segunda-feira, 7 de maio de 2012

A Praxe do Salário Mínimo

“Are your wages set in Beijing?” Já em 1995 Richard B. Freeman respondia afirmativamente a esta sua pergunta, relativamente às perspectivas para o futuro dos salários dos países do ocidente. Explicava que à medida que mais e mais trabalhadores ocidentais pouco qualificados encontram emprego no sector de bens e serviços não comercializáveis, o potencial de importação de países menos desenvolvidos deve diminuir, a par com a redução dos salários e do emprego. Um factor utilizado exclusivamente em bens não comercializáveis tem a sua remuneração definida pela economia doméstica. Isto significa que, quanto mais perto as economias ocidentais estiverem desta situação, menor será a pressão induzida sobre os trabalhadores pouco qualificados.
Certo é que, nos últimos dois anos, o salário mínimo chinês aumentou cerca de 22%, e aparentemente, continuará a subir. Este aumento verificou-se nas cidades de Pequim e Shenzhen, apesar de a tendência ser seguida pelas restantes cidades, ainda que com menor impacto. O Governo chinês tem como objectivo aumentar o salário mínimo a uma média de 13% ao ano até 2015, o que é criticado pelos empresários, que afirmam estar a sofrer as consequências da crise económica ocidental que, obviamente, teve também impacto no crescimento da própria economia chinesa. Apesar desta contestação, o Governo afirma que o objectivo é promover a igualdade da população em termos económicos e aumentar o poder de compra.
Segundo o memorando da troika, o aumento do salário mínimo português só será possível com o desenvolvimento da economia e do mercado de trabalho, o que, na conjuntura actual, não acarreta grande probabilidade. A convergência do salário mínimo chinês com o salário mínimo dos países ocidentais tem-se verificado a grande velocidade, e espera-se que, em 2019, Portugal e a China apresentem o mesmo valor para aquele que é o mais baixo salário que os empregadores podem legalmente pagar aos seus funcionários.
Foi em 2010 que ocorreu o aumento nominal mais significativo no salário mínimo em Portugal, apesar de ter sido no ano anterior que se registou o maior aumento em termos reais (6,4%). Há que relembrar que foi em 2008 que José Sócrates referiu as famosas lágrimas de crocodilo dos que defendiam os novos pobres e que acabaram por rejeitar a proposto do aumento do salário mínimo do ano seguinte. Foi também aqui que referiu que este aumento em nada comprometeria a competitividade das empresas portuguesas. As empresas competitivas sabem que pagar o salário mínimo traz problemas de motivação para trabalhador, pelo que tendem a pagar salários mais altos, mas o que será que acontece com as outras empresas que pretendem emergir no mercado?
                Desde 2006 que o número de trabalhadores portugueses que não ganha mais que o mínimo estabelecido por lei quase duplicou, havendo em 2011 aproximadamente 400.000 a auferirem esse montante. O ano passado o Governo pediu um estudo às Universidades do Minho e do Porto que avaliasse o impacto do aumento do salário mínimo nacional, cujos resultados não foram favoráveis relativamente ao avanço desse incremento. A proposta do PSP ao Governo foi rejeitada pela maioria no Parlamento com o argumento da crise. O objectivo definido em 2006, de se atingir os 500 euros em 2011 não foi cumprido, e nem em 2012 os mais pobres trabalhadores portugueses estão a receber mais de 485€ mensais.
Segundo os dados de 2011 fornecidos pela Eurostat, dos três países que neste momento beneficiam do empréstimo da troika, Portugal é o que apresenta menor salário bruto mensal, sendo este de 566€. A Irlanda está no topo da pirâmide com 1462€ e a Grécia está no centro com 877€. Dos restantes países, o Luxemburgo exibe o maior valor de salário bruto com 1758€ mensais. A Bulgária é o país mais pobre neste sentido, com apenas 123€/mês.
O salário mínimo é um tema controverso no que respeita às suas consequências. Por um lado, visa a protecção do trabalhador e providencia estabilidade económica, por outro, é um entrave à contratação de trabalhadores, gerando desemprego estrutural.  Para o lado das empresas, a diminuição dos salários torna o trabalho relativamente mais barato face ao capital. Isto significa que para igual nível de produção, aumenta a procura de trabalho e diminui a procura de capital. Há um efeito de substituição e produzir passa a ser mais barato, o que aumenta a produção da empresa. O salário mínimo estabelece um problema de negociação das empresas com o trabalhador, já que estas extraem o máximo e pagam o menos possível. Daí a necessidade de um limite mínimo salarial, que é estabelecido para garantir a sobrevivência dos trabalhadores. No entanto, a taxa de desemprego é tanto maior quanto maior for o valor do salário mínimo e quanto mais elásticas forem as curvas da oferta e procura de trabalho.
A criação do salário mínimo foi das primeiras medidas legislativas a ser implantada com o 25 de Abril, dando início ao Estado Social, que apoia não só os cidadãos mas também as empresas portuguesas. Os sindicatos e as reivindicações dos trabalhadores, como a redução do horário semanal, o direito à greve e o subsídio de desemprego ganharam forma em 1974, sendo o 1º de Maio o dia em que são contestadas as perdas ou reduções dos direitos criados após a revolução dos cravos.
Muito tem mudado desde essa data, mas a carência dos trabalhadores portugueses aparenta aumentar à medida que se vai fazendo história. É também controverso o tema do papel dos sindicatos e das suas exigências, já que o leque de interesses económicos não parece cessar. A questão será: que parte da liberdade de 74 foi transitada para o nível económico dos portugueses de hoje? Deve-se suspirar de alívio porque o salário mínimo evita a exploração das empresas ou gemer de cansaço porque afinal este ainda não corresponde ao esforço exigido a muitos? Certo é que os trabalhadores não têm voto na matéria no que respeita ao estabelecimento do preço dos bens de consumo e às suas variações, e actualmente muito menos na definição do preço do seu próprio produto.

Joana Dias

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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