quinta-feira, 16 de junho de 2011

Quem paga o défice?

Na última semana, ficámos a saber quem é que terá a responsabilidade de conduzir o país durante aplicação do programa de “governo” da troika. Parece estranho mas o FMI em muito influenciou a condução da política económica e a definição dos conteúdos programáticos que os chamados “partidos do poder” levaram à votação nas últimas eleições. Na verdade, o conteúdo deste programa de ajustamento estrutural proposto pela troika foi pouco discutido, em detrimento da responsabilização política pela necessidade do pedido deste empréstimo. Muitos portugueses ficaram sem saber quem é que irá pagar este programa do FMI, ou seja, de onde vêm os recursos necessários para a consolidar as finanças públicas.
De acordo o Jornal de Negócios, a maior fatia da factura do FMI ficará a cargo da função pública. O corte de salários, medida já implementada em 2011, associada ao congelamento de salários em 2012 e 2013, bem como a proibição de progressões na carreira significará um corte equivalente a 1,4% do PIB. Os próximos dois anos serão para os funcionários públicos significado de fortes perdas reais nos seus rendimentos estimadas entre os 12% e 17%. Logo a seguir, seguem-se os gastos com os consumos intermédios do Estado. Grande parte das despesas correntes, excluindo os salários e os juros da dívida pública, sofrerá um corte estimado em 1,3% do PIB português. As transferências realizadas pelo Estado para Autarquias, Regiões Autónomas, Fundos e serviços autónomos e institutos e empresas públicas verão os seus montantes reduzidos em cerca de 1,2% do PIB. Finalmente, surgem nesta lista as contribuições das mais importantes fontes de receita para o Estado português – o IVA e o IRS. Individualmente, tanto IVA como IRS representarão 1% do PIB na consolidação orçamental.
No caso do IVA, foi discutido durante a campanha eleitoral em que moldes seria feito este aumento de receita, sem que tenha ficado totalmente esclarecido. Mas pelo menos, numa primeira fase, não haverá aumentos nas taxas do IVA, simplesmente haverá produtos que transitarão de escalões mais baixos do IVA para escalões superiores. No caso do IRS, já houve agravamento de taxas, mas o aumento extra de receita será feito através de cortes nos benefícios fiscais. Por fim, temos os cortes no SNS, que representarão 0,9% do PIB.
Portugal tem um duro caminho pela frente, pautado por um clima de grande incerteza quanto ao desempenho da economia portuguesa nos próximos anos. Em 2011, espera-se uma quebra no PIB de 2,2% e 1,8%, em 2012. A duração desta recessão terá consequências na capacidade do governo em executar as reformas, bem como na própria execução orçamental. Como se pode constatar, os cortes na despesa terão um papel essencial na consolidação orçamental, o que torna este programa muito mais arriscado e difícil, visto que cortes na despesa são sempre mais difíceis de executar. Para a aplicação deste programa, além de vontade política, é fundamental que haja um clima de estabilidade política e social. Se o clima de instabilidade política foi apontado como responsável pela queda do anterior governo e que obrigou Portugal a recorrer ao FMI, não será menos verdade que no futuro o mesmo possa voltar a acontecer resultado da ineficácia na aplicação deste programa de consolidação orçamental, tal como aconteceu na Grécia. Por isso, é necessário rigor na aplicação das medidas acordadas, suportadas por um amplo consenso político.

Diogo Braga Leite

[artigo de opinião produzido no âmbito da u.c. "Economia Portuguesa e Europeia", do Curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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