Em todos os países existe uma parte da Economia, a economia não registada (ENR), cuja actividade não é reflectida na contabilidade nacional, sendo o seu tamanho, causas e consequências variáveis de país para país. Este fenómeno tem ganho contornos preocupantes em Portugal, atingindo no ano de 2009 a fasquia dos 40 mil milhões de euros, cerca de 24,2% do PIB. Este número apresenta ainda uma tendência de crescimento devido ao aumento da carga fiscal e às medidas de austeridade. Analisando por sectores de actividade a ENR como percentagem do PIB registou, no 1º trimestre de 2009, o valor de 0.6% no sector agrícola, 5.5% na indústria e 16.6% nos serviços.
Schneider e Buehn (2007) estimaram que em 2004 o peso médio da ENR como percentagem do PIB seria de 15,5% nos países da OCDE, 36,7% em 19 países da Ásia Central e de Leste e 35,5% em 76 países em desenvolvimento. Os dados de 2008 colocavam a Espanha, Itália e Grécia como os países da OCDE recordistas da ENR, com a Espanha a encabeçar a lista, apresentando um valor equivalente a 18,7% do PIB.
O estudo mais recente publicado em Portugal, realizado por Nuno Gonçalves, da Faculdade de Economia do Porto, deverá deixar cada um de nós envergonhado com os números apresentados: em 2008 a ENR representou 23% do PIB, aproximadamente 40 mil milhões de euros.
Segundo o Presidente do Observatório de Economia e Gestão de Fraude, esta é uma estimativa que apenas diz respeito à economia paralela de fuga ao fisco e não inclui actividades ilegais (droga, prostituição e jogo), o que torna o seu real valor ainda mais alarmante. Comparando, conclui que o valor português é "2,6 vezes o dos Estados Unidos; 2,3 vezes o do suíço; 1,8 o do Reino Unido e 1,5 o da França".
Vários estudos defendem que os traços culturais dos portugueses são mais propícios à aceitação e a realização de fraude, facto que não pode deixar nenhum português indiferente, com vontade de alterar estes números.
A ENR abrange várias actividades que todos nós conhecemos. Começa logo quando não são declaradas inúmeras remunerações de empregados, para fugir ao pagamento à segurança social, bem como indivíduos que exercem uma actividade e conseguem declarar apenas parte dos rendimentos gerados através de estratégias mais simples, como não passar facturas, ou mais sofisticadas, como utilizar programas informáticos que possibilitam o recurso à fraude. Todos nós temos conhecimento daqueles que exercem uma profissão e fazem uns “biscates” por fora, nos quais auferem rendimentos superiores, bem como aqueles que oficialmente não têm rendimentos, mas recebem apoio social do estado, e exercem uma profissão não declarada. Mas será que sabemos de que forma é que estamos a ser afectados?
Segundo o estudo publicado por Nuno Gonçalves, estima-se que, em média, quando a ENR per capita aumenta 10% o PIB per capita aumenta 3.3%. Este valor é explicado na medida em que grande parte dos rendimentos gerados pela ENR são utilizados na economia oficial. Esta conclusão é apenas uma ilusão, pois tem consequências gravíssimas para a economia. Alguns dos exemplos são a distorção da concorrência e a diminuição das receitas do Estado.
Enquanto consumidores já fomos abordados inúmeras vezes se pretendíamos um preço mais baixo, não pedindo factura. Como cidadãos revoltamo-nos com essas situações, mas como consumidores temos tendência a comprar o produto mais barato. Nestes casos há uma distorção inaceitável da concorrência, prejudicando quem pratica a actividade honestamente.
Nos dias de hoje aqueles que cumprem honestamente as suas obrigações fiscais são, precisamente, os que acabam por suportar um aumento de impostos. Um combate sério à ENR possibilitaria um aumento desta via de receitas e a médio-longo prazo uma redução da carga fiscal.
