Partimos da premissa de que União Europeia é um processo em construção. Jamais resultou de um fenómeno de canibalismo: países poderosos nunca se dirigiram a outros, comparativamente mais fracos, com intenções de absorver, anexar ou conquistar os seus territórios. É antes um empreendimento aberto, com o intuito de assegurar a paz dentro das suas fronteiras e de se construir activamente.
O crescimento foi gradual, com objectivos traçados e negociados entre os Estados que dela fazem parte. A perspectiva de cooperação económica e financeira entre países manteve-se sempre em primeiro plano, ultrapassando os desejos de alguns por forma a optimizar o projecto de integração política.
Mas o carácter político torna-se cada vez mais evidente. Os países membros já delegaram funções tradicionalmente tratadas dentro das suas fronteiras. Este aspecto confere uma dimensão política que vem sendo notada internacionalmente e que a própria União não pretende rejeitar. No entanto, a União Europeia viu a sua construção política ameaçada aquando do fracasso do “tratado constitucional”, aprovado pelo Conselho Europeu mas reprovado pelo conjunto dos países-membros.
O revés político evidencia o facto da União Europeia não ser um super-Estado ou um Estado supranacional. Os membros mantêm praticamente todos os atributos formais e competências de um Estado-nação, interna e externamente. Ao mesmo tempo que envolve, em certa medida, os países-membros na sua visão geoestratégica, cada um mantém a sua visão particular. A disparidade das visões acentuou o hiato entre os países e foi reforçada com a entrada dos membros de Leste: o alargamento e aprofundamento revelaram-se inconciliáveis; as forças centrífugas à União superaram as centrípetas que esta gera.
Acresce ainda que o eleitorado europeu se encontra distante e desinteressado do que se passa em Estrasburgo. Como dado indicativo, na eleição para o Parlamento Europeu, em 2009, a abstenção em Portugal foi superior a 60%. Como último ponto, a construção europeia caracteriza-se pela acentuada dimensão tecnocrática, deliberadamente despolitizada, conferida pelo Tratado de Lisboa (2007) à Comissão Europeia.
Sobre o Parlamento Europeu é necessário ainda sublinhar que os seus poderes aumentaram relativamente à Comissão Europeia, cuja aprovação dele depende. A partir daqui, a crise de governabilidade da União Europeia, que vinha sendo contaminada pelo endividamento público elevado, em função da globalização económica que vivemos na actualidade, espalhou-se pelos quatro cantos do mundo, derrubando índices das bolsas de valores e criando um clima de pessimismo na esfera económica mundial.
Estes factores conduziram a uma crise de representação política europeia, e também nos países-membros, em parte graças a uma opinião pública adversa às medidas comunitárias. O descontentamento das populações reflectiu-se em rejeições de propostas europeias (nomeadamente respostas negativas a referendos sobre a moeda única) o que, juntamente com o alargamento a países de Leste (fragmentos do Império Soviético), desembocou na atual “paralisia decisória” da União.
O Parlamento Europeu viu então aumentadas as suas competências num cenário de euro-pessimismo, agravado pela recessão económica e pelo desemprego provocados pelas políticas restritivas de convergência monetária. Passou a votar o orçamento comunitário e a aprovar a nomeação do presidente da Comissão, designado pelo Conselho. No entanto, a iniciativa legislativa própria é-lhe vedada. E quando os poderes realmente relevantes são tão gravosos que causam o bloqueio da União, fica pouco espaço de iniciativa para o Parlamento Europeu, mesmo que os parlamentares quisessem invocar todas as competências que lhe estão atribuídas, o que nunca sucedeu.
Rita Andrade Brites Pereira
Fontes:
M. Costa Lobo & P. Lains (Orgs.). Em nome da Europa – Portugal em Mudança (pp. 41-57). Editora: Principia.
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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