Foi por estarem “conscientes da
sua obrigação, enquanto Estados-Membros da União Europeia, de considerarem as
suas políticas económicas uma questão de interesse comum” e “desejosos de
promover condições favoráveis a um crescimento económico mais forte na União
Europeia e de desenvolver para o efeito uma coordenação cada vez mais estreita
das políticas económicas na área do euro”1,
que 25 dos 27 Estados-Membros da União Europeia assinaram o Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União
Económica e Monetária.
Este tratado estabelece normas
orçamentais que devem ser, na ordem jurídica interna do país, de carácter
vinculativo e permanente e que definem que o défice estrutural não poderá exceder
os 0,5% do PIB nem a dívida pública os 60%. Numa fase de transição, é pedido
aos países com dívida acima do limite que a reduzam a uma taxa média de um
vigésimo por ano. O não cumprimento do contratualizado pode levar a sanções
automáticas até 0,1% do PIB, o que, para Portugal, representa cerca de 160
milhões de euros.
Em Portugal, o tratado foi
apresentado como uma inevitabilidade, até porque a “concessão de assistência
financeira no quadro de novos programas ao abrigo do Mecanismo Europeu de
Estabilidade ficará condicionada, a partir de 1 de Março de 2013, à (sua)
ratificação”1.
Sem questionar a necessidade de
haver uma maior integração a nível orçamental na União Europeia, questiono os
moldes em que a solução apresentada se desenha.
Neste tratado, em vez de se
buscar a coordenação económica, há uma desconsideração completa pelas
especificidades de cada país, no que toca, por exemplo, ao nível e às
capacidades de desenvolvimento, tentando-se estabelecer critérios universais
irrealistas. Além disso, é um tratado centrado numa preocupação com resultados
nominais que apenas servem os interesses dos mercados financeiros, deixando-se
as pessoas em segundo plano e descurando-se o incentivo ao crescimento e o
combate ao desemprego. Não menos importante é a dificuldade que é criada para
aplicar medidas orçamentais contra-cíclicas em períodos de agravada recessão
económica.
Adicionalmente, alerto para a
existência de uma lacuna de legitimidade democrática na forma como está a ser
colocado este tratado. Sendo tão importante a nível europeu, seria de esperar
que o Parlamento Europeu, o único órgão supranacional eleito por sufrágio
directo, tivesse sido chamado a ratificá-lo. Não foi!
Por outro lado, “ao contrário
dos tratados europeus, que só podem vigorar depois de ratificados por todos os
Estados-Membros, o novo tratado foi negociado e elaborado à margem da UE e,
para prevenir eventuais surpresas, foi decidido que poderá entrar em vigor logo
que seja ratificado por 12 dos 25 signatários”2,
ficando comprometida a necessidade de consenso. Finalmente, o mecanismo que
será accionado em caso de não cumprimento das metas estabelecidas, “compreende
a obrigação de a Parte Contratante em causa aplicar medidas para corrigir o
desvio dentro de um determinado prazo”1,
o que se materializa numa perda de soberania dos Estados, que, por sua vez, não
é contraposta por um aumento da legitimidade democrática dos órgãos
supranacionais.
Não creio que exista, no
panorama actual, uma solução exequível e sustentável para a crise na Europa que
não passe por uma integração orçamental. Acredito, no entanto, que a solução poderia
ser procurada num programa mais centrado em questões como o desemprego e na
situação real da economia, com soluções adaptadas às várias realidades
nacionais, implementado por um Ministro das Finanças, ou mesmo um Governo
supranacional, eleito por sufrágio directo.
Contudo, estamos perante um
tratado que coloca Alemanha e França no controlo dos orçamentos nacionais de
todos os Estados-Membros e assume metas de convergência nominal irrealistas. É
neste contexto que me pergunto: depois da aplicação deste tratado, por quanto
tempo as populações dos países periféricos se deixarão governar por pessoas que
não elegeram? Será este o princípio do fim do mais longo período de paz na
Europa?
Luís
Nuno Barbosa
[1] Tratado sobre Estabilidade,
Coordenação e Governação na União Económica e Monetária
[2] Renascença, 15 de Abril de 2012
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