A distribuição da riqueza e os
problemas socioeconómicos daí decorrentes desde o início do século que
constituem um grave problema do nosso país, que está actualmente no grupo de
países com maiores desigualdades a nível de rendimento disponível das famílias,
a par do México, Turquia e Chile.
Em
2002, segundo um estudo do INE, estimava-se que os 20% mais ricos da população
portuguesa recebiam 7,6 vezes mais do que os 20% mais pobres (face ao um
diferencial médio europeu entre os mesmos grupos de apenas 4,6) – estes últimos
recebiam apenas 5% da riqueza líquida nacional, enquanto os 20% mais ricos
recebiam 44,9%. Entre 2001 e 2004, segundo dados do Eurostat, o diferencial de
rendimentos entre os mesmo segmentos da população aumentou de 6,5 para 7,2
vezes mais, face a um aumento da média europeia de apenas 4,2 para 4,8. Uma vez
mais, Portugal encontra-se muito atrasado em relação à Europa, atraso esse
devido a vários factores, como a falta de políticas que promovam a equidade, a
falha do sistema fiscal em tributar certos rendimentos provenientes da economia
informal, e o próprio modelo de crescimento económico. Nota-se assim que a
distribuição do PIB português está enviesada na direcção da remuneração do
capital em detrimento da remuneração do factor trabalho, o que tem como
consequência óbvia o empobrecimento da população.
Entre 2005 e 2009, a taxa de pobreza
diminuiu de 19,4% para 17,9%. Isto deveu-se à criação, em 2005, do Complemento
Solidário para Idosos, dado que estes números têm em conta a proporção da
população que beneficia de transferências sociais; caso contrário, a taxa de
portugueses em risco de pobreza ascenderia aos 43,4% (em 2009). No entanto,
desde 2009 que têm havido cortes constantes nos apoios sociais: por exemplo, os
beneficiários de abono de família diminuíram de 1,7 milhões para 1,1 milhões, e
os beneficiários do Rendimento Social de Inserção diminuíram de 170 mil para
132 mil, entre Fevereiro de 2010 e Fevereiro de 2011. Os mais afectados por
estes cortes são as famílias monoparentais, as famílias com três crianças ou
mais e os desempregados.
No entanto, pobreza não é só escassez de
dinheiro, é também a restrição no acesso a bens que nos tempos actuais são
considerados básicos, como possuir uma televisão a cores ou fazer refeições de
carne e de peixe alternadas diariamente. Desde 2001 que o Estado tem vindo a
reduzir os salários, sob o pretexto de que estes eram elevados em relação à
produtividade de cada trabalhador, e de que esta redução era necessária para
aumentar o investimento e estimular o crescimento económico. No entanto, o
efeito foi exactamente o oposto: o investimento caiu, e não se tem verificado
crescimento económico significativo. Por outro lado, os indivíduos que após os
cortes continuaram com um rendimento acima do rendimento mediano viram o seu
poder de compra reduzido, devido ao aumento do nível de preços – entre 2000 e
2011, os trabalhadores da Administração Pública viram o seu poder de compra
reduzido entre 8% a 15,5%, e, em 2010, 22,5% dos portugueses encontravam-se em
situação de privação material. Para além disto, o agravamento da situação do
mercado de trabalho faz com que muitos indivíduos se encontrem numa “situação
de pêndulo entre o mercado de trabalho e o fundo de desemprego, o que gera
irregularidade no pagamento das contribuições” e impede estes indivíduos de
beneficiar dos apoios públicos.
De acordo com
o Memorando de Entendimento, para 2012 e 2013, estão planeados cortes nas
funções sociais do Estado de 2815 milhões de euros. Isto gerará uma
deterioração ainda mais acentuada das condições de vida da população, em
especial da classe média, constituída pelos funcionários públicos. Nota-se
aliás uma desigualdade de tratamento entre funcionários públicos e privados:
como já mencionado neste texto, entre 2000 e 2011, os funcionários da
Administração Pública viram o seu poder de compra reduzido, enquanto no mesmo
período, o poder de compra dos funcionários do sector privado aumentou 8%.
Assim,
conclui-se que a taxa de pobreza e exclusão social têm tendência a aumentar: os
constantes cortes nos apoios sociais, em conjunto com as restantes medidas de
austeridade, fazem com que a situação para a classe média se deteriore, sendo
que um possível desfecho é o de que muitos dos indivíduos irão cair em situação
pobreza. Ao contrário do pretendido, isto irá causar uma desaceleração ainda
maior da economia, pois o consumo das famílias, que depende maioritariamente da
classe média, irá estagnar, levando as restantes variáveis macroeconómicas pelo
mesmo caminho. É então necessária a implementação de políticas orientadas para
a promoção do crescimento económico sem prejuízo da situação socioeconómica da
população, e uma distribuição dos rendimentos mais equitativa entre lucros e
salários.
Inês Macedo
Sem comentários:
Enviar um comentário