sábado, 5 de maio de 2012

O problema da distribuição de riqueza e pobreza em Portugal

            A distribuição da riqueza e os problemas socioeconómicos daí decorrentes desde o início do século que constituem um grave problema do nosso país, que está actualmente no grupo de países com maiores desigualdades a nível de rendimento disponível das famílias, a par do México, Turquia e Chile.
         Em 2002, segundo um estudo do INE, estimava-se que os 20% mais ricos da população portuguesa recebiam 7,6 vezes mais do que os 20% mais pobres (face ao um diferencial médio europeu entre os mesmos grupos de apenas 4,6) – estes últimos recebiam apenas 5% da riqueza líquida nacional, enquanto os 20% mais ricos recebiam 44,9%. Entre 2001 e 2004, segundo dados do Eurostat, o diferencial de rendimentos entre os mesmo segmentos da população aumentou de 6,5 para 7,2 vezes mais, face a um aumento da média europeia de apenas 4,2 para 4,8. Uma vez mais, Portugal encontra-se muito atrasado em relação à Europa, atraso esse devido a vários factores, como a falta de políticas que promovam a equidade, a falha do sistema fiscal em tributar certos rendimentos provenientes da economia informal, e o próprio modelo de crescimento económico. Nota-se assim que a distribuição do PIB português está enviesada na direcção da remuneração do capital em detrimento da remuneração do factor trabalho, o que tem como consequência óbvia o empobrecimento da população.
Entre 2005 e 2009, a taxa de pobreza diminuiu de 19,4% para 17,9%. Isto deveu-se à criação, em 2005, do Complemento Solidário para Idosos, dado que estes números têm em conta a proporção da população que beneficia de transferências sociais; caso contrário, a taxa de portugueses em risco de pobreza ascenderia aos 43,4% (em 2009). No entanto, desde 2009 que têm havido cortes constantes nos apoios sociais: por exemplo, os beneficiários de abono de família diminuíram de 1,7 milhões para 1,1 milhões, e os beneficiários do Rendimento Social de Inserção diminuíram de 170 mil para 132 mil, entre Fevereiro de 2010 e Fevereiro de 2011. Os mais afectados por estes cortes são as famílias monoparentais, as famílias com três crianças ou mais e os desempregados.
 No entanto, pobreza não é só escassez de dinheiro, é também a restrição no acesso a bens que nos tempos actuais são considerados básicos, como possuir uma televisão a cores ou fazer refeições de carne e de peixe alternadas diariamente. Desde 2001 que o Estado tem vindo a reduzir os salários, sob o pretexto de que estes eram elevados em relação à produtividade de cada trabalhador, e de que esta redução era necessária para aumentar o investimento e estimular o crescimento económico. No entanto, o efeito foi exactamente o oposto: o investimento caiu, e não se tem verificado crescimento económico significativo. Por outro lado, os indivíduos que após os cortes continuaram com um rendimento acima do rendimento mediano viram o seu poder de compra reduzido, devido ao aumento do nível de preços – entre 2000 e 2011, os trabalhadores da Administração Pública viram o seu poder de compra reduzido entre 8% a 15,5%, e, em 2010, 22,5% dos portugueses encontravam-se em situação de privação material. Para além disto, o agravamento da situação do mercado de trabalho faz com que muitos indivíduos se encontrem numa “situação de pêndulo entre o mercado de trabalho e o fundo de desemprego, o que gera irregularidade no pagamento das contribuições” e impede estes indivíduos de beneficiar dos apoios públicos.
De acordo com o Memorando de Entendimento, para 2012 e 2013, estão planeados cortes nas funções sociais do Estado de 2815 milhões de euros. Isto gerará uma deterioração ainda mais acentuada das condições de vida da população, em especial da classe média, constituída pelos funcionários públicos. Nota-se aliás uma desigualdade de tratamento entre funcionários públicos e privados: como já mencionado neste texto, entre 2000 e 2011, os funcionários da Administração Pública viram o seu poder de compra reduzido, enquanto no mesmo período, o poder de compra dos funcionários do sector privado aumentou 8%.
Assim, conclui-se que a taxa de pobreza e exclusão social têm tendência a aumentar: os constantes cortes nos apoios sociais, em conjunto com as restantes medidas de austeridade, fazem com que a situação para a classe média se deteriore, sendo que um possível desfecho é o de que muitos dos indivíduos irão cair em situação pobreza. Ao contrário do pretendido, isto irá causar uma desaceleração ainda maior da economia, pois o consumo das famílias, que depende maioritariamente da classe média, irá estagnar, levando as restantes variáveis macroeconómicas pelo mesmo caminho. É então necessária a implementação de políticas orientadas para a promoção do crescimento económico sem prejuízo da situação socioeconómica da população, e uma distribuição dos rendimentos mais equitativa entre lucros e salários.

Inês Macedo

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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