«Ainda há vários meses o risco de uma explosão da zona euro atormentava as nossas cabeças, enquanto os eurocéticos apontavam para uma eventual saída da Grécia, argumentando que um regresso às moedas nacionais, como o escudo, o franco e o marco, alemão seria benéfico para todos. Hoje, ninguém se aventura a sugerir tal cenário. A zona euro resistiu, afastando a nuvem do euroceticismo. Mais, os seus membros provaram que sabiam ser solidários, ajudando a Grécia e lançando as bases para o início de uma união bancária. Até mesmo um certo otimismo paira nas salas de mercados perante os sinais de recuperação económica.
No entanto, a zona euro ainda não livrou de todos os seus problemas. Se, por um lado, a hipótese da sua explosão já nem tem razão de existir, outro cenário, quase tão negro, está à espreita. Uma situação de deflação ao estilo japonês. Os números publicados pela Eurostat no dia 31 de Outubro deixam temer o pior. A inflação estimada para o mês de Outubro caiu para 0,7% na zona euro, contra 1,1% em Setemro e 2,5% um ano antes. Os preços comprimem-se em quase todo lado, a começar pelos países mais frágeis. Em Setembro, a inflação reduziu para 0,5% em Espanha, 0,3% em Portugal e 0% na Irlanda, conseguindo mesmo ser negativa na Grécia (-1%).
O que está em causa? Um euro excessivamente forte, entre outros. A valorização da moeda única perante o dólar americano faz automaticamente baixar a tarifa dos produtos importados, notavelmente a da energia, que apresentou um valor de -1,7%, em Outubro. Mas o principal motor da desinflação, para além das medidas de austeridade, é a redução dos salários nos países do Sul da Europa.
À primeira vista, a baixa inflação tem razões para agradar. A curto prazo, ela apoia as despesas das famílias e, portanto, o crescimento. Mas, no médio prazo, pode tornar-se num grave veneno. Ela encoraja, de facto, os consumidores, que esperam vir a desfrutar de tarifas mais vantajosas no futuro, a diferir as suas compras. Resultado: as encomendas registadas pelas empresas sofrem uma forte queda, levando estas a reduzir o investimento e a força de trabalho. O que pesa sobre o consumo é então a recuperação económica. A desinflação move-se então para uma espiral deflacionista que nada, ou quase, pode parar. Exemplo disso é o Japão, que se encontra nessa armadilha infernal há vinte anos.
Na Europa, tal cenário seria ainda mais grave, tendo em conta que a deflação agrava também o custo de financiamento dos estados. Quanto mais o nível de preços baixa, maiores os juros reais pagos pelos governos. Para estabilizar os seus níveis de endividamento público nas condições atuais, seria necessário, segundo os cálculos do Natixis (banco francês), que a Itália libertasse um excedente orçamental de 7 pontos do PIB este ano, Portugal 11,7 pontos do PIB e a Grécia 26 pontos do PIB! Um objetivo irrealista. A dívida pública destes países, apesar das reformas e dos esforços de rigor a que foram submetidos, corre mesmo o risco de continuar a crescer nos próximos anos.
Apesar de tudo, ainda há tempo para evitar este cenário catastrófico de deflação, mas apenas uma instituição dispõe de poder suficiente para o fazer: o Banco Central Europeu (BCE). Cada vez se espera mais que o seu presidente, Mario Draghi, tome medidas no decorrer da próxima reunião da instituição no dia 7 de Novembro – ou, pelo menos, que dê a entender que irá agir até Dezembro.
O BCE dispõe de várias armas antideflacionárias, suscetíveis de apoiar a recuperação. Mas a maior parte não fazem a unanimidade. A começar pela taxa diretora, hoje de 0,5%. Muitos economistas defendem que deveria ser reduzida para metade. Reduzindo um pouco o custo do crédito, a pressão sobre as economias de Portugal, Espanha e Grécia seria consideravelmente aliviada. Só que tal medida não iria assentar bem na Alemanha, que prefere o inverso, isto é, que a taxa aumente, de forma a limitar o aumento dos preços imobiliários observado nas grandes cidades do país. Sr. Draghi terá portanto de escolher entre as necessidades da Berlim, de um lado, e as necessidades de Madrid, Lisboa e Atenas, do outro.
Poderia ainda acordar um novo empréstimo aos bancos, como o fez em Dezembro de 2011 e Fevereiro de 2012 (1000 bilhões de euros no total). Isto, na esperança que estes últimos emprestem, por sua vez, aos domésticos e às empresas, de forma a sustentar a recuperação e os preços. Problema: os bancos poderiam também utilizar o dinheiro para, por exemplo, comprar obrigações soberanas. Ou voltar a colocá-los nos cofres do BCE…
Aí está porque vários economistas apelam a uma atitude mais radical. Como a recompra massiva de dívida pública dos países em dificuldade. Sendo que esta se mostra como a melhor alternativa para o cenário de deflação, apesar de Mario Draghi sempre a ter recusado com receio que os países ajudados aproveitem para diminuir os seus esforços. Terá ele escolha?
Anthony Macedo
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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