Recentemente o Governo Português debateu, na reunião pelo combate à economia informal, a possibilidade de avançar com a factura obrigatória para todos os sectores de actividade e para todos os valores, como um simples café ou bolo. Quando abdicamos do documento comprovativo, o vendedor ou o prestador de serviço pode ou não registar na sua contabilidade o preço que pagámos e, se não registar, é como se nunca tivesse existido transacção. Se a economia é uma ciência principalmente relacionada com o problema de incentivos, a forma de ultrapassarmos esta questão é criar incentivos para que os consumidores passem a pedir factura.
Nenhum consumidor tem interesse em pedir factura pois à excepção das despesas com saúde e educação, entre outras, estas não são dedutíveis no IRS. Possibilitar ao sujeito passivo de IRS deduzir uma pequena parte destas despesas traria benefícios ao Estado? Teria de ser feita uma análise rigorosa, contudo o número de facturas pedidas aumentaria consideravelmente, e consequentemente diminuiria a economia paralela. Uma solução mais radical passaria por possibilitar ao consumidor não pagar o bem ou serviço, se no acto da compra não fosse apresentada de imediato a respectiva factura.
Quando não exigimos a factura estamos a ser cúmplices de uma fraude que, embora julguemos que ficar a ganhar, por não pagarmos o IVA respectivo, na realidade isso não passa de uma ilusão. Estamos a pagar o IVA a quem escapa ludibriando o Estado, bem como ainda a alimentar um sistema económico paralelo, que nos conduz a um país mais injusto e que em última análise, nos vai prejudicar ainda mais, aumentando a carga fiscal no futuro.
Em resumo, A ENR está a atingir números alarmantes, depende de cada um de nós alterar este rumo para a reduzir substancialmente.
João Pereira
Fontes:
http://economia.publico.pt/Noticia/economia-paralela-representa-242-por-cento-do-pib-portugues_1470241
http://sic.sapo.pt/online/Templates/2007/Article.aspx?NRMODE=Published&NRNODEGUID={7423B9E8-AA1D-446E-8C19-6B0DA01958C2}&NRORIGINALURL=/online/noticias/dinheiro/Governo+quer+factura+obrigat%C3%B3ria+para+um+caf%C3%A9.htm&NRCACHEHINT=Guest&page=1
http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/26421/2/Tese%20Mestrado%20Nuno%20Gonalves%20%20A%20Economia%20No%20registada%20em%20Portugal.pdf
[artigo de opinião produzido no âmbito da u.c. "Economia Portuguesa e Europeia", do Curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
Schneider e Buehn (2007) estimaram que em 2004 o peso médio da ENR como percentagem do PIB seria de 15,5% nos países da OCDE, 36,7% em 19 países da Ásia Central e de Leste e 35,5% em 76 países em desenvolvimento. Os dados de 2008 colocavam a Espanha, Itália e Grécia como os países da OCDE recordistas da ENR, com a Espanha a encabeçar a lista, apresentando um valor equivalente a 18,7% do PIB.
O estudo mais recente publicado em Portugal, realizado por Nuno Gonçalves, da Faculdade de Economia do Porto, deverá deixar cada um de nós envergonhado com os números apresentados: em 2008 a ENR representou 23% do PIB, aproximadamente 40 mil milhões de euros.
Segundo o Presidente do Observatório de Economia e Gestão de Fraude, esta é uma estimativa que apenas diz respeito à economia paralela de fuga ao fisco e não inclui actividades ilegais (droga, prostituição e jogo), o que torna o seu real valor ainda mais alarmante. Comparando, conclui que o valor português é "2,6 vezes o dos Estados Unidos; 2,3 vezes o do suíço; 1,8 o do Reino Unido e 1,5 o da França".
Vários estudos defendem que os traços culturais dos portugueses são mais propícios à aceitação e a realização de fraude, facto que não pode deixar nenhum português indiferente, com vontade de alterar estes números.
