Hoje
em dia a discussão já é inevitável: estamos ou não a caminho da
“espanholização” da banca portuguesa? Portugal é ou não mais uma província
espanhola aos olhos do BCE, que manda no Banco de Portugal? E qual é o impacto
disso na economia e nas empresas portuguesas?
Há
9 seculos, D. Afonso Henriques conquistou Lisboa aos mouros. Agora é a vez dos espanhóis
conquistarem o centro financeiro do país.
As
explicações para o que se tem passado no sistema financeiro português assentam
numa combinação obscura de falhas graves de regulação e um nível muito elevado
de crédito mal parado. As crises de 2008 das dívidas soberanas, arrastaram o rating da república e encarregaram-se de
pôr a nu os riscos endémicos da economia portuguesa. O que se passou ao longo
dos últimos anos está a traduzir-se numa mudança radical do panorama bancário
português.
Hoje
é tentador e legítimo expressarmos a nossa indignação com o que a banca, o
regulador e o governo de então permitiram que ocorresse. No entanto, talvez
seja primordial refletirmos um pouco sobre as armadilhas em que estamos a cair
enquanto há tempo para isso, porque depois pode ser demasiado tarde. Os
mercados devem funcionar, mas mais importante que isso existe uma questão de
estratégia nacional que deve prevalecer.
Uma
verdade é certa neste momento: o capital privado não tem forma de gerir a banca
de maneira a que corresponda aos interesses do país. Portanto, considero que o
estado deve interferir e resguardar a banca. No caso do Novo Banco pode ser
mais fácil porque basta não vender. Confirma-se que existiu uma intenção
deliberada de se fomentar a consolidação da banca espanhola através da absorção
de bancos portugueses. A resolução do Banif custou aos contribuintes portugueses
2250 milhões de euros. O Estado funciona, assim, como o depositário dos
prejuízos e agente de limpeza, para entregar o banco, livre de riscos e
prejuízos, quando podia e devia assumir o controlo público do Banif,
assegurando a sua gestão ao serviço dos interesses nacionais.
Portugal
está a perder controlo sobre o seu sistema bancário e a intervenção do estado
pode esbarrar sempre nas instituições Europeias: Bruxelas está a exigir cada
vez mais coisas, que fazem cada vez menos sentido.
Será
esta a estratégia do BCE querer que os bancos tenham estruturas acionistas que
garantam capacidade de absorver perdas? Esta postura choca com o que se
defendia depois do colapso financeiro, isto é, que não podiam existir bancos “too
big do fail”. Mas com grandes grupos o risco de exposição cresce, e Portugal
está cada vez mais exposto a Espanha.
Esta
estratégia obedece a uma “reengenharia industrial” que extravasa o mandato do
BCE definido no tratado europeu. Tal como na época dos grandes impérios
europeus, a estratégia para a banca passa por ter as periferias da Europa a
funcionar em prol do centro. Como a banca nacional não tem capacidade para
comprar bancos espanhóis, o inevitável é o movimento inverso.
Os
“patrões” do turismo, do comércio e indústria juntaram-se no alerta contra o
risco do domínio da banca portuguesa por capitais espanhóis. A acontecer essa
dominância, é por demais evidente que muitas das decisões estratégicas para o financiamento
da economia nacional vão ser tomadas a partir de Madrid. Numa economia em que a
banca tradicional era o pilar que alavancava estas PME, pode acontecer uma
grande tempestade na economia nacional. A CGD, a joia da coroa, poderá ser a
única defesa da economia nacional, e no apoio ao tecido empresarial. Urge
impormo-nos perante Bruxelas. É a nossa economia que está em causa.
Não
existe em Portugal capacidade de criar grandes bancos portugueses para fazer
face à concorrência internacional. A curto prazo, a banca espanhola poderá controlar
cerca de 60% dos balcões em Portugal. Sobra quem? Sobra o quê?
Uma
Caixa Geral de Depósitos do Estado prestes a pedir a Bruxelas a transformação
dos 950 milhões de euros de empréstimo em capital e mais um aumento de 500
milhões de euros, pelo menos, a sair do nosso bolso e a ir a défice. Um
Montepio a consumir cada vez mais capital por causa das sucessivas imparidades
decorrentes de erros acumulados. Um grupo Caixa Agrícola, felizmente sólido,
confinando em termos de banca a um setor específico. E não sobra mais nada.
A
única alternativa aos estrangeiros é o Estado? Para alguns, a resposta é sim.
No atual contexto não há investidores portugueses, com capital ou crédito,
ainda que com vontade, para assegurar o controlo de um banco de grande
dimensão. As soluções não são fáceis, com Bruxelas a querer juntar demasiados
bancos, banquinhos e banquetas em poucas marcas europeias.
Não
tenho nada contra os espanhóis, bem pelo contrário. Mas a verdade é que a banca
espanhola invade Portugal com a sua incrível armada. Ficaremos à espera para
ver qual será a próxima jogada no xadrez acionista. A tendência é inevitável. Convém
não tomarmos como papel o de ingénuos!
Vitor Guimarães
[artigo
de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e
Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
Sem comentários:
Enviar um comentário