O PEC IV foi chumbado no parlamento dia 23 de Março. Este acontecimento levou ao pedido de demissão do nosso até então Primeiro-Ministro, Sr. Engenheiro José Sócrates. Os partidos da oposição reclamam o mérito de terem impedido que os portugueses se submetessem a mais medidas de austeridade, o que implicaria mais sacrifício por parte dos portugueses.
Mas será que é realmente isso que vai acontecer? É irónico pensar que estas medidas propostas pelo governo serão as mesmas que o PSD terá de aplicar quando chegar ao poder. O principal argumento que o PSD teve para chumbar o PEC IV foi a falta de transparência do primeiro-ministro pois as medidas, quer queiramos quer não, terão de ser aplicadas. A falta de transparência leva à perda de confiança por parte dos portugueses, e claro, da oposição.
Esta perda de confiança tem razões bastante sólidas, pois, como todos assistiram ao longo destes últimos tempos, num dia Sócrates louva a execução orçamental, sublinha a redução do défice público, garante que o país não precisa de ajuda externa para resolver os seus próprios problemas, faz inaugurações vangloriando-se da posição cimeira de Portugal em determinado sector face à difícil competitividade mundial e anuncia obras fantásticas no valor de centenas de milhões de euros, e no dia seguinte fala da difícil situação em que nos encontramos e antecipa novas medidas de austeridade.
Como é possível manter a confiança quando o jogo não é verdadeiramente aberto aos portugueses? Perante a apresentação de um PEC IV, no espaço de um ano desde o lançamento do PEC I, quem garante que não seria apresentado dentro de pouco tempo um PEC V ou VI?
De cada vez que um PEC era apresentado Sócrates garantia que não seriam precisos mais sacrifícios. Não se verificando estas promessas, e acontecendo de forma sistemática, as expectativas dos portugueses e dos mercados foram fortemente influenciadas, aumentando, desta forma, a perda de confiança perante quem lidera.
Toda a gente já percebeu que não é solução fazer politica com pequenos passos. É necessário pôr em prática, de uma vez por todas, as soluções que temos ao dispor para combater os problemas que têm afectado o nosso país. Há coisas que têm de mudar qualitativamente e não apenas quantitativamente. E é preciso mudar qualitativamente, porque muita coisa também mudou para o país nas últimas décadas.
Num período histórico muito curto, sofremos fortíssimos abalos como por exemplo a entrada na Comunidade Económica Europeia (CEE) e a aceleração da globalização. A entrada na CEE teve como consequência a destruição de boa parte das nossas empresas industriais, postas em competição com empresas muito mais fortes, contribuindo também para o declínio da nossa agricultura e das nossas pescas. A globalização, pelo seu lado, afasta cada vez mais de nós o capital estrangeiro, que emigra para outras paragens à procura de condições mais favoráveis, enquanto ameaça deslocalizar algumas das indústrias e serviços que ainda por cá permanecem.
Em consequência destes abalos, Portugal, que imediatamente antes do 25 de Abril era um dos países do mundo em maior crescimento, hoje está em recessão e afasta-se cada vez mais da Europa.
Por tudo isto e sem rodeios temos de interiorizar que é preciso mudar de vida. Para uma economia crescer conheço apenas duas formas possíveis. Ou tornamo-nos todos mais produtivos e desta forma aumentamos os nossos níveis de competitividade, ou então, temos de cortar na despesa e reestruturar sistemas organizativos de modo a serem mais funcionais e eficazes. Considerando que a primeira alternativa, pelo menos no curto prazo, não vai acontecer resta apenas uma solução.
Com ou sem recurso a ajuda externa, vai ser necessário implementar mais medidas de austeridade de entre as quais destaco: baixar salários, cortar despesas sociais, flexibilizar o mercado laboral, reduzir os gastos do Estado e diminuir os impostos, libertando capitais para a iniciativa privada, pois considero ser o bom método de a economia crescer.
Claro que as centrais sindicais não querem que isso aconteça. Estão numa posição defensiva, tentando manter a todo o custo as chamadas conquistas dos trabalhadores e as regalias sociais, como por exemplo as leis laborais. Acontece que a rigidez laboral que os sindicatos defendem tem duas principais consequências:
- Tapa as perspectivas a quem procura o primeiro emprego, fazendo com que os jovens só consigam empregos precários;
- Mantém artificialmente certos postos de trabalho desnecessários, agravando os problemas das empresas em dificuldades.
Por tudo isto considero que enquanto o país não for sujeito a um choque vital, que acarretará sacrifícios mas que dará uma esperança a prazo, continuaremos numa situação precária sem perspectivas nítidas para o futuro. O país precisa de um abanão, com opções claras, postas em prática por um Governo corajoso e que não tema a contestação sindical.
A situação actual do país é delicada, como, aliás, afirmou o Presidente da Republica no discurso de tomada de posse do seu segundo mandato, portanto, o próximo Governo tem de dizer claramente aos portugueses o que é necessário fazer para tentar superar a crise e aplicar essas medidas de forma transparente, rigorosa e decidida.
Nuno André Marques de Sá
[artigo de opinião produzido no âmbito da u.c. "Economia Portuguesa e Europeia", do Curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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