domingo, 15 de maio de 2011

A Taxa Social Única e contrapartidas

A Taxa Social Única (TSU) tem sido centro de muitas discussões políticas nos últimos dias. Para quem não sabe, as empresas portuguesas e trabalhadores estão sujeitos ao pagamento mensal desta taxa para a Segurança Social: 11% os trabalhadores e 23,75% as empresas, que vêem este valor aplicado sobre o salário de cada funcionário (por exemplo, se o vencimento de um funcionário for de 1000€, este terá de encaminhar para a Segurança Social 110€ e a entidade patronal 237,5€).
Mas o que está em causa actualmente é a redução da TSU para as empresas, como consta no memorando da ‘troika’. Isto teria do ponto de vista macroeconómico um efeito competitivo semelhante a uma desvalorização da moeda, que deixamos de poder utilizar desde a adesão à moeda única. No entanto, como Vítor Bento e Bagão Félix defenderam, esta redução deveria ser aplicada às empresas exportadoras (bens transaccionáveis) e não ao sector não transaccionável, de forma a alterar os termos de troca entre estes e corrigir um problema já detectado na economia portuguesa.
Mas afinal quem quer descer a TSU? O PSD em definitivo, pois esta medida consta no seu programa eleitoral. Consideram mais adequado um corte de 4 p.p. ao longo de toda a legislatura, o que colocaria a taxa de 23,75% nos 19,75% e se traduziria numa perda de receita para o Estado de cerca de 1,7 mil milhões de euros (um impacto de cerca de 1% no PIB). No entanto, Eduardo Catroga, coordenador do gabinete de estudos social-democrata já defendeu que essa redução deveria ser de 8 p.p., pois só assim se produzirão efeitos sensíveis na competitividade das empresas. Esta opinião segue de acordo com uma afirmação recente de Vítor Bento, onde considera que o corte deverá ser superior a 5 p.p. para que isso se verifique.
O PS talvez, mas pouco (pelo menos oficialmente). Consideram que para compensar a perda de receita da Segurança Social devido a uma redução de 4 p.p. na TSU, o IVA terá de subir no mínimo 3%. Daí que entre diversas contradições, admitem uma redução mas com duas diferenças em relação aos sociais-democratas: a descida da TSU deve ser “pequena” e “gradual”, porque não aceitam transferir carga fiscal das entidades patronais para a generalidade dos contribuintes. Curiosamente, Paul Thomsen (FMI) chegou a garantir que “o Governo pondera agora uma mudança dramática das regras do jogo através de uma forte redução das contribuições para a Segurança Social na ordem dos 3% a 4% do PIB”. Ora, feitas as contas, uma quebra desta ordem significa baixar a TSU bastante mais do que 4 p.p. (segundo cálculos do Público, cerca de 12 a 16 p.p.).
O CDS-PP, através de declarações de Paulo Portas, parece colocar reservas à descida da TSU por duas razões: em primeiro lugar porque consideram que uma descida de 4 p.p. teria pouco impacto na competitividade, depois porque não têm certezas quanto à forma de financiar essa medida.
O BE, por seu lado, parece não aceitar uma proposta de redução da TSU, pelo menos semelhante à apresentada pelo PSD. Francisco Louçã, veio afirmar que isso é “uma tragédia” e uma ideia “incompetente” do ponto de vista económico, porque colocaria “Portugal no IVA mais caro da Europa, um gigantesco aumento de impostos, de tal forma que o contribuinte e o consumidor, ou seja, todos os portugueses, vão pagar a diferença que as empresas não querem pagar para a Segurança Social dos seus trabalhadores.” O secretário-geral do PCP, Jerónimo Sousa, já demonstrou sintonia em relação a estas críticas.
Mas a grande questão que se coloca agora é qual a contrapartida desta medida, visto que uma diminuição da TSU reflecte-se no orçamento da Segurança Social com menores receitas e, portanto, terá que haver alguma compensação (na situação actual seria incomportável apenas reduzir receitas). Uma solução é aumentar o IVA, aumentando a taxa normal e/ou pegar nas taxas baixa, intermédia e alta e passar produtos de umas para as outras (falou-se até em eliminar a taxa intermédia). Falta saber se esta última bastaria para compensar a perda nas receitas da Segurança Social, pois na lista de produtos sujeitos a um IVA de 6% restam medicamentos, as portagens sobre o Tejo, alojamentos em hotéis, luz, gás natural e serviços específicos no âmbito da reabilitação urbana. Não seria possível ou pelo menos aconselhável essa passagem para algumas dessas rubricas. Na lista dos 13% estão, por exemplo, serviços de restauração e vinho – um produto que o PSD deu como exemplo para possível subida de escalão. Portanto a solução de um ‘mix’ é a mais provável, que pode também ser acompanhada de aumentos nos impostos sobre bens específicos (tabaco, bebidas alcoólicas, produtos petrolíferos, etc.), já que não nos podemos esquecer que o IVA é um imposto regressivo, ou seja, afecta os mais vulneráveis.
Posso concluir que talvez não seja de estranhar alguns cépticos em relação à viabilidade da TSU, principalmente com a contrapartida de um aumento do IVA. No entanto, os benefícios da medida parecem-me superiores aos custos. Resta saber a partir de que valor, uma descida da TSU teria verdadeiramente impacto na competitividade.

Miguel Moreira Carvalho

Bibliografia
PORTUGAL: MEMORANDUM OF UNDERSTANDING ON SPECIFIC ECONOMIC POLICY CONDITIONALITY, 3 de Maio de 2011 BCE, Comissão Europeia & FMI
“Redução da taxa social única tem de ser compensada com aumento do IVA” – Lusa, 09 de Maio de 2011
“PS, PSD e CDS comprometem-se a reduzir a Taxa Social Única” – Diário Económico, 13 de Maio de 2011
“Redução da TSU até 8 pontos: era o economista a falar” – Lusa, 13 de Maio de 2011
“Louçã: Redução da taxa social única é “uma tragédia”” – Diário Económico, 10 de Maio de 2011
“Redução da taxa social única inferior a 5% “não produzirá efeitos” – Vítor Bento. Jornal de Negócios, 9 de Maio de 2011.

[artigo de opinião produzido no âmbito da u.c. "Economia Portuguesa e Europeia", do Curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

Sem comentários: