domingo, 6 de maio de 2012

O “bom” caminho para o crescimento económico

Nas reuniões de primavera que o Fundo Monetário Internacional (FMI) promoveu há duas semanas em Washington, o ministro de Estado e das Finanças, Vítor Gaspar, deixou uma mensagem de esperança a quem o quis ouvir sobre os progressos de Portugal que, segundo Vítor Gaspar, vai no bom caminho em termos de crescimento económico e criação de emprego. O ministro português assegurou: “Temos conseguido resultados e, continuando neste caminho, seremos capazes de ter bom sucesso no sentido de criar os fundamentos para o crescimento sustentado, competitividade da economia portuguesa e criação de emprego”. Contudo, não estou certa de que as medidas tomadas anteriormente e as medidas propostas pelo Governo posteriormente a estas declarações de Vítor Gaspar, sejam as mais adequadas, numa perspetiva de longo prazo, no sentido de obter o tão desejado crescimento económico.
Uma semana depois do ministro das Finanças ter declarado que Portugal estava no bom caminho para o crescimento económico, no Programa do Governo, o Executivo liderado por Passos Coelho revelou que, no âmbito da redução de custos, vai incentivar "a mobilidade dos trabalhadores entre os vários organismos, e entre estes e o sector privado, criando um programa de rescisões por mútuo acordo". A minha questão é se esta será a solução ideal para o grande problema na Função Pública, nomeadamente, a inexistência de uma missão clara nas instituições públicas - a implementação de objetivos (e das respetivas consequências quando estes não são alcançados) – que leva à desmotivação dos trabalhadores, razão pela qual a Função Pública é pouco produtiva, os serviços públicos são pouco eficientes, os trabalhadores fazem greves “quando lhes dá jeito” - pois as consequências são expressas apenas em pequenos cortes salariais, e não há risco de perda do posto de trabalho se o serviço que representam apresentar resultados negativos -, etc., o que resulta em maus desempenhos das organizações públicas.
Como é óbvio, este problema não vai ser resolvido com diminuição de cargos e do número de trabalhadores da Função Pública, pois só irá sobrecarregar os trabalhadores que continuarem a exercer as suas funções e, uma vez que as horas “extraordinárias” passaram a ser pagas pela metade (25% de acréscimo pela primeira hora extra e 37,5% pelas restantes), o grau de desmotivação dos trabalhadores vai aumentar. Muito menos o objetivo da redução de custos será alcançado, pois as rescisões serão “amigáveis”, podendo a indemnização chegar ao limite máximo de 77600 euros por trabalhador e, no caso de estes trabalhadores poderem ter acesso ao subsídio de desemprego (ponto ainda não acordado com os sindicatos), a Segurança Social terá uma despesa mensal com cada trabalhador a partir do momento em que for feita a rescisão.
No entanto, a estratégia do Governo, que consistiu em conjugar as rescisões “amigáveis” com o congelamento das reformas antecipadas (que impede que os trabalhadores utilizem estas rescisões por mútuo acordo para compensar a perda resultante do pedido antecipado de reforma) e com a diminuição da remuneração das horas extraordinárias (que faz com que os trabalhadores que ficarão sobrecarregados recebam menos pelo tempo extra que estiverem a exercer o serviço), foi de facto bem pensada, mas não resolverá os problemas centrais do sector público.
Portugal não necessitava de fazer despedimentos, ou melhor, rescisões “amigáveis” - o que para o Sr. Primeiro-ministro é diferente. Bastava apenas que se preocupasse com os seus trabalhadores, com os seus recursos humanos, que lhes desse a devida atenção para mantê-los constantemente motivados, tanto para atingir os objetivos do organismo que representam, como para fazer crescer o país, e lhes proporcionasse o acesso a formação, para que possam evoluir e executar sempre da melhor forma o seu trabalho, e, assim sim, se aumentaria a produtividade do sector público e, consequentemente, se eliminariam as ineficiências e combatiam os défices, o que permitiria reduzir os custos.
Sendo certo que o investimento em capital humano é uma das medidas que precisa ser adotada numa política de promoção do crescimento, Portugal está a falhar gravemente neste aspeto. As conclusões do relatório «Tempo letivo recomendado no ensino obrigatório europeu» referem que os alunos portugueses são dos que têm mais carga letiva entre os países da União Europeia, mas não têm os melhores resultados escolares, ou seja, a formação por si só é pouco produtiva, é pouco eficiente. Com as reduções no apoio aos estudantes do ensino superior efetuadas pelo Governo, o panorama ao nível da formação só se complica, e só com trabalhadores qualificados conseguimos ser competitivos. Mas a formação não é suficiente para que um trabalhador seja produtivo. É necessário também que ele esteja motivado, e o funcionário público caracteriza-se por ser um trabalhador muito pouco motivado, por não ter objetivos traçados nem estratégia definida, e as medidas tomadas/propostas recentemente só vêm agravar esse sentimento de desmotivação. Em suma, e numa perspetiva de longo prazo, não seria muito mais eficaz utilizar os recursos disponíveis e orientá-los da melhor forma, para que se tornasse o sector público, de uma vez por todas, produtivo, e assim se diminuíssem os gastos desnecessários e os custos das ineficiências, em vez de diminuir os recursos e manter tudo como está?
Mas não só o investimento em capital humano importa para se atingir o crescimento económico. Também é necessário investir em infraestruturas públicas, aspeto que Portugal praticamente colocou de lado aquando da chegada da Troika. É necessária também a promoção da eficiência dos mercados, com políticas de promoção de concorrência e fornecimento de bens públicos e, neste aspeto, temos assistido não a um aumentar da concorrência em sectores monopolizados, mas sim a uma passagem dos monopólios públicos a privados.
É necessária a promoção de atividades geradoras de externalidades positivas, como o desenvolvimento de produtos, desenvolvimento de novas tecnologias e promoção da investigação aplicada; e a promoção da poupança nacional, através de um défice orçamental público, pois os aumentos nos níveis de poupança são necessários para financiar todos os investimentos anteriormente referidos. No entanto, na situação atual do país, os investimentos por parte das empresas têm de ser feitos recorrendo ao crédito, e aqui reside outro entrave para o crescimento económico de Portugal, pois a banca não tem condições para conceder empréstimos, o que inviabiliza o investimento das empresas, tanto na formação dos seus trabalhadores (fator essencial para a competitividade), como na inovação (fator essencial para o crescimento da empresa), ou matérias-primas e equipamentos, podendo levar as empresas a não satisfazerem as necessidades do mercado nacional e internacional, pois se não poderem pagar aos seus fornecedores, não obtêm a matéria-prima, não satisfazem as necessidades dos clientes, perdem poder de mercado, perdem receitas, são obrigadas a reduzir custos e a despedir trabalhadores, contribuindo para o agravamento da taxa de desemprego.
Como podemos ver, nem tudo está a correr mal por culpa do Governo, mas nem tudo está a correr bem graças ao Governo, pois há problemas essenciais que não estão a ser tomados em conta, principalmente no que diz respeito ao sector público e aos seus trabalhadores, e ao ensino e formação dos portugueses. Podemos estar no bom caminho para o crescimento económico, mas só agora o começámos a trilhar, e ainda temos muitos quilómetros a percorrer.

Andreia Cunha 

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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