A ENR abrange várias actividades que todos nós conhecemos. Começa logo quando não são declaradas inúmeras remunerações de empregados, para fugir ao pagamento à segurança social, bem como indivíduos que exercem uma actividade e conseguem declarar apenas parte dos rendimentos gerados através de estratégias mais simples, como não passar facturas, ou mais sofisticadas, como utilizar programas informáticos que possibilitam o recurso à fraude. Todos nós temos conhecimento daqueles que exercem uma profissão e fazem uns “biscates” por fora, nos quais auferem rendimentos superiores, bem como aqueles que oficialmente não têm rendimentos, mas recebem apoio social do estado, e exercem uma profissão não declarada. Mas será que sabemos de que forma é que estamos a ser afectados?
Segundo o estudo publicado por Nuno Gonçalves, estima-se que, em média, quando a ENR per capita aumenta 10% o PIB per capita aumenta 3.3%. Este valor é explicado na medida em que grande parte dos rendimentos gerados pela ENR são utilizados na economia oficial. Esta conclusão é apenas uma ilusão, pois tem consequências gravíssimas para a economia. Alguns dos exemplos são a distorção da concorrência e a diminuição das receitas do Estado.
Enquanto consumidores já fomos abordados inúmeras vezes se pretendíamos um preço mais baixo, não pedindo factura. Como cidadãos revoltamo-nos com essas situações, mas como consumidores temos tendência a comprar o produto mais barato. Nestes casos há uma distorção inaceitável da concorrência, prejudicando quem pratica a actividade honestamente.
Nos dias de hoje aqueles que cumprem honestamente as suas obrigações fiscais são, precisamente, os que acabam por suportar um aumento de impostos. Um combate sério à ENR possibilitaria um aumento desta via de receitas e a médio-longo prazo uma redução da carga fiscal.
Recentemente o Governo Português debateu, na reunião pelo combate à economia informal, a possibilidade de avançar com a factura obrigatória para todos os sectores de actividade e para todos os valores, como um simples café ou bolo. Quando abdicamos do documento comprovativo, o vendedor ou o prestador de serviço pode ou não registar na sua contabilidade o preço que pagámos e, se não registar, é como se nunca tivesse existido transacção. Se a economia é uma ciência principalmente relacionada com o problema de incentivos, a forma de ultrapassarmos esta questão é criar incentivos para que os consumidores passem a pedir factura.
Nenhum consumidor tem interesse em pedir factura pois à excepção das despesas com saúde e educação, entre outras, estas não são dedutíveis no IRS. Possibilitar ao sujeito passivo de IRS deduzir uma pequena parte destas despesas traria benefícios ao Estado? Teria de ser feita uma análise rigorosa, contudo o número de facturas pedidas aumentaria consideravelmente, e consequentemente diminuiria a economia paralela. Uma solução mais radical passaria por possibilitar ao consumidor não pagar o bem ou serviço, se no acto da compra não fosse apresentada de imediato a respectiva factura.
Quando não exigimos a factura estamos a ser cúmplices de uma fraude que, embora julguemos que ficar a ganhar, por não pagarmos o IVA respectivo, na realidade isso não passa de uma ilusão. Estamos a pagar o IVA a quem escapa ludibriando o Estado, bem como ainda a alimentar um sistema económico paralelo, que nos conduz a um país mais injusto e que em última análise, nos vai prejudicar ainda mais, aumentando a carga fiscal no futuro.
Em resumo, A ENR está a atingir números alarmantes, depende de cada um de nós alterar este rumo para a reduzir substancialmente.
João Pereira
Fontes:
http://economia.publico.pt/Noticia/economia-paralela-representa-242-por-cento-do-pib-portugues_1470241
http://sic.sapo.pt/online/Templates/2007/Article.aspx?NRMODE=Published&NRNODEGUID={7423B9E8-AA1D-446E-8C19-6B0DA01958C2}&NRORIGINALURL=/online/noticias/dinheiro/Governo+quer+factura+obrigat%C3%B3ria+para+um+caf%C3%A9.htm&NRCACHEHINT=Guest&page=1
http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/26421/2/Tese%20Mestrado%20Nuno%20Gonalves%20%20A%20Economia%20No%20registada%20em%20Portugal.pdf
[artigo de opinião produzido no âmbito da u.c. "Economia Portuguesa e Europeia", do Curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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