginal.
Em forma de conclusão, falta dinâmica à Economia Portuguesa o que leva à necessidade de promover a eficiência do investimento e a dinâmica empresarial, estimulando novas áreas de criação de emprego, aumentando a capacidade competitiva, fomentando a concorrência e desburocratizando e criando um bom ambiente de negócios.

Inês Ferreira Braga

Referências:
aicep Portugal Global. (2009). Aspectos a Acautelar num Processo de IDPE.
aicep Portugal Global. (2010). Portugal - Perfil País.
aicep Portugal Global. (2011). Portugal - Ficha País.
Bento, V. (2009). Perceber a crise para encontrar o caminho. Lisboa: Bnomics.
Ernst & Young. (2010). Wake up call. Ernst & Young.
Freitas, M. L., & Mamede, R. (2009). Structural transformation and the role of foreign direct investment in Portugal: a descriptive analysis for the period 1990-2005. Copenhagen Business School: Summer Conference 2009.
KPMG Internacional. (2011). Corporate Tax Rate Survey. KPMG.
Leitão, N. C., & Faustino, H. C. (2010). Portuguese Foreign Direct Investments Inflows: An Empirical Investigation. International Research Journal of Finance and Economics.
Romano, P. (15 de Dezembro de 2010). Lucros estrangeiros reinvestidos no País caem 85% em 2010. Jornal de Negócios.
Simões, A. C. (2010). Internacionalização das empresas portuguesas: processos e destinos.

Nota: Dados estatísticos retirados da AICEP, cuja fonte foi o Banco de Portugal.

[artigo de opinião produzido no âmbito da u.c. "Economia Portuguesa e Europeia", do Curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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