domingo, 6 de maio de 2012

O novo “Plano Marshall” e a mudança de estratégia do BCE

É como um novo plano Marshall para a Europa. Bruxelas está a desenhar um pacto para o crescimento com apresentação já marcada para o final de Junho. Na próxima cimeira a comissão europeia vai revelar o projecto que pretende estimular a economia e criar emprego nos países mais afectados pela crise. A notícia é avançada pelo jornal Espanhol “El País” que refere que o plano tem aparecido em documentos oficiais.
À partida serão necessários cerca de 200 mil milhões de euros. O investimento será feito em áreas como as infra-estruturas, energias renováveis e tecnologias e pretende contar com o apoio do sector privado. A dificuldade em financiar o projecto levou a que François Hollande, candidato à presidência Francesa, sugerisse utilizar o Banco Europeu de Investimento como alavanca para o crescimento económico na Europa. Depois das eleições francesas, Bruxelas deve apresentar um programa de refinanciamento desta instituição financeira. Merkel mudou mesmo o seu discurso e confessa ser adepta da ideia do investimento através do Banco Europeu de Investimento.
Esta mudança de discurso por parte dos dirigentes europeus não fica por aqui. Vejamos o que se tem passado nos últimos meses no Banco Central Europeu. Desde que a crise rebentou que a estratégia baseia-se na austeridade, austeridade essa “alavancada” pelo BCE com políticas condizentes até ao primeiro dia de Novembro do ano passado. Mario Draghi eleito governador do BCE a 1 de Novembro de 2011, mudou completamente a orientação do BCE. Em pouco mais de quatro meses, o BCE cortou o valor da moeda para um mínimo histórico, comprou quantidades enormes de dívida pública no mercado secundário e lançou varias opções de crédito de oferta limitada em vários prazos. Em Fevereiro deste ano o BCE emprestou 529,5 mil milhões de euros a bancos europeus depois de, em Dezembro do ano anterior, ter emprestado 489 mil milhões nas mesmas condições. Com estes dois empréstimos o BCE injectou no sistema financeiro mais do dobro do dinheiro que o FMI e a União Europeia tentaram angariar durante um ano para erguerem o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF).
Este plano para o crescimento aliado à mudança de estratégia do Banco Central pode ser a fase mais visível da mudança de política na Europa, passando da austeridade imposta pelo eixo franco-alemão para o crescimento cada vez mais exigido pelos governantes europeus.
Depois disto podemos tirar algumas conclusões. Em primeiro lugar, Angela Merkel chega sempre atrasada ao comboio das decisões económicas; depois de tanto tempo a defender a austeridade, afirmando não haver necessidade de pacotes de crescimento para sair desta crise, muda o seu discurso provavelmente influenciada pelas recentes decisões do BCE, da pressão dos dirigentes Europeus e das presidenciais na França. Por outro lado, o novo plano “Marshall” que planeia financiar a economia com cerca de 200 mil milhões de euros, na minha opinião, revela-se muito aquém daquilo que será necessário para recuperar as economias em dificuldade.
Vejamos: para os quatro países em dificuldade, os fundos seriam divididos em cerca de 50 mil milhões de euros a cada país, o que não é nada comparativamente aos programas de ajuda que vigoram em qualquer um destes países, sem falar do problema de financiamento do Banco Europeu de Investimento, que necessita da contribuição dos estados membros para chegar aos 200 mil milhões de euros.
Para terminar. o "Plano Draghi" não está a resolver os problemas de longo prazo da zona euro mas a comprar tempo para que os líderes europeus coloquem em marcha reformas estruturais nas suas economias. O plano do BCE não é novo nem inovador. Nos últimos três anos, a Fed fez algo que nunca tinha feito nos últimos 100 anos, e só hoje é que o resultado destas medidas começa a surtir algum efeito no mercado e na economia dos EUA. É por isso um plano exigente e demorado aquele que o BCE tem vindo a desenvolver.
Nota-se nitidamente perante a volta final das eleições francesas a vontade súbita de alterar o discurso e ao mesmo tempo projectar o futuro em cima do joelho. Estas mudanças além de pecarem pelo atraso, provavelmente só aconteceram devido à “política”. Creio que, qualquer tentativa de alavancar o crescimento económico na zona euro terá de contar com a força de todo o bloco de países da UE e estar sustentada num plano bem mais consistente que meros projectos infundados.

Eliseu Ferreira 

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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